EMBRAPA

Pesquisa seleciona árvores para a indústria moveleira

No Ceará, com sol intenso, chuvas limitadas, solos arenosos e ventos fortes, cultivar árvores de alta qualidade para a indústria moveleira ou suprir energia pode parecer improvável

No Ceará, estado com intensa exposição solar, chuvas limitadas, solos arenosos e ventos fortes, a ideia de cultivar árvores de alta qualidade para atender aos padrões da indústria moveleira ou para suprir necessidades energéticas poderia parecer improvável.

Entretanto, os especialistas da Embrapa estão demonstrando que é perfeitamente possível estabelecer florestas em condições desafiadoras.

Projeto iniciado há 12 anos, conduzido no município cearense de Acaraú, pela Embrapa Agroindústria Tropical (CE) e pela Embrapa Florestas (PR), avaliou 39 espécies no total, 29 nativas e 10 exóticas, além de 6 híbridos de eucaliptos, e mostrou as que mais se adaptaram à região.

A pesquisadora da Embrapa Diva Correia conta que o material tem potencial para aproveitamento na indústria de móveis, energia e também para outros fins como a produção de mel, arborização, recuperação de áreas degradadas, na construção civil ou como alternativa de componente florestal em sistemas de integração lavoura-pecuária e floresta (ILPF).

“Várias espécies e clones de eucaliptos apresentaram ótima resposta para adaptação”, diz a pesquisadora.

A ideia dos pesquisadores é ter recomendações de espécies florestais para diferentes regiões do Ceará.

O primeiro experimento foi instalado em três hectares de área de irrigação do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), na zona rural de Acaraú (CE), em área limítrofe com o município de Marco (CE).

Com três anos de instalação, foi realizada a primeira etapa de seleção e as espécies com boa adaptação às condições da região avançaram para novas etapas de experimentação, com novos ensaios experimentais envolvendo seleção de matrizes de espécies nativas, espaçamentos e testes clonais em eucaliptos, além de estudos de qualidade da madeira e aproveitamento de resíduos para o desenvolvimento de novos materiais.

Atualmente, além do experimento instalado em Acaraú, existem testes em Tabuleiro do Norte (na chapada do Apodi), em Aracati, em Marco, em Pacajus e Quixeramobim, no Sertão Central do Ceará. Ao todo, estão em avaliação 85 clones de eucaliptos, além de 24 espécies nativas e 9 exóticas.

“Podemos dizer que os clones de eucaliptos são muito promissores, por seu rápido crescimento e adaptabilidade às condições de solo e clima da região e apresentam potenciais de uso para móveis e energia. Entre as espécies nativas avaliadas existem várias que têm bom desenvolvimento e, assim como os clones de eucaliptos, têm potencial para produção de móveis, geração de energia, bem como serem utilizadas na reposição florestal, apicultura, componente florestal em sistemas integrados, entre outros usos”, relata o pesquisador João Alencar, que atua no projeto.

O pesquisador da Embrapa Alisson Santos salienta a importância de se fazer outros estudos e ampliar a base genética testada em solo cearense. Alisson declara que o projeto é inovador e havia pouca informação sobre o plantio de espécies florestais no Ceará. “É preciso uma base genética forte no estado para, a partir daí, fazer seleção”, diz.

Avaliação de longo prazo

Santos explica que esse tipo de estudo é demorado e nem tudo o que aparenta ser bom no início proporciona resultados satisfatórios no fim.

Algumas das espécies avaliadas em Acaraú se desenvolveram bem nos primeiros anos, mas acabaram morrendo.

Por outro lado, espécies que inicialmente têm um desenvolvimento mais lento e requerem cuidados diferenciados podem apresentar resultados satisfatórios ao longo do estudo.

“Se fosse considerado apenas o desempenho inicial, muitas dessas espécies poderiam ser descartadas no início”, pondera o pesquisador.

Conhecimento e banco genético de árvores

No município de Marco, em área da empresa Jacauna, foi instalado um teste com o objetivo de ampliar a seleção de clones de eucalipto (60 híbridos).

Em outro estudo, conduzido na estação experimental da Embrapa em Pacajus, está em avaliação o espaçamento ideal para o plantio de duas espécies nativas que demonstraram bom desempenho no primeiro experimento implantado em Acaraú: angico e jatobá.

A expectativa é testar outras duas espécies nativas (pau d’arco-roxo e sobrasil) na área e coletar informações importantes para condução de plantios comerciais.

Os pesquisadores pretendem formar um banco de material genético dessas espécies, tendo em vista que as sementes utilizadas no experimento vieram de várias regiões do estado e foram coletadas de árvores consideradas matrizes, pelas suas ótimas características visuais e de sanidade.

Além desses estudos, estão em condução experimentos em Aracati e em Tabuleiro do Norte. No primeiro, em parceria com a empresa Copan, do grupo empresarial J.Macêdo, estão em teste, há cinco anos, 33 clones de eucalipto e, há três anos, 15 espécies nativas.

O objetivo principal do estudo é avaliar a madeira para energia, além de um possível componente florestal num sistema de ILPF.

Em Tabuleiro do Norte estão em avaliação 60 clones de eucalipto, em fazenda da empresa Nova Agro, também com foco na produção de biomassa para energia.

Em Quixeramobim, região central do estado, os pesquisadores iniciaram um estudo para avaliar uma população de mogno africano (Khaya senegalensis), como parte das atividades de um projeto demandado pela Secretaria do Desenvolvimento Econômico do Estado do Ceará (SDE), com o objetivo de avaliar a adaptabilidade e selecionar indivíduos superiores nas condições edafoclimáticas da região.

Madeira para móveis

A ideia de testar a produção madeireira no Ceará surgiu a partir de um problema enfrentado pelos produtores de móveis do município de Marco, o oitavo polo moveleiro do Brasil, mas que fica distante das regiões produtoras de matéria-prima.

Toda a madeira utilizada é oriunda das regiões Sudeste e Norte e havia uma esperança de que os resultados dos estudos pudessem justificar uma produção comercial local.

As 50 empresas existentes na região exportam para diversos países, geram 2 mil empregos diretos, mas padecem da distância dos principais fornecedores de matéria-prima.

O setor demanda mais de 1,5 mil m3/mês de madeira vindas da Amazônia e de florestas plantadas do Sudeste.

O tempo e custo de transporte da madeira são gargalos à sustentabilidade da produção de móveis desse arranjo produtivo local (APL) do município.

O sucesso do experimento repercutiu no setor produtivo. Uma das empresas, o Grupo Jacauna, já tem implantados mais de 2 mil hectares e deve implantar 5 mil hectares até 2025.

Charles Costa, engenheiro-florestal da empresa, revela que no início não acreditava no sucesso da empreitada.

“A primeira vez em que visitei a região, eu refuguei o projeto e disse que não ia dar certo”, lembra admirado ao perceber como a sua opinião mudou a respeito.

O grupo Jacauna pretende iniciar as atividades de processamento de madeira, serrarias e, no futuro, distribuir madeira para o Nordeste.

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