Agronomia Sustentável

Polo de inovação tecnológica: negócio promissor em Cuiabá

Capital do Mato Grosso tem se mostrado cada vez mais bem sucedida no estreitamento de relação entre campo e cidade

A capital de Mato Grosso, Cuiabá, viu sua população aumentar em mais de dez vezes nos últimos 50 anos, ao passo em que o estado se transformou no maior produtor de grãos do país, com especial destaque para a soja e o milho.

É nesse cenário que a série Agronomia Sustentável exibe o terceiro episódio de sua segunda temporada, focando no trabalho dos agrônomos para que tais patamares fossem atingidos. Tudo calcado na inovação e no empenho profissional.

Esse é o caso da estudante de agronomia Aline Ferreira Ramos, que desenvolveu um produto para ajudar no desenvolvimento da agricultura urbana: o solo líquido. O material contém nutrientes e água suficientes para manter o desenvolvimento de plantas de pequeno e médio portes. Dessa forma, minimiza o uso de recursos hídricos e de impactos à natureza.

“Hoje sabemos que o tempo na cidade é um elemento muito limitado por conta da correria em que vivemos. Muitas pessoas gostam de ter plantas em casa, mas não têm tempo de cuidar, de cultivar, de fazer a rega. Às vezes a pessoa viaja e não tem com quem deixá-las. O solo líquido permite o cultivo de forma rápida e fácil, sem demandar tempo de cuidado da planta”, afirma.

O solo artificial cria um tipo de microclima com umidade e temperatura ideais para o cultivo. Aline, por exemplo, produz cogumelos. Ela garante que as qualidades do solo líquido permitem a plantação de alimentos em qualquer região do Brasil.

Assim, a estudante produz a pesquisa em laboratório, desenvolve o solo, cultiva nele o alimento e ainda comercializa o produto na região. É agronomia de ponta a ponta.

“O estado de Mato Grosso é muito conhecido pela produção de grãos, como a soja e o milho. Apesar de ser um estado de grandes culturas, também tem a parte da inovação. A etapa do laboratório é extremamente importante porque, para termos atingido a enorme produção que temos hoje, tudo saiu de dentro do laboratório. Desafogar um pouco a concentração de produção no campo, colocando na cidade, é importante”, considera.

Para tirar o projeto de extensão do papel e transformá-lo em uma startup, Aline contou com o incentivo da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Mato Grosso (Fapemat), com aporte financeiro de R$ 60 mil.

Em janeiro do ano que vem, os cogumelos que ela produz deverão estar nas prateleiras dos grandes supermercados de Cuiabá. “Vai ser uma grande satisfação, porque desde 2017 estou trabalhando nesse projeto e, com muita dificuldade e a cada passo, tenho visto o crescimento da empresa. Estou colhendo os resultados. É um trabalho sem fim, mas cada vez vamos nos aproximando mais de nossos objetivos”, conta a estudante que, em breve, vai compor a lista dos quase 9.600 engenheiros agrônomos ativos em Mato Grosso, de acordo com o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-MT).

Suporte à inovação

Apoiar iniciativas inovadoras e transformar ideias em negócios e produtos. Esse é o objetivo da Fapemat, segundo o presidente da entidade, Marcos de Sá Fernandes. “A inovação é importante não apenas ao agronegócio, mas a todos os setores da economia. Baseado em inovações é que mantemos a produtividade e a competitividade com o mercado externo, conseguindo melhores preços e gerando emprego e renda para todo o estado de Mato Grosso e para o país”, salienta.

Todo esse movimento é acompanhado de perto pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-MT). Segundo o coordenador da Câmara de Agronomia do estado, Luiz Vargas, a capacitação profissional precisa ser constante. “Se a pessoa ficar três anos fora do mercado, precisa se atualizar para voltar. Não apenas quanto à parte de eletrônicos, mas também a respeito de adubos mais eficientes e de maneiras de aplicação de defensivos com menos desperdício e mais eficiência, por exemplo”, afirma.

