Em 1985, aos 28 anos, Udo resolveu afastar-se das campinas bombardeadas por venenos da classe dos fosforados. Abismou-se ao constatar que uma pesquisa feita com 84 trabalhadores rurais de Colorado, na região noroeste do Rio Grande do Sul, por meio de análise de sangue, apontou contaminação em 22,61% deles. Quatro anos depois, selou o rompimento ao estudar agricultura tropical na Alemanha. Logo emendou um mestrado na Inglaterra, onde investigou os efeitos perniciosos do herbicida trifluralina.
De volta a Não-Me-Toque, onde nasceu e mora, Udo começou a produzir mudas de hortaliças, livres de agrotóxicos. Abriu uma floricultura, passou a utilizar os conhecimentos de Agronomia ? cursada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) ? em projetos de ajardinamento e paisagismo. Na terça-feira, dia 16, foi a Carazinho para embelezar a fazenda de um criador de cavalos. Uma das novidades será uma alameda, guarnecida por coqueiros alinhados simetricamente, que conduzirá ao casarão do estancieiro.
Udo também se dedica a fontes de energia alternativa, acionadas pela força do vento, da água e do sol. Obviamente, nenhuma delas pode atentar contra a natureza. No momento, está oferecendo um plano eólico com um cata-vento de 12 metros de altura e 150 quilos de peso, que gera 2 kW por hora. São 500 kW por mês, sem agredir a camada de ozônio ou agravar o efeito estufa, o suficiente para abastecer um pequeno edifício.
? Agora estou fazendo o que gosto, e preservando a minha saúde e o ambiente ? ressalta o agrônomo.
Não era assim antes. Durante nove anos, Udo foi exposto à neblina mortífera de agrotóxicos posteriormente vetados. Pegou a fase final dos clorados, depois padeceu com o auge dos fosforados, na década de 1980. Como atuava por uma cooperativa, tinha de examinar as máquinas de aspergir venenos e as lavouras dos produtores associados.
Proteção não era confiável
Arriscava-se tanto ? ou mais ? quanto os agricultores. Duas ou três vezes por semana, regulava a vazão dos bicos (pequenas torneiras) das pulverizadoras que são tracionadas por tratores. Devia garantir que a mistura ? tipo um litro de biocida para 200 litros de água ? fosse distribuída uniformemente. Udo apavorou-se quando viu um agricultor desobstruir um dos bicos da regadora soprando o furinho com a própria boca.
? As pessoas ignoravam o perigo que corriam ? lembra.
Uma das missões mais temidas era vistoriar a lavoura após a pulverização. Três dias depois, Udo entrava de botas de couro e macacão de brim na plantação ainda fumegante, para conferir se os insetos tinham sido mesmo eliminados. Sentia que o solo recendia a veneno, partículas químicas flutuavam, o bafio silencioso da morte não se dispersara.
O nariz de Udo impregnava-se. Bastava andar de carro pelas estradinhas rurais, a serviço da cooperativa, para aspirar as emanações provenientes dos cultivos. A única maneira de se proteger seria andar num escafandro, desses de mergulhar nos abissais do oceano, porque as máscaras disponíveis não eram seguras.
A morbidez dos pesticidas é passado. Atualmente, Udo cuida da floricultura, de cata-ventos e de baterias solares. Também faz ações comunitárias, como presidente dos conselhos do Meio Ambiente e de Segurança Pública de Não-Me-Toque. Está alarmado com outra praga, talvez mais devastadora que os agrotóxicos: o crack. Há cinco anos, a droga convulsiona a cidade com furtos e assaltos. É o novo desafio de Udo.