Cem mil agricultores familiares sobre os quais o Serasa Experian têm informações de pagamento poderão contratar crédito rural usando um aplicativo de celular. Conhecida por analisar o perfil dos consumidores e dar-lhes notas — os chamados scores — com base nos pagamentos, a empresa decidiu se aproximar do agro dois anos atrás e, agora, dá um passo importante em um universo de mais de 4 milhões de produtores rurais.
O crédito rural será concedido por bancos, agritechs e outras instituições financeiras dentro de um marketplace. Um balcão virtual em que as empresas têm acesso ao score do produtor e podem oferecer recursos de financiamento com condições personalizadas. De acordo com o diretor do DataLabs da Serasa Experian para a América Latina, Marcelo Pimenta, a estimativa é de que os empréstimos totalizem R$ 1,25 bilhão, com média de R$ 12,5 mil por agricultor.
Como surgiu a plataforma?
Logo no começo dos estudos sobre o agro, a empresa percebeu que o setor tinha particularidades, como as transações que estavam fora do radar do cadastro positivo. “Aqueles contratos de gaveta entre produtor e trading ou produtor e revenda, que não estão registrados”, exemplifica.
A partir desse problema, a empresa criou um birô que reúne informações de distribuidoras de defensivos agrícolas e tradings, possibilitando uma visão mais precisa dos perfis dos produtores. “Você passa a saber, por exemplo, se ele costuma cumprir contratos ou não. Isso remete à reputação e ajuda a avaliar o risco no momento de emprestar crédito”.
Com essas informações, a Serasa desenvolveu o Agriscore, que é como um score de crédito comercial, mas que leva em consideração fatores específicos do agronegócio, como o risco de se produzir menos em um ano marcado pela seca.
Porém, os produtos lançados pela empresa até então atingiam apenas agricultores e pecuaristas mais organizados. Diante disso, a empresa decidiu criar um novo projeto, focado nas 4 milhões de famílias que trabalham com agricultura familiar no país.
Ouvindo quem entende a agricultura familiar
Nesta primeira fase, que deve durar seis meses, a empresa vai analisar o comportamento de cem mil produtores rurais sobre os quais o Serasa já tem algumas informações, para, depois desse prazo, abrir a loja virtual para toda a agricultura familiar. Segundo Pimenta, esses produtores também poderão fornecer mais dados para elevar a nota dentro da plataforma de risco.
“Você, produtor, dá o consentimento e sobe essas informações. A gente reavalia e vê que o seu score não é 500, mas 720. Isso vai depender da quantidade de informações que o produtor fornecer, como a DAP [do Pronaf]”, diz. “Se ele foi usuário do Pronaf nos últimos dez anos e informa isso, maior será a chance de ter um score maior. Logo, será maior a chance de conseguir um financiamento”.
O representante do Serasa fria que os dados e informações fornecidos pelo produtor rural serão usados única e exclusivamente para avaliação de risco. “Não são usados para marketing, listas ou mala direta. Apenas para intermediação com o setor financeiro, para trazer melhores informações de crédito”.
Para criar o score desse público maior, a Serasa contará com apoio da Confederação Nacional dos Agricultores Familiares (Conafer). “Eles conhecem o produtor rural, sabem onde ele está e o que produz. Mais do que isso, sabem a linguagem do campo. A Serasa é uma empresa tipicamente urbana, que atua basicamente no ramo de crédito para o consumidor da cidade, então a gente precisa aprender esse linguajar e ponto de vista do setor”, afirma Pimenta.
Condições de pagamento e outras informações
Como mencionado, a média dos empréstimos é estimada pelo Serasa em R$ 12,5 mil. A projeção leva em consideração que 60% dos cem mil produtores cadastrados na fase de teste tem renda familiar inferior a R$ 10 mil por mês. “Essa estimativa está colada à capacidade de pagamento, e é um valor relevante para custeio da produção”, diz.
O diretor do DataLabs afirma que as condições de pagamento e o limite de empréstimo vão variar de acordo com as instituições interessadas naquele agricultor. Questões climáticas e de localização que representam risco à produção podem influenciar nas taxas de juros e demais condições.
“Você pode ter o mesmo risco de pagamento de um outro produtor, mas está em um ano e local que tem previsão de seca. Assim, sua produtividade pode ser menor, e isso se reflete no score. A empresa pode, por exemplo, deixar de oferecer R$ 10 mil para custeio e optar por ofertar R$ 7 mil, que é algo mais alinhado ao que você vai conseguir pagar”, diz.
Sem projeto e sem penduricalhos para o produtor
O recurso do crédito rural oficial tem fins específicos e, por isso, os produtores são cobrados de projetos, quando querem tomar dinheiro para investimento. No caso da Serasa, como é uma ação da iniciativa privada, confiando na avaliação de risco, a apresentação do projeto não é condição para obter um financiamento. “Claro que, como eu disse, quanto mais informações ele compartilhar, melhor o score de crédito. O fato de ele ter um projeto pode ajudar na avaliação de risco”, comenta.
Outra vantagem, de acordo com Pimenta, é que o produtor se verá livre dos penduricalhos. “Quando ele quer levantar R$ 100 mil em um banco oficial, tem que pagar pelo projeto, seguro e uma série de taxas que vão colocando. Então, ele vai pegar R$ 100 mil e tem que deixar R$ 15 mil. Na plataforma, o custo para o tomador de crédito será zero”, diz.
Além disso, o agricultor familiar terá mais opções de financiamento no ambiente digital. “Às vezes, na região, o produtor tem dois, três gerentes. São as opções dele. Aqui, com a relação digital, terá 20, 30 instituições fazendo oferta de crédito para ele. E é ele quem decide qual oferta vai aceitar”.