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Aécio Neves promete participação dos Estados na demarcação de terras indígenas

Em entrevista ao Rural Notícias, o candidato do PSDB disse que pretende seguir recomendações feitas do STF quando Raposa Serra do Sol foi demarcadaO candidato à Presidência da República Aécio Neves (PSDB) concedeu entrevista ao Rural Notícias sobre os seus pontos cruciais para o desenvolvimento do agronegócio: infraestrutura e logística, autonomia do Ministério da Agricultura, questão indígena e macroeconomia.

No início de agosto, o Rural Notícias também entrevistou Eduardo Campos (PSB). A candidata Dilma Rousseff (PT) também foi convidada, mas ainda não confirmou a disponibilidade para participar.

Veja abaixo a entrevista em vídeo veiculada no Rural Notícias e a íntegra de todas as respostas dadas aos entrevistados. Acompanhe a cobertura de eleições do Canal Rural no site especial.

INFRAESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO MINISTERIAL

Alessandra Mello: Qual será o modelo de investimentos do seu governo e o volume de recursos para a infraestrutura? Serão as parcerias público-privadas, concessões ou privatizações?

Ampliar a competitividade de quem produz é essencial para sairmos dessa incômoda posição de lanterna em crescimento em toda a nossa região, que se repetirá esse ano. Par isso é absolutamente fundamental que decretemos guerra ao custo Brasil, e isso passa especificamente pela questão da logística. Infelizmente o Brasil é hoje um cemitério de obras abandonadas e inacabadas, boa parte delas com sobrepreço.

Há poucos dias anunciei que criarei dois grandes e fortes ministérios: o Ministério da Infraestrutura e o Superministério da Agricultura – incorporando inclusive as atividades da pesca e aquicultura, que são importantes e relevantes, dentro dessa mesma estrutura organizacional, para que elas possam ter efetividade.

A estratégia dos investimentos e a política agrícola serão definidos pelo presidente, e executadas, no caso da Agricultura, por ser alguém do setor, que deverá ser capacitado para interferir, inclusive, ao lado do Ministro da Infraestrutura, do Ministro da Fazenda e do Ministro do Planejamento. Esses quatro ministérios serão ordenadores da estratégia de retomada do crescimento do país.

Eu fui governador de Minas Gerais por dois mandatos. Minas é hoje o Estado brasileiro que tem o maior conjunto de parcerias público-privadas que deram certo – no setor rodoviário, na saúde, no saneamento básico e até uma parceria inédita no sistema prisional. O que nós precisamos no Brasil é criar um ambiente menos hostil do que é hoje, buscar chegar a um ambiente que estimule ao capital interno privado e ao capital externo, que deixou de vir para o Brasil, para serem nossos parceiros nos investimentos estratégicos que visem melhorar nossa competitividade do ponto de vista de logística.

Para isso é fundamental que tenhamos marcos regulatórios claros, regras que sejam cumpridas – esse modelo intervencionista que está aí hoje no Brasil é o contrário do que nós queremos, ele afugenta esses capitais. Então nós vamos definir, com a participação da área da agricultura e da pecuária, quais são nossas prioridades em termos de logística. E eu pretendo dar uma ênfase muito grande a ferrovias e hidrovias. Estabelecendo, inclusive, o marco regulatório das ferrovias que não existe até hoje, para que quem venha investir no Brasil tenha tranquilidade de saber em que condições vai investir e qual expectativa de retorno terão. Não cabe ao governo federal e muito menos ao presidente da República estabelecer o retorno para determinado investimento privado. Cabe a ele criar as condições de crédito, estímulo e regras claras para que nós possamos dar um salto de logística no Brasil.

Alessandra Mello: Dessa forma o Sr. diz que acredita mais na privatização do que na parceria público privada, seria isso?

Não, ao contrário, nós temos que trazer o capital privado para as parcerias público-privadas. Onde o capital privado puder vir para aquilo que solitariamente o Estado não pode fazer, ele é muito bem-vindo. Não podemos discriminá-lo. O tempo é o ativo mais valioso da política, nesses 11 anos, o governo que está aí demonizou as privatizações e as parcerias com o setor privado, nos atrasou demais.

Hoje nós temos algumas obras iniciadas, outras anunciadas, mas o tempo perdido se foi. Perdemos 10 anos de investimentos que já poderiam estar permitindo uma competitividade maior, melhores resultados para o agronegócio – e também para a indústria brasileira – que deixaram de vir.

