O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) quer proibir agricultores de salvar sementes, limitando a prática aos pequenos produtores. Essa medida está em um anteprojeto de lei parado no Ministério há quatro anos. A questão está sendo discutida por comissão especial instalada no Congresso que quer atualizar a Lei de Proteção de Cultivares.
A cada ano, o Mapa recebe entre 300 e 320 pedidos de proteção de cultivares e autoriza entre 220 e 240. A ideia é aumentar esse número com a modernização do sistema administrativo, proposto no anteprojeto de lei, que foi desenvolvido em parceria com o setor produtivo, indústrias e entidades de pesquisa, como a Embrapa.
Essa discussão começou em 2007, dez anos após a criação da Lei de Proteção de Cultivares, mas somente em 2011 foi encaminhada à Casa Civil.
– Houve discussões, chegou a um bom termo numa minuta que foi encaminhada pelo Ministério para a Casa Civil. Ela foi devolvida para o Ministério por causa do ambiente político, que não foi considerado ideal para o envio à Câmara [dos Deputados] – disse o coordenador de Tecnologia, Inovação e Recursos Genéticos do Ministério da Agricultura, Fabrício Santos.
O anteprojeto não está sendo discutido oficialmente no Congresso, mas as propostas fazem parte dos debates da comissão especial que trata da atualização da Lei de Proteção de Cultivares. E sobre a possibilidade de salvar sementes, de guardar parte da produção para cultivar na próxima safra, a posição do Mapa é clara: quer limitar a prática aos pequenos agricultores – aqueles que tenham propriedade de até quatro módulos fiscais e que a maior parte da renda venha da atividade agrícola.
O coordenador de Tecnologia, Inovação e Recursos Genéticos do Ministério explica que deixar os médios e grandes produtores de fora tem como objetivo proteger a pesquisa.
– Vamos pegar como exemplo o algodão. A gente tinha em media entre 40 e 50 cultivares protegidas por ano. Quando o uso próprio foi intensificado nessa cultura, o número de cultivares protegidas regrediu enormemente, em torno de dois a três por ano. A partir do momento que nós minimizamos, reduzimos o impacto do uso próprio, estabelecendo critérios claros. Eu acredito que isso venha reforçar o setor de melhoramento genético vegetal. No anteprojeto de lei é estabelecido uma sanção penal. Ou seja, cadeia para quem infringir esse direito – afirmou Santos.
A Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem) participou das discussões e defende a mesma linha para reduzir a pirataria de sementes. A estimativa da entidade é que 30% das sementes sejam salvas ou piratas no país.
– Os outros agricultores pagariam por essa tecnologia por considerar que tenha condições de pagar. Ele teria que comprar semente a cada safra, pagando royalties tudo direitinho, para que a indústria possa manter seus programas de desenvolvimento – diz o presidente da Abrasem, José Américo Rodrigues.
Os agricultores não abrem mão do direito de salvar sementes e, para isso, concordam em pagar para o obtentor do germoplasma um valor justo. Atualmente, o pagamento de royalties sobre o germoplasma ocorre apenas na compra da semente. Uma das propostas em discussão é que se pague também pelas sementes salvas.
– É extremamente importante [discutir a questão], porque é direito do produtor salvar sementes, que regula o mercado, a questão dos preços, principalmente, e também protege o mercado da predação das multinacionais. Com a possibilidade de salvar sementes, as multinacionais não teriam como impor preços e controlar o mercado como acontece, por exemplo, nos Estados Unidos – disse o presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Ricardo Tomczyk.
A deputada federal Tereza Cristina (PSB-MS), que participa da comissão especial, apoia a estratégia. A preocupação dela não é desestimular a pesquisa, mas também não cobrar tão caro pela semente que acabe incentivando a pirataria.
– Eu acho que você pode dar a ele um valor. Não podemos salvar só para o pequeno. Agora, se ele salvar e vender essa semente salva que seria pra uso próprio, ele tem que ser punido exemplarmente. O que não podemos mais é brincar – disse.