Especialistas analisam impacto da Operação Carne Fraca

O esquema descoberto pela Polícia Federal envolveria fiscais do Ministério da Agricultura na liberação de licenças e fiscalização irregular de frigoríficos

Fonte: Reprodução

Analistas do setor pecuário e de grãos consideram cedo para medir as consequências da Operação Carne Fraca, deflagrada pela Polícia Federal na manhã desta sexta-feira, dia 17, pela Polícia Federal. Para a analista Daniele Siqueira, da consultoria AgRural, a notícia é muito recente e ainda é muito cedo para avaliar seus efeitos sobre os preços dos grãos.

“Hoje não teve efeito sobre o mercado de soja. Claro que fica o receio: se houver uma reação dos consumidores do mercado interno e externo contra a carne brasileira, isso pode gerar uma reação na demanda tanto de soja quanto farelo”, apontou a analista. Daniele ressaltou, entretanto, que a expectativa é de que o problema seja resolvido rapidamente e que o impacto não deve ser significativo sobre a cotação da soja. “Se tiver uma reação do consumidor, ela deve ser temporária. Não deve existir uma queda grande do consumo.”

A Operação Carne Fraca desarticulou uma organização criminosa no âmbito do Ministério da Agricultura a partir da Superintendência Federal da Agricultura no Paraná. O esquema envolveria fiscais do ministério na liberação de licenças e fiscalização irregular de frigoríficos. Grandes empresas do setor como BRF e JBS são alvo da ação.

A consultora da AgriFatto, especializada em pecuária, Lygia Pimentel também disse ser precoce calcular o que pode acontecer no mercado. “Não sabemos ainda como as empresas serão punidas”, afirmou. Ela disse, no entanto, que o evento põe o controle sanitário do País em xeque. “O papel do fiscal é colocado em dúvida”, afirmou.

Ela disse que deverá haver um impacto no consumo de proteínas no país e que a operação pode também prejudicar as exportações, principalmente a de carne de frango. “Consequentemente, haverá uma consequência para o consumo de grãos”, afirmou. “Mas, novamente, ainda é muito cedo para fazer estimativas, só podemos afirmar que isso é extremamente ruim para a imagem da carne brasileira”, finalizou.

Reflexo internacional

O presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, por outro lado, avaliou que a imagem do Brasil no estrangeiro vai ser muito afetada, de forma negativa, pelo resultado das investigações da Polícia Federal.  Castro vê com preocupação a situação, “porque o Brasil demorou muito tempo para consolidar sua participação no mercado internacional e hoje é um dos grandes exportadores de carne. Então, com isso, a imagem do país, vai ser muito afetada”.

Ele esclareceu que como a exportação de carne não é bolsa de mercadorias, mas mercado físico, “oferta e demanda”, o país vai enfrentar eventuais cancelamentos e possíveis reduções de preços. Disse que o cenário só não será pior porque nos Estados Unidos, que são o maior exportador de carne de frango hoje, apareceu mais um caso de gripe aviária. “Mas, infelizmente, nós vamos sentir o impacto negativo aqui”.

Segundo Castro, o Brasil exporta atualmente quase US$ 12 bilhões (o equivalente a quase R$ 40 bilhões) de carnes bovina, suína e de frango por ano. “É um setor que emprega muita gente. Os principais compradores da carne brasileira de frango são Arábia Saudita, China e Japão, que são muito exigentes. Possivelmente, eles vão cancelar seus contratos ou vão pedir novos certificados”, indicou Castro.

Ele salientou que, eventualmente, poderá ocorrer repercussões em terceiros países, que podem entender que o Brasil perdeu credibilidade com a emissão de certificados. “É um cenário difícil”, pontuou. O presidente da AEB lamentou que depois da notícia de ontem de que o Brasil aumentou, pela primeira vez nos últimos meses, o nível de emprego, ter essa notícia hoje “foi muito ruim”.

União Europeia e Mercosul

A Confederação Europeia de Produtores Agrícolas indicou ao jornal “O Estado de S. Paulo” que está estudando os acontecimentos no Brasil e poderá pedir que a diplomacia europeia restrinja qualquer nova abertura comercial ao Brasil nesse setor.

Uma reunião entre o Mercosul e a UE está marcada para ocorrer no final deste mês, com o debate sobre as ofertas de liberalização entre as duas partes e principalmente a situação sanitária. No ano passado, os blocos apresentaram o que poderiam abrir em termos comerciais, com o Mercosul sendo pressionado a liberalizar o setor industrial, enquanto a Europa é solicitada a reduzir tarifas para as exportações agrícolas dos países sul-americanos.

Supermercados

A Operação Carne Fraca impactou também no mercado interno. Em nota, a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) orientou seus associados a “priorizar a qualidade e a segurança na comercialização dos alimentos vendidos em todas as lojas do Brasil”.

A entidade destacou que sempre recomenda a aquisição de produtos com o selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF). “Vale ressaltar que as lojas não mantêm produtos perecíveis em estoque por mais de 10 dias, que é o prazo médio entre a produção e a comercialização”, observou. A Abras disse ainda que está aguardando a identificação dos lotes irregulares para tomar as medidas necessárias, segundo a nota.

Queda nas ações

As ações da JBS e da BRF encerraram com queda de, respectivamente, 10,59% e 7,25% nesta sexta-feira, dia 17, na Bovespa. Operadores comentam que os papéis reagiram às investigações da Polícia Federal na Operação Carne Fraca.

A JBS divulgou nota na qual “esclarece que não há nenhuma medida judicial contra os seus executivos”, no que se refere à Operação Carne Fraca, deflagrada hoje pela Polícia Federal(PF). A empresa informa que sua sede não foi alvo dessa operação.

Já a BRF disse que está colaborando com as autoridades para o esclarecimento dos fatos e que cumpre as normas e regulamentos referentes à produção e comercialização de seus produtos.

Confira a lista completa das empresas investigadas e veja o posicionamento de cada uma delas.