Técnicos do Congresso ouvidos em sessão temática no Senado apresentaram um cenário de riscos fiscais e a possibilidade de o Orçamento se tornar impraticável no futuro se a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios for aprovada pelos senadores como veio da Câmara.
Entre os problemas apresentados, estão o risco de “calote” nos precatórios, o aumento do endividamento da União e a falta de previsibilidade para elaboração do Orçamento nos próximos anos.
Dois pontos centrais defendidos pelo governo do presidente Jair Bolsonaro foram criticados: a limitação do pagamento das sentenças judiciais, com o adiamento de parte das dívidas para os anos seguintes, e a mudança da regra de cálculo do teto a partir de 2022.
O Ministério da Economia calcula a abertura de um espaço no teto de R$ 106,1 bilhões no próximo. A folga pode ser usada para implantar o Auxílio Brasil, mas também para abrigar outras verbas de interesse eleitoral do governo e dos congressistas.
Para a consultoria de orçamento da Câmara, a limitação no pagamento dos precatórios pode inviabilizar o pagamento de sentenças ligadas ao antigo Fundef, que destina recursos para a educação e pagamento de profissionais do setor.
Isso porque haverá um limite nos pagamentos e, ao mesmo tempo, a necessidade de priorizar precatórios de pequeno valor e os chamados “superpreferenciais”, como aqueles devidos a idosos e pessoas com deficiência, conforme estipulado pela proposta.
Nos cálculos da consultoria da Câmara, se os precatórios “superpreferenciais” superarem R$ 14 bilhões no próximo ano, não haverá possibilidade de quitar o parcelamento das dívidas do Fundeb no primeiro ano proposto pela própria PEC. “Você vai ter uma regra constitucional que não vai ser efetiva”, disse o consultor da Câmara Ricardo Volpe durante a sessão do Senado.
A limitação pode gerar uma “bola de neve” próxima de R$ 1 trilhão em precatórios até 2036, nos cálculos do consultor. “É preocupante pensar que, abrindo espaço por causa de um problema sazonal, tomar uma decisão que gera uma dívida trilionária que em 2036 pode desaguar no Orçamento de uma forma impagável”, afirmou Volpe. Para ele, retirar os precatórios do teto é uma alternativa “menos traumática”.
Na avaliação do diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, Felipe Salto, o “calote” nos precatórios aumenta a insegurança jurídica e pode causar uma bola de neve de R$ 854,9 bilhões em 2026 nas dívidas judiciais.
O risco desse cenário, de acordo com o especialista, é elevar a perda de credibilidade do governo junto aos agentes econômicos e aumentar o endividamento da União no futuro.
Teto
Outro ponto criticado pelos técnicos é a mudança na regra que calcula o teto de gastos todos os anos. Atualmente, o limite é projetado conforme a inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior. A proposta muda o período final para dezembro. No quadro atual, a mudança aumenta despesas.
Para o diretor-executivo da IFI, a mudança de cálculo do teto é “intempestiva e inoportuna” por abrir um espaço em ano eleitoral e gerar um risco de rompimento na âncora fiscal a partir de 2023, já no primeiro ano do próximo mandato presidencial.
Ricardo Volpe, no entanto, apontou para uma redução na previsibilidade na elaboração do Orçamento. Ao jogar o período de cálculo para dezembro, o Congresso teria apenas 10 dias no último mês do ano para usar a projeção de inflação do ano seguinte e aprovar a peça orçamentária.
Isso porque os parlamentares teriam que aguardar a divulgação de novos parâmetros da inflação até o dia 12 de dezembro. O prazo para o Congresso aprovar o projeto é dia 22. O resultado pode originar um cenário “sujeito a dezenas de erros” e um “processo muito atropelado”, disse o consultor.
Por Estadão Conteúdo