“Precisamos ser o centro do mundo da ciência quântica aplicada ao agro, ter uma visão estratégica. Há uma nova revolução quântica em curso, que depende de um conhecimento profundo. Temos uma comunidade acadêmica forte que domina esse conhecimento. É urgente um projeto de inovação a longo prazo no país”.
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Essa foi a síntese final do 1º Workshop de Tecnologias Quânticas no Agro, feita por Paulo Nussenzveig, pró-reitor de Pesquisa e Inovação da USP. O evento foi realizado pelo Laboratório Nacional de Agro-Fotônica (Lanaf), da Embrapa Instrumentação (São Carlos – SP) de forma híbrida e está disponível no YouTube.
De acordo com a Embrapa, os especialistas discutiram as perspectivas, os problemas e as iniciativas bem-sucedidas de empreendedorismo nesta área para o país. As tecnologias quânticas estão presentes em diversos desenvolvimentos tecnológicos tais como GPS, LED, câmeras digitais, computadores, laser, e também podem contribuir intensamente com o setor agropecuário.
Novas oportunidades
“A criptografia quântica, por exemplo, pode ser utilizada para a rastreabilidade dos produtos do agro”, disse a pesquisadora Débora Milori, chefe adjunta de Transferência de Tecnologia da Embrapa Instrumentação e organizadora do workshop. “Podemos desenvolver sensores aplicados à fitossanidade animal”, acrescentou o também pesquisador Luiz Alberto Colnago, da Embrapa Instrumentação, palestrante no evento.
“As tecnologias quânticas podem ser aplicadas para a produção de plantas mais nutritivas”, disse Renato Luzzardi, líder de inovação e parcerias em Pesquisa & Desenvolvimento da Bayer para a América Latina, durante sua apresentação.
Já o professor Ben-Hur Viana Borges, da Escola de Engenharia de São Carlos – USP sugeriu a criação de um centro de pesquisas da engenharia em sensores (inclusive quânticos) voltados para a agricultura, com a participação da Embrapa Instrumentação, após relatar oportunidades de pesquisa em imageamento quântico e computação quântica para tratamento maciço de dados.
Conhecimento e segurança nacional
Na avaliação de Oswaldo de Oliveira Júnior, diretor do Instituto de Física de São Carlos – USP, existe a “necessidade de avanços em metrologia, monitoramento, comunicação e nas tecnologias quânticas, que precisam ser dominadas pelo nosso sistema de ciência e tecnologia, pois a segurança nacional depende de C&T e o conhecimento precisa ser passado para a sociedade”.
A ciência quântica tem motivado iniciativas como uma chamada da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (EMBRAPII), lançada em 2022, para a criação de um Centro de Competência em Tecnologias Quânticas, explicou o coordenador geral de Tecnologias Habilitadoras do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Felipe Belucci, que falou de forma remota no workshop.
Coordenador da mesa redonda sobre “Oportunidades das tecnologias inspiradas em quântica para o agronegócio produtivo e sustentável” e do CPqD (Campinas – SP) – laboratório integrador do Sistema Nacional de Laboratórios de Fotônica – o pesquisador João Batista Rosolem vê uma grande oportunidade nas tecnologias quânticas, e avalia a possibilidade de um projeto integrador temático com os 11 laboratórios do Sisfóton.
Indicadores tropicais
Quem também destacou oportunidades para esse tema foi a representante diplomática brasileira junto à FAO – Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação – Carla Barroso Carneiro, também palestrante no workshop de forma remota, após ressaltar que a instituição criou, em 2020, o cargo de cientista-chefe.
A embaixadora acredita na possibilidade da atuação de consultores contratados para termos de referência e documentos da FAO, bem como nos bancos de dados da instituição. Ele ressaltou a importância da “tropicalização” dos indicadores da Organização, que hoje são baseados nos países de clima temperado, que possuem apenas uma safra agrícola, ao contrário do Brasil que possui duas e, em determinados casos, até três safras no mesmo ano.
Os dados da produção agropecuária do país foram apresentados por Ladislau Martin Neto, pesquisador e ex-diretor de P&D da Embrapa, que além de enfatizar a necessidade da Empresa fortalecer a atuação internacional, lembrou que a inovação no campo só ocorre, efetivamente, se chegar ao produtor rural e se houver transformação, pois a tecnologia é quem tem feito a diferença para o Brasil produzir mais e de maneira sustentável.
Trajetória em construção
A construção da iniciativa quântica no Brasil começou há dois anos e meio, de acordo com Paulo Nussenzveig, e teve outra ação decisiva entre os dias 30 de janeiro e 16 de fevereiro de 2023, quando o Instituto Principia e o Instituto Sul-Americano para Pesquisa Fundamental (ICTP-SAIFR) promoveram o workshop “Tecnologias Quânticas para São Paulo, Brasil e a América Latina”.
“Não se trata de fazer algo para alavancar o próprio trabalho, mas algo que o país precisa, para estabelecer um mapa das principais linhas de tecnologias quânticas no Brasil e na América Latina. Esse é um projeto de inovação”, explicou Nussenzveig, acrescentando que há a necessidade de estabelecer uma presença na Região Amazônica e que existe a expectativa de um programa em tecnologias quânticas apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
“E foi justamente nesse evento, do qual também participei, que o professor Paulo nos incentivou a organizar o workshop em São Carlos. Nossa intenção foi conectar universidades, instituições de pesquisa e a iniciativa privada em torno de um tema que deverá causar forte impacto no agro, incluindo também exemplos como as empresas FIT e Agrorobótica, para mostrar que essa sinergia faz e fará ainda mais a diferença”, finaliza a pesquisadora Débora Milori.