O brasileiro está cada vez mais preocupado com a qualidade e segurança dos alimentos que coloca em sua mesa. Pensando em um mercado com consumidores mais conscientes e exigentes, o governo iniciou em 2019 os procedimentos para adotar o autocontrole sanitário de produtos agropecuários. Já presente nos países da União Europeia e nos Estados Unidos, por exemplo, a medida ainda precisa passar por várias etapas e enfrentar desafios para se adequar a realidade do Brasil. O assunto foi debatido durante o programa Direto ao Ponto deste domingo, 29, pelo diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Sementes de Soja (Abrass), Luciano Vacari, e pelo diretor-executivo da Aprosoja Brasil, Fabrício Rosa.
Neste ano, o Ministério da Agricultura lançou o programa de autocontrole, onde agroindústrias ficam responsáveis por monitorar os processos de produção e o governo, por fiscalizar o produto final. Para isso, o setor privado deverá aprimorar seus procedimentos e validar todos esses processos com a fiscalização oficial.
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A ideia é que haja uma divisão de responsabilidades que assegure ainda mais a qualidade do produto e o governo possa ter foco mais definido na hora de fiscalizar os alimentos que irão para a mesa dos consumidores ou até mesmo os insumos que serão usados pelos produtores rurais nas lavouras. O programa foi iniciado pelas áreas de alimentação animal (ração), fertilizantes, suínos e bebidas.
Na segunda etapa, o governo promete editar uma medida provisória com o objetivo de modificar a inspeção sanitária de alimentos de origem animal e vegetal, além de produtos agroindustriais, como celulose e álcool, seguindo a linha do autocontrole. Um comitê formado por representantes da pasta e do setor privado foi instalado com a intenção de ajustar o texto final da medida provisória que pretende ampliar o autocontrole em agroindústrias de alimentos.
Na opinião do representante da Abrass, o grande objetivo do autocontrole é trazer regulamentação privada para o segmento. “Isso demonstra o amadurecimento do setor, demonstra a confiança nos relacionamentos, inclusive entre os entes público e o privado, e demonstra, principalmente, a exigência do consumidor com os produtos brasileiros”, diz Luciano Vacari.
Já para o diretor executivo da Aprosoja Brasil, o autocontrole faz sentido quando se fala em produtos destinados ao consumidor final. Porém, ele alerta que no caso de insumos usados pelo produtor rural, esse sistema enfrenta mais obstáculos.
“Quando você coloca do ponto de vista do produtor rural, aí você tem uma norma do ministério que especifica a questão de insumos, defensivos, mas você tem ali no meio vários intermediários que podem estar atuando nesse mercado e podem prejudicar os atores do mercado. Assim, o produtor rural fica com o problema porque, mesmo se você colocar a questão a semente, se ele for ser ressarcido por um problema de qualidade ele tem um cronograma que fica prejudicado. É algo que ainda precisamos melhorar muito no Brasil”, argumenta Fabrício Rosa.
Conforme o dirigente da Aprosoja Brasil, para o autocontrole ser efetivo será necessário avançar no contrato estabelecido entre o produtor e o fornecedor. “Quais são as cláusulas mínimas, quais são as condições, quem são os atores que estão envolvidos dentro deste contrato? Vou dar o exemplo dos fertilizantes em há um problema clássico de qualidade. Normalmente, na parte entre a misturadora e a entrega do produto é onde mora o problema. Mas por quê? Porque dentro dos contratos que são firmados existem falhas”, esclareceu.
Luciano Vaccari reforça que países bastante exigentes na importação de alimentos e que têm mercado aberto em todo o mundo já adotam o sistema de autocontrole. “Nos Estados Unidos é assim. Na Europa é assim. A União Europeia é o bloco mais exigente para se importar e a gente traz um princípio que é o da reciprocidade. Você precisa mostrar para o comprador, seja ele o produtor rural seja ele consumidor, de que ele está sendo atendido no seu desejo”, atestou Vaccari.
“O consumidor vai ter todas as garantias porque a indústria, o agente econômico vão controlar os seus processos. E o Ministério da Agricultura continua controlando o produto, ou seja, quem tem que se preocupar com o processo de produção é o dono, é o agente econômico, cabe ao ministério dizer se aquele produto está apto ou não para o consumo, seja ele para o produtor aplicar o adubo ou aplicar a sua semente”, acrescentou o diretor da Abrass.
Mas, para que o sistema de autocontrole no Brasil seja bem sucedido, tanto Fabrício Rosa como Luciano Vaccari concordam que será necessário ampliar as punições às possíveis infrações de qualidade cometidas pelas agroindústrias e fornecedores de insumos, consideradas pelos dois convidados muito brandas pela legislação atual.
Além da iniciativa do governo, foi apresentado na Câmara dos Deputados, o projeto de lei 1.889/2019, de autoria do deputado Domingos Sávio (PSDB-MG), que segue a mesma linha do programa que começa a ser implantado pelo Ministério da Agricultura. No momento, o projeto está em análise pela Comissão de Agricultura da Casa.