Vinho nacional sofre boicote em redes sociais e entre chefs de cozinha

Por trás do movimento está a provável adoção de salvaguarda temporária, de três anos, para proteger a indústria nacional de vinhosA ameaça de um sério boicote aos vinhos brasileiros por parte de restaurantes no centro do país obrigou dirigentes do setor na Serra Gaúcha, no Rio Grande do Sul, a se deslocarem às pressas com destino ao Rio de Janeiro. Por trás do movimento de censura nas redes sociais aos aromas da terrinha por parte de chefs consagrados está a provável adoção de salvaguarda temporária, de três anos, para proteger a indústria nacional de vinhos, o que inibiria a entrada de rótulos importados e poderia provoca

Para tentar contornar o que define como “informações distorcidas”, o diretor executivo do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), Carlos Paviani, o gerente de Promoção e Marketing da entidade, Diego Bertolini, e o coordenador da Comissão Interestadual da Uva, Olir Schiavenin, peregrinaram nessa segunda, dia 26, pela Cidade Maravilhosa.

– Não haverá aumento na taxação de importação de vinhos. O que pedimos é uma medida restritiva quantitativa para que o setor nacional possa se fortalecer e dividir com os importados o crescimento no consumo – explicou Paviani, por telefone, enquanto se preparava para mais uma rodada de esclarecimentos quanto à polêmica que ronda o setor.

As lideranças se reuniram com representantes da Associação Brasileira de Sommeliers (ABS) e da Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho (Sbav/RJ).

A medida de salvaguarda, prometida pela presidente Dilma durante a abertura da Festa da Uva, em 16 de fevereiro, e acenada pelo Ministério do Desenvolvimento, vinha sendo brindada, pois era uma reivindicação antiga do setor vinícola, fragilizado com a invasão de importados em taças e gôndolas. Mas o projeto apimentou os ânimos de quem trabalha com gastronomia e cartas de vinho.

O movimento de boicote aos vinhos nacionais foi encabeçado pela chef Roberta Sudbrack, que retirou rótulos brasileiros da carta de seu restaurante no Rio. E fez mais: convocou seus 30 mil seguidores no Twitter a integrarem um abaixo-assinado, também disponível na internet, contra a salvaguarda, alegando que a medida elevaria de 27% para 55% os impostos de importação de vinhos. A campanha de retaliação ganhou adeptos na internet e o apoio de renomados chefs de cozinha, como Felipe Bronze, do restaurante Oro, que ameaça “barrar os nacionais. Todos eles”. O impasse repercutiu nacionalmente, sendo tema da coluna de Artur Xexéo na revista O Globo do dia 25 de março.

– Foi um gol contra para a imagem do setor. Queremos mostrar que isso não é uma reivindicação só das grandes vinícolas nacionais (como sugere o texto do abaixo-assinado), mas de entidades que representam o setor como um todo. Queremos acalmar e tranquilizar o mercado. É apenas a limitação na entrada de produtos, e não o aumento de impostos – afirma Paviani.

Para tentar contornar a situação e “salvaguardar” o segmento do vinho de ser vítima de suas próprias lutas para ganhar o mercado, manchando sua imagem após anos de trabalho para mostrar que merece crédito pela evolução da qualidade, Paviani, Schiavenin e Bertolini viajam nesta terça, dia 27, para São Paulo. Lá continuam a série de reuniões e visitas a entidades, além de conceder entrevista coletiva a veículos de comunicação, para explicar que a cadeia do vinho só quer ganhar mais espaço (e credibilidade) nos cálices dos consumidores brasileiros e não ser alvo de boicote entre seus conterrâneos.

Essa é uma prática adotada por inúmeros países para preservar sua indústria da invasão de estrangeiros. Os vinhos importados respondem por 78% do mercado brasileiro. O temor é que a salvaguarda venha acompanhada de vinhos importados mais caros, fazendo o consumidor refém de rótulos nacionais pouco competitivos ao bolso. A aguardar como os cálices se acomodarão nesse complicado tabuleiro mercadológico.