Esta foi uma das observações ouvidas no seminário Crise Econômica Mundial, promovido pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e pela Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) na semana passada, em Brasília.
Aumento do desemprego, da informalidade e da pobreza são cenários prováveis para o futuro próximo nos países da América Latina e do Caribe, emergentes europeus e asiáticos, caso não consigam combater os efeitos da crise econômica internacional. As conquistas sociais e econômicas alcançadas nos últimos anos, especialmente na América Latina e Caribe ? o PIB per capita vinha crescendo acima de 3% ao ano desde 2005 e os índices de desenvolvimento humano estavam melhorando ? poderão ser perdidas.
Medidas anti-crise devem ser tomadas pelos setores público e privado, porém com bastante cuidado para não alimentar a potencialidade dos efeitos da turbulência econômica. A desoneração de impostos é fácil de ser implementada, porém tem efeito questionável em situação de desaceleração econômica, pois não causa impacto direto na geração de empregos. Políticas monetárias de crédito e fiscais terão papel importante. Este é um bom momento para a ‘economia verde’ e geração de ‘empregos verdes’.
No Brasil, o seguro desemprego deveria ser ampliado para todos os setores, inclusive para trabalhadores domésticos. O PAC (Programa de Aceleração da Economia) e o programa Bolsa-Família são bons exemplos brasileiros para lidar com o impacto da crise. O custo do Bolsa-Família (0,4% do PIB nacional) e os benefícios familiares (entre R$ 20 e R$ 182) são considerados baixos.
Além de reduzir a pobreza, os programas de assistência social também são ferramentas valiosas para estimular a economia. Programas de criação direta de emprego, subsídios ao emprego, capacitação da mão-de-obra e microcrédito são outras soluções anti-crise, que os países devem implementar. Investimentos em infra-estrutura nos países da América Latina, Caribe e emergentes são estratégicos para combater os efeitos da crise.
Essas foram as principais recomendações dos palestrantes do seminário, entre eles o economista Osvaldo Kacef, diretor da Divisão de Desenvolvimento Econômico da Cepal; o economista Alfredo Calcagno, da Divisão de Globalização e Estratégias de Desenvolvimento da Unctad (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento); a pesquisadora Janine Berg, do Departamento de Estratégias de Emprego da OIT (Organização Internacional do Trabalho); e professor José Carlos Braga, diretor do Centro de Estudos de Relações econômicas Internacionais do Instituto d e Economia da Unicamp.
? O impacto da desaceleração das economias desenvolvidas vai atingir os países em desenvolvimento de forma desigual. Os motores do crescimento econômico estão sendo desligados um a um ? afirmou Calcagno.
O aumento dos preços das commodities, ocorrido no período 2007/2008, foi especulativo e já era um sintoma da crise, disse ele. Os preços dos produtos básicos (alimentos, minerais e petróleo) estão caindo, mas ainda podem se estabilizar em níveis elevados, acrescentou o economista.
Ele chamou a atenção para o perigo de estabelecimento de ‘incentivos perversos’ por parte de alguns governos, que ao invés de reduzir os efeitos da crise, podem alimentar a potencialidade da situação.
? Os seguros para evitar a volatilidade das matérias-primas acabaram alimentando a potencialidade da crise ? exemplificou.
Segundo a pesquisadora Janine Berg, do Departamento de Estratégias de Emprego da OIT, a crise internacional vai aumentar o número de trabalhadores pobres no mundo, ou seja, das pessoas que recebem até dois dólares por dia. Até 2007, o contingente humano que vive nessas condições envolvia 1,2 bilhões de pessoas. Até o final de 2009, esse número poderá saltar para 1,377 bilhões.
Ela informou que a taxa de desemprego na América Latina foi de 7,3% em 2008, e poderá chegar a 8,3%, até o final deste ano. Esse número significa que a América Latina terá 3 milhões de desempregados a mais em 2009.
No Brasil, especificamente, os grandes riscos decorrentes da crise internacional são: aumento da informalidade; aumento do desemprego; aumento do descumprimento da legislação trabalhista; idem do trabalho infantil e forçado.
? Há risco de reversão dos avanços sociais registrados, nos últimos anos, no Brasil ? alertou a pesquisadora da OIT.
Entre as medidas recomendadas aos países da América Latina para lidar com os efeitos da crise, Janine sugeriu políticas monetárias de crédito e fiscais anticíclicas; investimentos em obras de infra-estrutura; programas de investimento intensivo em emprego. Ela destacou o Programa de Aceleração do Crescimento, do governo brasileiro, como exemplo de medida anti-crise.
? A crise pode ser uma oportunidade para construir as bases da economia sustentável. A economia verde rende mais empregos ? ressaltou Janine.
A desoneração de impostos é fácil de ser implementada, porém não há garantia de que tenha impacto na geração de empregos, segundo estudos da OIT.
? Tem efeito questionável em situação de desaceleração econômica ? disse a pesquisadora.
A ampliação do seguro desemprego é uma das medidas mais importantes, segundo Janine.
? É oito vezes mais efetiva do que a desoneração de impostos para enfrentar o impacto da crise. Não entendo porque no Brasil não se estende o seguro desemprego a todos os desempregados de outros setores, ficando restrito apenas aos setores atingidos pela crise ? ressaltou.
Em 2007, havia no Brasil 99 milhões de pessoas economicamente ativas, sendo que 35,5 milhões com carteira assinada e 55,3 milhões informais e empregadores.
? A assistência social é importante para reduzir a pobreza, mas é também importante para estimular a economia ? argumentou Janine.
Sobre o programa Bolsa-Família, ela afirmou que 11,1 milhões de famílias recebem o benefício, entre R$ 20 e R$ 182.
A intermediação da mão-de-obra, programas de criação direta de empregos, subsídios ao emprego, programas de capacitação da mão-de-obra e de microcrédito são outras medidas recomendadas ao Brasil e demais países da América Latina e Caribe. Investimentos em capacitação durante a crise vão gerar benefícios, depois que ela passar.
? Quando a economia melhorar, a capacitação vai ajudar trabalhadores a acessarem vagas ? explicou.
O diálogo social é outra ferramenta recomendável e muito importante para enfrentar os efeitos da crise. Instâncias tripartites devem ser acionadas para encontrar soluções para trabalhadores e empresas.
? Os governos devem monitorar e analisar o impacto das medidas anti-crise em relação aos empregos ? sugeriu a pesquisadora.
A situação demanda atenção sistemática dos governantes para não tomar decisões e implementar medidas que alimentem os efeitos da crise.
Desaceleração das exportações
Os países da América Central e pequenos da América do Sul serão mais afetados pela desaceleração das exportações. Brasil e Argentina serão os menos impactados da região. A queda do turismo vai atingir especialmente os países do Caribe.
Apesar das ameaças, a região da América Latina e Caribe está mais preparada para enfrentar a situação econômica internacional do que em outras ocasiões.
? Não havia problema de financiamento externo na região ? argumentou Osvaldo Kacef, diretor da Divisão de Desenvolvimento Econômico da Cepal.
Dentre os 29 países da região, 13 tomaram medidas monetárias.
? Há muitos anúncios de gastos com infra-estrutura na América Latina, mas nem sempre são implementados ? criticou Kacef.
O aumento da pobreza impacta muito a região, segundo ele.
? Não faz sentido discutir diminuição de impostos para enfrentar a crise, exceto no Brasil e Argentina ? afirmou diretor da Cepal.