A valorização de quase 49% do dólar em 2015 tem sido bastante benéfica para os produtores agropecuários do Brasil, por baratear os nossos produtos no mercado internacional, puxando as exportações. No entanto, os ganhos de algumas culturas estão sendo prejudicados pelas quedas nas cotações internacionais.
Abaixo, você confere um levantamento feito pelo Canal Rural sobre os benefícios e os problemas que o dólar alto traz a diversos setores.
Café
As 120 mil sacas de café arábica produzidas por ano na cooperativa Coopinhal, em Espírito Santo do Pinhal, interior paulista, abastecem o mercado interno e países como a Rússia, Coréia do Sul e Canadá. As recentes quedas na cotação do produto na bolsa de Nova York causaram estranheza, mas com a alta do dólar, a redução não foi sentida por aqui.
– Países que exportam commodities tem que torcer para ter uma moeda desvalorizada. Isso traz a oportunidade do produto que é produzido internamente ser ofertado por um preço mais acessível ao tomador internacional. O momento que a gente vive da economia hoje para quem produz café ou qualquer outra commodity agrícola é favorável – diz o diretor da cooperativa, Daniel Bertelli
A produção de café no Brasil atende cerca de 30% da demanda mundial pela commodity. Para Bertelli, que negocia o produto com compradores nacionais e internacionais, a queda nos preços não tem relação com a desvalorização do real, mas com a forte presença do café asiático no cenário global.
– O produtor esquece que o mundo hoje mudou completamente seu blend de tomar café. Então o café robusta que é originado no Vietnã tomou muito o mercado de cafés arábica e o mercado se autossustenta com outras originções.
Já para o analista de mercado Eduardo Carvalhaes, o recuo do preço internacional do café não tem relação com os altos estoques mundiais do produto, mas sim com a instabilidade da economia brasileira.
– Como o Brasil é o maior produtor, toda vez que o dólar se valoriza em relação real já existe quase que culturalmente na cabeça dos operadores de bolsa que o preço deve cair em dólar para compensar essa valorização do dólar no Brasil. Então eles derrubam a bolsa. Nós temos notado isso, o produtor de café que acompanha a bolsa de Nova Iorque deve estar notando que conforme o dólar se valoriza em relação ao real eles derrubam a cotação do café em Nova Iorque. Ou seja o produtor até agora não se beneficiou –diz ele.
Soja e milho
Enquanto para o café o dólar possui efeitos mistos, a soja e o milho estão sendo bastante beneficiadas pela valorização, tanto que conseguem compensar as quedas nas cotações internacionais e bancar os custos da próxima safra.
– Os preços internos, sobretudo da soja, estão sendo constituídos pelo câmbio. Estamos vivendo um dos piores momentos de preços internacionais da soja dos últimos seis anos, mas os preços nominais [descontando a inflação] internos estão nos melhores patamares – diz analista de mercado da Granoeste Camilo Motter.
A avaliação é corroborada pelo consultor em agronegócio Carlos Cogo. Segundo ele, a expectativa do mercado e dos produtores no primeiro semestre era de que os prêmios pagos nos portos chegassem a R$ 29. Atualmente, eles estão na faixa de R$ 35.
Ele explica que o milho foi o principal beneficiado pela aceleração do câmbio nos últimos meses, pelo fato de as exportações ocorrerem principalmente na segunda metade do ano, quando o dólar disparou em relação ao real. A produção elevada e a dificuldade de armazenar atrasou o embarque, o que deve levar a commodity a aproveitar mais um pouco o câmbio alto.
A soja também registrou ganhos em julho e agosto, embora a maior parte das exportações tenha ocorrido no segundo trimestre, quando a moeda norte-americana acumulou queda de 2,57% em relação ao real.
Com os preços em alta, os produtores estão aproveitando para antecipar as vendas da próxima temporada e, assim, compensar os gastos que tiveram com insumos cotados em dólar, comprados há quatro meses.
–Quase 40% da segunda safra de milho de Mato Grosso já foi vendida, assim como 35% da soja. O produtor já se protegeu. A lucratividade da safra 2016 deve ser alta – diz Cogo.
Para Motter, o agricultor precisa ter cautela com os ganhos obtidos pelo câmbio, pois este cenário em algum momento vai virar. Ele afirma que, quando este cenário ocorrer, o produtor acabará vendendo com um câmbio mais baixo tendo constituído os custos em cotações mais elevadas.
– O duro será quando o câmbio inverter, o momento é de cautela. O produtor tem que constituir um colchão para aguentar este momento – diz.
Ele não acredita que esta situação ocorrerá no curto ou médio prazo. Neste período, diz ele, o produtor precisará ficar atento a outros dois fatores que podem diminuir seus ganhos: a desaceleração da demanda da China e a entrada da safra dos Estados Unidos, prevista para ser cheia.
Carne
O volume e a receita das exportações de carne bovina brasileira apresentaram quedas pelo oitavo mês consecutivo. Atualmente, o preço do boi gordo brasileiro é o mais baixo do mundo. A desvalorização do real chegou a 29,8% nos últimos três meses e tornou a carne bovina ainda mais competitiva. É essa dinâmica de mercado que impactou principalmente a receita das exportações em 2015.
– Você tende a deslocar os concorrentes, ou seja, você ganha mercado dos concorrentes, mas não está ganhando mercado porque o mercado está crescendo, o mercado mundial de carne bovina não está crescendo. O que acontece é que você está avançando na parcela dos concorrentes, pra você avançar você tem que vender mais barato, então, consequentemente, o preço da carne cai – explica o diretor técnico da Informa Economics FNP, José Vicente Ferraz.
Outro aspecto determinante para as quedas foi a drástica baixa nos preços do petróleo em 2015. Importadores como a Rússia e a Venezuela perderam poder de compra com a fase baixista da commodity mineral.
– O petróleo caiu de preço fortemente e isso afetou diretamente a entrada de recursos nesses países. Segundo, as moedas desvalorizaram muito e isso significa que a importação fica mais cara. É o mesmo que está acontecendo no Brasil, a moeda desvaloriza, a importação encarece. Então, essas duas coisas combinadas, junto com uma pauta de exportações complicada, no sentido de ser basicamente países pobres, dificultou a sustentação desses volumes – diz o analista da MB Agro, César Castro Alves.
A expectativa é que o último trimestre de 2015 seja de altas em relação aos meses anteriores. Nas duas primeiras semanas de setembro, as exportações de carne bovina brasileira apresentaram movimentos intensos, cenário que retomou o fôlego otimista do mercado.
– Nós vamos ter quatro meses finais bastante bons, mas eu não acredito que seja possível recuperar o todo dos oito meses que foi inferior a 2014 – ano muito bom de exportações de carne bovina. Mas vai ser ainda um ano bastante bom. Abre a perspectiva de em 2016 nós termos um ano bastante bom de exportações em carne bovina, porque com esse efeito do câmbio, o Brasil já é muito competitivo porque consegue produzir com custo baixo, mas com este câmbio a perspectiva é que o Brasil ganhe bastante mercado – projeta Ferraz.
Para Castro Alves, a pecuária está equilibrada e o boi é um ativo hoje, um dos poucos que não tem preços menores do que no ano passado.
– É um cenário muito equilibrado, não dá pra dizer que esse resultado é ruim, mesmo porque nós estamos num momento ainda de baixa oferta do ciclo pecuário, porque os pecuaristas estão retendo gado e se isso tivesse acontecendo em um momento em que as exportações não estivessem muito fortes, certamente o consumidor brasileiro ia estar pagando essa diferença – diz o analista.