O nosso governo será o governo das regras claras, da transparência, do estímulo às parcerias com o setor privado, que se darão em concessões, em parcerias público-privadas e, em determinados momentos, pela ação do próprio Estado.

MACROECONOMIA

Ivan Wedekin: Como nós podemos ter uma macroeconomia que crie um ambiente mais favorável não somente para o agro, mas para todo o setor produtivo brasileiro?

Todos nós de alguma forma dependemos do macro. O que nós assistimos é que, desde a segunda metade do segundo mandato do presidente Lula, nós começamos a ver flexibilizados aqueles pilares fundamentais que sustentaram a economia brasileira até aquele instante: metas de inflação, câmbio flutuante e superavit primário. Portanto, resgatar esses pilares com uma política fiscal absolutamente transparente é essencial para resgatar aquilo que é essencial à retomada dos investimentos e que, por sua vez são vitais para o crescimento, que é a credibilidade.

O quadro que o atual governo deixará para o próximo presidente é um quadro de estagflação, de estagnação do crescimento, com a inflação ultrapassando o teto da meta e, o que é extremamente grave, uma crescente crise de confiança no Brasil.

Ao longo dos últimos meses eu tenho acompanhado os dados da Fundação Getúlio Vargas. Nos últimos sete meses, a cada mês é maior a desconfiança do empreendedor – seja do campo, seja da indústria, seja da área de comércio e serviços. Isso tem que parar. Nós temos que resgatar a confiança no Brasil, e para isso nós vamos ter uma política macroeconômica que valorize, que resgate esses pilares. Isso será essencial para resgatarmos a capacidade de atrair investimentos para o Brasil. O resto é consequência disso.

Márcio Fernandes: Em seu plano de governo o Sr. tem falado em baixar o custo Brasil para os empresários agropecuários. De que forma pretende fazer isso?

A minha escola política – e eu tenho respeito pessoal pela presidente, sempre faço questão de registrar isso – tem uma discordância profunda em relação à capacidade que ela tem de conduzir um país com as complexidades do Brasil. Mas falo da minha escola política, que é do diálogo, de ouvir. Não é da imposição, não é a da verdade absoluta que nos levou hoje a pior crise da nossa história contemporânea, por exemplo, no setor energético, com consequências para todos nós. Estou citando apenas um exemplo. Poderia falar do intervencionismo na Petrobras, também com efeitos no agronegócio, e no etanol em especial.

O que eu quero estabelecer no Brasil é uma nova forma de fazer política. Uma nova relação política dentro do parlamento. Minha experiência de quase 20 anos como congressista, líder partidário durante o governo do presidente Fernando Henrique, depois presidente da Câmara dos Deputados; com a minha experiência no poder executivo; é importante para restabelecer a capacidade de fazermos a boa política.

E a boa política é essencial para que nós possamos colocar em prática os objetivos de qualquer governo. Eu não acho que esse governo deixe de ter boas intenções, deve ter suas boas intenções, ninguém quer que o Brasil vá mal. O problema é que eles perderam a capacidade de executar. O governo é hoje um emaranhado de órgãos conflitantes entre si, com um aparelhamento absurdo da máquina pública a servir um projeto de poder muito mais que um projeto de país.

Nós temos que resgatar a meritocracia na gestão pública, resgatar nossas agências reguladoras como instrumentos da sociedade brasileira, e ter foco, ter prioridade. E o agronegócio no nosso governo é uma prioridade não por um gesto de atenção aos homens que labutam no campo, mas por um gesto de inteligência em relação ao Brasil. É aí que nós temos potencial para gerar riqueza interna, alimento interno, alimentos mais baratos, mas, também, divisas para o Brasil.

Márcio Fernandes: O Sr. está preparado para enfrentar uma minoria no Congresso? De que forma o Sr. vai colocar em prática isso que o sr está prometendo?

Vou lhe dizer sem falsa modéstia, ninguém está mais preparado do que eu para isso. Pela minha vivência de 20 anos de parlamento e pela autoridade que o nosso governo terá. Minas talvez seja meu melhor exemplo. O governo precisa de liderança, o governo precisa de um presidente que tenha posições absolutamente claras, articule e lute para que essas posições sejam viabilizadas.

