Cotonicultores da região sul de Mato Grosso estão registrando dificuldades com o nematoide reniforme (Rotylenchulus reniformis). Segundo o setor produtivo e especialistas, o complexo manejo têm levado a cultura do algodão a ser substituída pelo milho em grandes áreas.
A distribuição do nematoide reniforme pelos campos de algodão tem sido considerada preocupante em áreas produtoras como a Serra da Petrovina, no município de Pedra Preta, além de Campo Verde e Primavera do Leste.
Produtores da fibra e sementeiros revelam encontrar dificuldades até mesmo na sucessão com a soja, uma vez que esta reproduz primeiro o parasita e deixa uma herança populacional para o algodoeiro.
Diferentes estratégias de manejo são estudadas pela Fundação de Apoio à Pesquisa Agropecuária de Mato Grosso (Fundação MT), por meio da sua área de conhecimento em Nematologia, em parceria com sementeiros do estado. As pesquisas apontam que a adoção de algumas práticas contribuiu para a redução da infestação do parasita.
Conforme a Fundação MT, um dos experimentos está instalado na Serra da Petrovina, há três safras, em uma área de três hectares de algodão de longo prazo, onde o problema já existia. A nematologista e pesquisadora da instituição, Rosangela Silva, à frente do trabalho, explica que um dos principais pontos negativos da espécie é o de não existir hoje cultivar de soja de ciclo curto ou de algodão com resistência ao nematoide reniforme.
“É um nematoide de difícil manejo, não tem cultivar de soja ou algodão que seja resistente, a planta de soja nem morre e já vem algodão na sequência, então multiplica. E o reniforme, na ausência da planta hospedeira, sobrevive por 180 dias”, completa.
Sem sintomas visíveis
A pesquisadora da Fundação MT salienta que, além da capacidade de sobrevivência, o nematoide reniforme é um parasita que não causa sintomas visíveis nas raízes das plantas de algodão e a clorose foliar também não é comum, o que contribui para que sua presença seja menosprezada na lavoura.
“Somente com população alta é possível visualizar folhas carijós, porém, até 80 dias após a emergência, depois disso a folha cai e não se vê mais”.
Ainda de acordo com a Fundação MT, as plantas infectadas com R. reniformis são tipicamente subdesenvolvidas e menores que as plantas normais. Os estudos revelam que no algodão, as cultivares suscetíveis podem sofrer decréscimo de produtividade variando de 60,6% a mais de 74% em áreas de altas infestações.
Problema antigo
No Grupo Bom Jesus, que normalmente utiliza cinco mil hectares na Serra da Petrovina para o plantio de algodão, o nematoide reniforme também é considerado o mais prejudicial. “Há anos que em algodão é o mais grave, nem chega perto de nematoide de cisto na soja”, conta Daiane Cristina Flavio, coordenadora técnica regional. Ela acrescenta que a percepção da espécie nas áreas do Grupo foi em 2004 e que se tornou mais generalizada em 2010. “Está se expandindo em Campo Verde e Primavera do Leste. Na região do Médio-Norte, em Campos de Júlio (Parecis) e na Bahia temos um pouco menos, mas já há relatos”, completa.
A profissional explica que uma das estratégias da companhia tem sido rotacionar a soja com milho, alternando com soja-algodão. Também relata que como não há cultivar resistente, a opção é sempre escolher materiais com sistema radicular mais agressivo para áreas mais problemáticas, na tentativa de que sofram um pouco menos. “Também usamos produtos biológicos nas três culturas, soja, milho e algodão, percebemos que vem agregando”, diz.
Resultados da Fundação MT
Para o ensaio na Serra da Petrovina, a instituição utiliza cultivar de soja resistente ao nematoide de cisto (Heterodera glycines) em uma parte e cultivar de soja sem resistência a essa espécie em outra. Isso porque a resistência a cisto também contribui com a redução da população de Rotylenchulus, apesar de ainda assim deixar o parasita na área.
Além da escolha dos materiais genéticos, são utilizadas duas ferramentas biológicas de fungos e bactérias em consórcio, e uma química. Rosangela detalha que há poucas opções no mercado para ambas as abordagens. “Hoje temos 57 produtos biológicos para nematoides, mas apenas dois para Rotylenchulus, e poucos químicos também para a espécie”, pontua.
Nesta safra, a parcela de cultivar resistente do ensaio está com 40 centímetros a mais de desenvolvimento (com relação à suscetível), além de diferenças positivas no fechamento das linhas, na carga, no desenvolvimento das plantas e com a população de reniforme menor. “Estamos vendo o quanto é importante usar a cultivar certa, fazer essa escolha pensando no nematoide, e agregar as ferramentas químicas e biológicas. Isso está bem claro nas parcelas”, destaca a nematologista. Os resultados finais serão analisados com a colheita e apresentados no Encontro Técnico Algodão durante o painel “Avanços das ferramentas: genética, química e biológica no manejo de nematoides”.
Sobre a estratégia de rotacionar a soja com milho por uma ou mais safras, as pesquisas mostram que sim, é uma boa opção, mas que a redução da população vai depender da quantidade presente na área (em torno de 300 nematoides no momento do plantio de algodão já são suficientes para causar danos em alguma cultivar). “Às vezes é importante fazer uma safra de milho, mas é preciso avaliar bem qual a soja na sequência porque dependendo qual se escolhe, o produtor aumenta a população do reniforme por mais que tenha entrado com milho. E lembrando sempre de agregar nematicidas químicos e biológicos para aumentar a produtividade”, alerta.
Há mais práticas possíveis, segundo a pesquisadora, para se conseguir maior eficiência no manejo de R. reniformis, até mesmo usadas de forma preventiva. Recomenda-se o cultivo de plantas antagonistas, além do milho, adoção de culturas de cobertura e rotação, e as demais já citadas, fazendo dessa forma uma integração entre todas elas.
Da pesquisa para a prática
O ensaio da Fundação MT na Serra da Petrovina é acompanhado de perto pelas empresas sementeiras da região. Os resultados são apresentados in loco para que os técnicos responsáveis possam avaliar as plantas e os resultados. “Estiveram conosco em junho e todos gostaram muito. Vão na área, avaliam os resultados, dão nota para as parcelas. A ideia é ter a pesquisa em pequena escala, eles avaliam e depois replicam para as áreas deles”, conta Rosangela.
A coordenadora do Grupo Bom Jesus destaca que alguns conceitos da pesquisa já são aplicados e estão oferecendo resultados satisfatórios nas áreas de algodão da empresa. “Participamos das avaliações, observamos o que tem de destaque nas pesquisas e implantamos, adaptamos. Estamos fazendo biológicos em sulco e eventualmente um químico, assim como o protocolo da Fundação MT. As empresas de pesquisa trazem muita coisa que não conseguimos desenvolver sozinhos ao longo da safra, são testes em várias regiões, várias safras, tem toda essa variabilidade”, destaca.
A profissional também comenta sobre a necessidade de material genético que contribua no manejo do nematoide. “Cobramos das detentoras o desenvolvimento de cultivares de soja com baixo fator de reprodução do nematoide, visto que são poucas as opções em mercado hoje que proporcionam ciclo para algodão safrinha”, pontua Daiane.
Editado por: Viviane Petroli, de Rondonópolis (MT)
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