Relação entre produtores e indústria da citricultura dificulta desenvolvimento do setor

Brasil é responsável por 40% da produção de laranja em todo o mundoOs negócios da citricultura no Brasil estão relacionados à expansão dos pomares e ao desenvolvimento do setor industrial. Mas a relação entre as duas partes da cadeia é marcada até hoje por conflitos contratuais.

A citricultura brasileira é ainda um dos setores mais competitivos do agronegócio mundial. O Brasil detém 40% da produção da fruta no mundo inteiro e 60% do suco de laranja. Além disso, a agroindústria deste setor movimenta R$ 9 bilhões por ano.

? A indústria tem um grande investimento feito nisso e ela precisa de matéria-prima. E, provavelmente, ela vai reagir a esta situação ? afirma Flavio Viegas, presidente da Associtrus.
 
Viegas, presidente da associação que representa os produtores, se refere ao momento em que vive o setor e ao desafio de resolver um dos maiores problemas sanitários dos pomares nos últimos tempos: a infestação  do greening. Além disso, diz Viegas, a relação dos citricultores com a indústria, nada amistosa, é outro problema para o setor.

? Muito complicada [a situação], porque a indústria é concentrada. Quatro empresas que estão trabalhando em harmonia e em conjunto, impondo condições contratuais que não cobrem os custos de produção do produtor e isto está dissimulando os produtores tradicionais, e ela mesma está implementando seus pomares, tendo sua produção e ganhando mais força para impor condições difíceis para o produtor. Há um grande desânimo na citricultura.

O consultor de mercado Mauricio Mendes chama isso de “verticalização da indústria”. Trata-se de uma estratégia de proteção, caso os citricultores não plantem mais, de acordo com ele.

? Eu acredito que em pouco tempo a indústria já tenha 40% do que ela vai moer. Não da produção total, uma parte disso vai para o mercado interno, mas da produção que ela vai industrializar. Isso, a longo prazo, não é bom pra citricultura, porque é necessário que haja uma relação de forças entre os principais elos da cadeia, ou seja, da produção e da industrialização.

O citricultor Gilberto Costa Lima faz parte de um destes elos. Ele é de uma nova geração de citricultores. Na fazenda de sua família, a laranja ocupa 400 hectares. A cana, 1,1 mil hectares. E ele ainda tem espaço para criação de ovinos. Esta diversidade é estratégica, uma espécie de proteção para se manter no mercado. No caso da produção de laranja, diz Gilberto, o produtor não tem o menor domínio deste mercado. A indústria é que tem.

? A situação da indústria com o produtor é uma situação extremamente delicada. É um casamento inevitável, a gente fala muito assim. A gente depende da indústria. É uma situação onde o produtor está sempre numa condição muito fragilizada, não só com a situação do mercado, mas com a situação do clima, de intempéries, que são normais dentro de uma atividade rural. A indústria sempre quer, com certeza, tirar um pouco de proveito nisso e o produtor acaba se sacrificando demais. Então, existe sempre este desgaste nessa relação de indústria mercado.

A primeira fábrica de sucos no Brasil foi instalada em Araraquara, em São Paulo, em 1963. Pouco tempo depois, com os investimemntos do setor industrial, é que começou a expansão dos pomares paulistas. E foi aí que começou também esta relação, que se mantém um tanto conturbada com os fornecedores de matéria-prima, os citricultores.

Na década de 60, o fornecimento de matéria-prima já era feito por contratos. Mas o contrato-padrão, que condicionou o preço da laranja às cotações internacionais do suco e criou regras para o pagamento, só surgiu em 1980. A relação entre fornecedor e comprador começou a esquentar com denúncias de formação de cartel pela indústria.

A última resultou numa operação da Polícia Federal em janeiro de 2006, quando foram apreendidos documentos das principais processadoras de suco de laranja do país. A ação ficou conhecida como Operação Fanta. Até hoje, os documentos não foram analisados e o processo de denúncia ainda não foi concluído.

A equipe de reportagem do Canal Rural fez contato com as principais indústrias processadoras de suco de laranja do Brasil. A direção da Cutrale, da Citrosuco e da Citrovita disseram que preferem não se manifestar sobre os assuntos da reportagem. A Louis Dreyfus Comodities disse que não poderia falar neste momento.

O Canal Rural fez contato também com a Abecitrus, associação que representa a indústria e a assessoria alegou que presidente Ademerval Garcia não poderia dar entrevista por que está em viagem pela Europa.