A lei de renegociação do Funrural trouxe uma novidade negativa para os produtores: a possibilidade do bloqueio de bens de quem não pagou o tributo, sem a necessidade de autorização judicial. Vai bastar apenas que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional localize a propriedade e notifique o devedor, que vai ter cinco dias úteis para quitar o débito. Caso contrário, esses bens vão ser bloqueados pela União.
“Essa indisponibilidade atropela as garantias fundamentais que protegem o direito do patrimônio e também atropela outra garantia fundamental que é o devido processo legal. Ou seja, a União escreve você em dívida ativa, averba a dívida em relação a um bem no seu registro e consequentemente isso torna indisponível para o seu proprietário sem qualquer processo, sem qualquer contraditório”, diz o advogado tributarista Erich Endrillo.
Ele lembra que o bloqueio de bens não estava previsto na medida provisória e que não faz sentido a matéria ter sido incorporada no projeto de lei: “Não foi um tema amadurecido no ponto de vista com a sociedade”.
Os produtores rurais, que esperam um fim para o impasse do Funrural, estão bastante surpresos e afirmam que se sentem enganados.
“Enganaram os produtores e as suas entidades de classe. Algumas, como a CNA e o Sistema Sindical, estavam apoiando o Refis e foram enganados. Porque acredito que não tinham o conhecimento desse jabuti que foi incluído. Acredito que nem os deputados que representam os produtores da bancada ruralista tenham conhecimento. Não é possível que eles concordam com uma medida dessa”, afirma o produtor Luiz Ghesti.
Ele diz que parou de recolher o tributo desde a decisão do Supremo Tribunal Federal de 2011, que considerava a cobrança do Funrural inconstitucional. E afirma que não sabe o valor do passivo. Para ele, o valor se tornou impagável.
“Eu não estou devendo. Eu não recolhi porque o Supremo disse que não era para recolher, porque era inconstitucional. Então eu não considero que tenha dívida. Agora, a Receita pode decidir a seu bel prazer que essa dívida existe e com isso poderá me cobrar e poderá, inclusive, bloquear os meus bens e acabar com a atividade”, diz Ghesti.
Os representantes dos produtores rurais também foram pegos de surpresa e agora avaliam qual pode ser o prejuízo para o setor. “Junto com as outras federações e com a CNA, nós estamos avaliando qual será o prejuízo que o produtor pode ter com essa nova lei que foi sancionada. 00:43 – Na verdade, aquilo que se esperava ser um benefício, uma coisa que viria para auxiliar o produtor, na verdade se transformou num pacote de maldades”, afirma Fernando Cézar Ribeiro, vice-presidente da Federação de Agricultura e Pecuária do DF.
O setor não descarta a possibilidade de a Suprema Corte voltar atrás na decisão e desconsiderar a dívida passada do produtor, mas acredita ter caído numa armadilha do governo. Contra essa medida, a Ordem dos Advogados do Brasil deve ingressar nesta semana com um pedido de suspensão do bloqueio de bens.
“Eu acho que tanto a CNA quanto as federações e os deputados que foram a favor dessa lei entraram numa armadilha do próprio governo. Foi criado o ônus, e os bônus que a lei previa foram quase todos vetados”, diz Ribeiro.
“A OAB, a Confederação Nacional da Indústria, do Comércio e da Agricultura, dentre outros, já estudam ingressar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, ADI, direto no STF, com pedido de liminar para suspender nessa lei exatamente o artigo específico que fala dessa indisponibilidade”, diz o advogado Endrillo.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional estuda um prazo de 30 a 60 dias para começar a implementar a medida. A orientação da OAB aos produtores é que procurem seus direitos judicialmente. “Se daqui pra lá não tiver nenhuma liminar genérica suspendendo pra todos, cada um vai ter que cuidar do seu interesse”, avisa Endrillo.