Indígenas e produtores rurais criticam minuta de portaria sobre demarcação de terras

Parlamentares têm até a próxima semana para sugerir alterações no documentoParlamentares têm até a próxima semana para sugerir alterações na minuta da portaria sobre o processo de demarcação de terras indígenas. O documento foi entregue na ultima semana pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, às autoridades e representantes de índios e produtores rurais. No entanto, o texto está muito longe de agradar tanto aos indígenas quanto aos produtores rurais. A minuta prevê que, além da Funai, outras entidades do governo federal poderão participar das decisões.

Prometida para junho, a minuta da portaria só foi apresentada pelo Ministério da Justiça na última semana. O texto tem 37 artigos e trata dos procedimentos para criação de territórios indígenas no país. Além da Funai, prevê a participação de nove ministérios no processo de demarcação das áreas: Secretaria-Geral da Presidência da República, Secretaria de Direitos Humanos, ministérios da Agricultura, das Cidades, do Desenvolvimento Agrário, do Meio Ambiente, de Minas e Energia, do Planejamento, dos Transportes, além de entidades vinculadas ao assunto, como por exemplo, o Incra e a Embrapa. Ainda assim, o consultor em agronegócio Clímaco Cézar defende a inclusão de outras instituições.

– Não dá só para a Funai coordenar um negócio desse. Os agricultores também estão certos em pedir a presença de outros órgãos, com a CNA e sindicatos. Eu acho que o melhor para isso seria constituir um conselho paritário com “n” órgãos, inclusive com a presença da Polícia Federal e o Incra participando, para levar a um acordo sobre o tamanho da área ideal para os índios – diz Cézar.

O fato é que, do jeito que está, a proposta não agrada a ninguém. Para os defensores das causas indígenas, ela é burocrática e transfere poderes da Funai para o Ministério da Justiça. Já o setor do agronegócio critica o fato de não haver previsão de indenizações aos produtores rurais, nem o estabelecimento de uma data que serviria de parâmetro para as demarcações.

– O marco temporal é a principal questão. Não podemos aceitar as interpretações da constituição brasileira, em que alguém interpreta o que os constituintes quiseram. Quem estava em cima da terra em 1988 era o produtor ou era o índio? Se eram os índios, a terra é deles. Nós não discutimos essa questão. Mas, na maioria dos casos, laudos antropológicos falsos forçaram essa questão. Por isso, o decreto ainda não é suficiente – afirma o deputado Luis Carlos Heinze (PP/RS), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária.

– Se tirar poder da Funai, o processo ficará mais longo. Ficando mais longo, os conflitos vão aumentar. Nós não vamos apoiar essa minuta. Foi um grande erro do Ministério da Justiça. Nós queremos participar com as nossas ideias. Podemos ajudar na demarcação do restante de terras e, ao mesmo tempo, construir o diálogo e acabar com a violência contra os povos indígenas – afirma o deputado federal Padre Ton (PT/RO), presidente da Frente Parlamentar de Apoio aos Povos Indígenas.

A minuta da portaria também prevê um grupo técnico para elaborar o estudo de delimitação da terra. O grupo seria formado por cinco pessoas: um antropólogo, um profissional com formação na área ambiental, um com conhecimento em cartografia, outro com formação agronômica ou fundiária e um procurador federal. Em caso de divergência, uma câmara de conciliação a ser criada no âmbito do Ministério da Justiça dará a opinião final.

– A mudança não resolve o problema histórico da Funai, que é a falta de quadros especializados, principalmente antropólogos. É uma lacuna importante. Muitos estudos não são realizados ou se estendem ao longo do tempo por falta de pessoas qualificadas. E a portaria não toca nisso – diz o sociólogo Sérgio Sauer.

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