Vou citar um exemplo de um passado não muito remoto. Eu assumi a presidência da Câmara dos Deputados numa eleição onde não era o favorito e disse que nós precisávamos resgatar minimamente a credibilidade, nós precisávamos reaproximar o parlamento, que é a casa do povo brasileiro, dos seus representados, da sociedade brasileira. E tínhamos que acabar com o flagelo da imunidade parlamentar.

Até o meu mandato era impossível processar um parlamentar qualquer que fosse o desvio que ele tivesse cometido ou o delito do qual estivesse sendo acusado. Tinha que pedir autorização ao Supremo Tribunal Federal que, com todas as chicanas que ali existiam, nunca dava essa autorização antes do término do mandato. Todos achavam que aquilo era uma loucura. Reuni os líderes partidários, fizemos uma profunda articulação, aquilo era em benefício de todos, nós não podíamos ser corporativos naquela questão, aquilo era contra os maus parlamentares. Aprovamos com uma imensa maioria.

Medidas provisórias, quando eu assumi a presidência da Câmara, as medidas provisórias eram reeditadas sem qualquer necessidade de votação. Se hoje é grave o uso abusivo de medidas provisórias, ele era trágico há 10 anos. Quando assumi a presidência da Câmara, as medidas provisórias do Plano Real, que tinham sido publicadas em 1994, portanto sete anos antes, ainda estavam numa gaveta e nunca seriam votadas. Fizemos uma ampla negociação junto ao Poder Executivo, junto ao próprio presidente Fernando Henrique – que talvez preferisse que as coisas ficassem como estavam porque, a partir daquele momento, ele passou a ter que construir maiorias para aprovar suas medidas provisórias – nós conseguimos dar os primeiros passos para a restrição das medidas provisórias. Então são exemplos de que com liderança e com foco claro é possível sim nós construirmos maioria, para a reforma política, para a simplificação do sistema tributário e para o redesenho do Estado Nacional.

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AGRICULTURA FAMILIAR E A RELAÇÃO MAPA E MDA

Ivan Wedekin: Qual sua visão sobre a agricultura familiar? Como integrar mais essas famílias no mercado?

Alessandra Mello: Se eleito, o seu Ministério da Agricultura vai incorporar o Ministério do Desenvolvimento Agrário, onde estão as políticas da agricultura familiar ou o Sr. pretende manter um ministério autônomo focado nesse público?

Nós estamos definindo o novo desenho do Estado Nacional. É inadmissível que alguém consiga governar bem com 39 ministérios, até porque não tem nem fisicamente condições de estar conversando com esses ministros. Acaba-se criando núcleos de poder dentro do governo, em que alguns ministros controlam outros e as ações efetivamente não acontecem.

Para falar de uma questão essencial, que é a agricultura familiar, nós temos que falar também dos assentamentos. Nos últimos três mandados, desde Fernando Henrique até aqui, nós tivemos entregues à reforma agrária alguma coisa em torno de 72 milhões de hectares. Hoje nós temos áreas plantadas de grãos no Brasil alguma coisa em torno de 50 a 53 milhões de hectares. Eu aprendi muito cedo – sou um homem da roça como se diz em Minas Gerais – que a simples distribuição da terra não significa geração de renda pra ninguém. Ela tem que vir acompanhada de outras políticas que hoje estão em falta no Brasil, que é a capacitação técnica, instrumentos de fortalecimento da comercialização, seguro a essas pessoas. Essas ações têm que ser conduzidas de forma absolutamente integradas.

É absolutamente fundamental nós integrarmos essas dezenas de milhões de agricultores familiares – que têm vocação para essa atividade, que não querem, ao contrário do que alguns pensam, deixar a zona rural, deixar o campo – para que possam viver ali com dignidade. O que nós não podemos permitir que continue acontecendo no Brasil é aquilo que pouco tempo atrás disse um falante ministro do governo federal – e nesse momento eu concordo com ele – de que algumas dessas áreas se transformaram em verdadeiras favelas rurais.

O que nós temos é que ter um foco nessas políticas de estímulo, com apoio tecnológico. Nós temos institutos estaduais de tecnologia que estão sem serem utilizados na sua potencialidade e podem ser instrumentos importantes de apoio técnico a estes pequenos produtores. Eles têm que ter uma política direcionada a mercados reais, a mercados que existam, porque eles ajudam não apenas na sua própria subsistência, mas a que os brasileiros possam ter alimentos mais baratos.