Segundo ele, a inovação sempre fez parte da agricultura. “Se formos analisar quando do surgimento da Embrapa, como era a produção agrícola, a quantidade de grãos que eram produzidos, a metodologia, e como a agricultura está hoje, saímos de um trabalho todo manual para um que hoje é parte espacial, em que se usa GPS para se fazer monitoramento, para direcionar maquinário. Hoje existe a tecnologia para as máquinas trabalharem sozinhas, mas isso depende de custos que às vezes impedem a implementação completa. Hoje em dia, o antigo tratorista é um nerd de computador”, reflete.

Berço tecnológico

Nos últimos anos, o estado de Mato Grosso superou a produção de grãos de Paraná e Rio Grande do Sul, antigos líderes do setor. Grande parte da tecnologia que transformou o estado nessa potência partiu de Cuiabá.

O último levantamento realizado pelo Radar Agtech Brasil, entre 2020 e 2021, mostra que o país conta com mais de 1.500 agtechs, que estão localizados, principalmente, nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, mas que possuem cobertura nacional. Isso coloca o Brasil como um dos mais dinâmicos ecossistemas de inovação agropecuária do mundo, com mais de 20 hubs dedicados exclusivamente ao setor.

Porém, de nada adianta tanta tecnologia e inovação sem o olhar criterioso do bom profissional. O engenheiro agrônomo é fundamental. Para o diretor-executivo do Agrihub, Otávio Celidonio, a tecnologia é uma ferramenta, um meio, mas quem transforma a produção são as pessoas.

“O engenheiro agrônomo é um vetor, é o canal difusor dessa tecnologia. Tanto é que no Agrihub, criamos um programa chamado Agrihub Pró, exatamente para atrair esses profissionais, prepará-los como consultores de transformação digital. Esse é um dos nossos principais projetos, pois acreditamos no potencial desse profissional para ajudar a transformar a produção agrícola e levar tecnologia aos produtores”, afirma.

A Agrihub promove o desenvolvimento do ecossistema de inovação com potencial de solucionar as dores dos produtores rurais mato-grossenses. A iniciativa é uma parceria entre o Instituto Famato e a Universidade Federal do Mato Grosso.

Estreitamento de relações entre campo e cidade

Para a engenheira agrônoma e professora da instituição Aline Regina Piedade, inovação tecnológica é a palavra de ordem. “Ela está tão presente em nosso dia a dia que, às vezes, passa despercebida. No campo isso não é diferente. É aí que entra a necessidade de profissionais que permeiem essa inovação tecnológica e passem para o campo. Por isso que profissionais que atuam na cidade, onde estão os grandes centros tecnológicos, têm a necessidade de se capacitar para conseguir levar esse conhecimento ao campo”, orienta. “De nada adianta ter uma distância muito grande entre o campo e a cidade. Tudo é muito ligado. Os agrônomos podem ficar tranquilos que sempre haverá empregos tanto no campo quanto na cidade”.

A busca constante de toda a cadeia é por eficiência e sustentabilidade. Para a engenheira agrônoma Eloiza Zuconelli, responsável pela interface entre o produtor e o Agrihub, “é preciso deixar claro que sustentabilidade não é apenas ambiental, onde o produtor é campeão indiscutivelmente, mas também é social e econômica. Justamente no pilar econômico e para dar lucro, é preciso uma relação custo-benefício. Então o produtor, com a tecnologia, tem tentado ampliar essa relação positiva do uso do insumo necessário para que ele produza”, afirma.

Conectar a cidade, o campo e os profissionais inseridos dentro dos hubs de inovação é uma metodologia moderna que tem revolucionado a maneira de trabalhar no campo.

O próximo episódio da série ‘Agronomia Sustentável’ será no Rio de Janeiro. Na capital carioca, vamos mostrar o programa de Residência na Agronomia na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, e o papel do engenheiro agrônomo na logística reversa de embalagem. A série é uma parceria do Canal Rural com o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) e Creas e é exibida todos os sábados às 9h, com reprise aos domingos, às 7h30.