Nós não estamos ainda com o desenho completo desse novo ministério. Eu acredito que alguma coisa em torno de 22, 23 ministérios seja um arcabouço adequado para que as várias áreas tenham estratégias, e instrumentos para viabilizar essas estratégias. O que eu já defini, até por respeito também, é o setor da pesca. Eu acho que nós teremos muito mais condições de apoiar o setor, que tem um potencial de desenvolvimento enorme do ponto de vista social, emprega muita gente – nos últimos dias aprovamos no Senado inclusive a garantia de contagem de tempo de aposentadoria na época do defeso, em que os pescadores não podem pescar. Essas atividades podem estar com muito melhores resultados dentro de uma estrutura que funcione, com um ministro com autoridade, do que como um ministério lateral do governo, como existem vários outros.

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QUESTÃO INDÍGENA

Márcio Fernandes: Candidato, nesse momento há uma lentidão do Ministério da Justiça com relação às questões indígenas. Como o Sr. pretende resolver essa questão?

Alessandra Mello: Queremos saber se no seu governo a Funai ficaria com a responsabilidade da demarcação de terras indígenas ou se seria outro órgão. Qual é o modelo que o Sr. imagina para este tema?

O meu governo será um governo cumpridor da Lei. A Constituição define com muita clareza quais são os requisitos para que uma área seja efetivamente considerada área indígena. Há uma decisão do Supremo Tribunal Federal tomada pelo ex-ministro Carlos Alberto Direito algum tempo atrás, quando se discutia em Roraima aquele grande contencioso [relativo à demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol], que estabelece as bases que serão seguidas pelo governo.

No meu governo não haverá a omissão que existe hoje. A Funai será sempre um instrumento importante nessas definições. Mas não deve ser a única voz a ser ouvida. Nessas decisões precisam ser ouvidas as realidades locais. Os Estados têm, em vários momentos, que participar também dessa decisão. Portanto, o nosso governo exercerá a sua liderança para dirimir conflitos e fazer cumprir a Constituição e a decisão do STF. Isso por si só gerará um clima de maior estabilidade e confiança para que as comunidades indígenas tenham os seus direitos, a sua preservação e a sua cultura garantidos, mas, por outro lado, o produtor tenha tranquilidade e paz para produzir cada vez mais.

ETANOL

Alessandra Mello: O Sr. pretende mudar a política que vem favorecendo a gasolina e diminuindo a competitividade do etanol?

No meu governo as empresas públicas não serão nem instrumento de política econômica, e nem de projetos de manutenção de grupos no poder. A Petrobras será desaparelhada. Brincavam conosco lá atrás que o PSDB era o partido das privatizações, eu quero reestatizar a Petrobras. Tirá-la das mãos de um grupo político e entregá-la aos seus verdadeiros donos, que são os brasileiros.

O meu governo terá uma marca, a da previsibilidade. Recuperar o etanol é uma responsabilidade econômica, pela importância que tem. Importância social, pela empregabilidade que traz; e também ambiental. Tenho conversado com as principais lideranças do setor e nós vamos, já a partir do primeiro dia do governo, estabelecer uma estratégia para resgatar essa extraordinária fronteira de tecnologia que nós desenvolvemos ao longo de 40 anos e que, infelizmente, o atual governo jogou pela janela.

Ivan Wedekin: Caso seja eleito, o Sr. vai usar sua caneta de presidente para fazer com que o agronegócio, cada vez mais, seja uma das mais importantes locomotivas do Brasil?

Com todas as dificuldades, já é a principal locomotiva do Brasil. O que seria de nós não fosse o agronegócio? Se temos um crescimento pífio hoje, só não temos um crescimento negativo graças ao agronegócio. Nós vamos torná-lo cada vez mais competitivo. Nós vamos introduzir as empresas brasileiras do agronegócio nas cadeias globais de produção. Vamos sair desse alinhamento ideológico na nossa política externa, que não nos permite ampliar mercados, ao contrário, restringe os nossos mercados. Vamos fazer uma política internacional altiva, pragmática, na busca de parcerias que impactem no desenvolvimento da nossa economia e da nossa produção. Eu não quero apenas ser o candidato, mas eu quero governar em parceria com o agronegócio brasileiro, por um gesto de inteligência e de responsabilidade para com o Brasil.

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