Série Especial - produtores de Cristalina (GO) têm dificuldades para manter produtividade

Um dos principais entraves da região é o alto custo da energia elétricaO centro oeste brasileiro foi aberto para o desenvolvimento do agronegócio em 1972 na cidade de Cristalina, no Estado de Goiás. Atualmente a região fomenta 15 industrias de produtos alimentícios. Um exemplo de complexo agroindustrial é a Goiás Verde, maior produtora individual de tomate da América Latina, que produz mais de 200 mil toneladas e representa 10% da produçao nacional. Boa parte desta produção é transformada em extrato.

No campo, também são colhidos mais milho doce do que a Argentina. Além do ciclo industrial, os resíduos das lavouras alimentam a pecuária – um confinamento coberto que engorda 30 mil animais por ano. Tudo é interligado. Mais de 30 produtos são enlatados e vão para o supermercado: tomate, milho verde, goiaba, feijao e ervilha. O segredo do sucesso está na irrigação com sustentabilidade.

? A irrigaçao permite que se tenha um prolongamento do período de plantio e de colheita durante o ano e, por consequência, o processamento também se estende. Isso possibilita a geração de emprego de boa qualidade durante todo ano e viabiliza a indústria se sustentar ao longo de um ano completo ? explica o produtor rural Carmo Spies.

A água é a garantia econômica e sustenta a agricultura e a pecuária na região. O que atrapalha é o alto custo de energia elétrica e a disputa com as usinas hidrolelétricas que, segundo o presidente do Sindicato de Cristalina, Vitor Simão, estão de olho nos recursos hídricos do município.

? Temos 98% do Brasil com aptidão para produção de energia. Poderia se deixar esta região aqui para sua vocação produção de alimentos. Cristalina hoje produz dois milhões de toneladas de alimentos. São poucos os municipios do pais que conseguem tamanha representatividade em produção. Temos quase um milhao de toneladas de cereais e um milhão de toneladas de hortifruti.

Um dilema, já que falta eletricidade para ampliar a área irrigada. Um entrave que impede o desenvolvimento da agricultura irrigada no país. Ao contrário das indústrias urbanas, o produtor rural tem que arcar com os custos de distribuição para chegar até a propriedade.

? Hoje, para obter energia elétrica, nós teríamos que fazer os investimentos de transmissão. E ainda assim, não temos a segurança do fornecimento. Não há neste momento nenhuma promessa e nenhum sinal de que a demanda por energia elétrica venha a ser atendida num prazo determinado. Se fosse uma indústria no meio urbano, mesmo com uma eficiência de geração de empregos menor, esta indústria seria atendida muito mais rapidamente ? argumenta o produtor rural Verni Wehrmann.

? Trazer esta energia para dentro da fazenda passou a ser uma responsabilidade nossa nos últimos 15 anos. Para instalar qualquer transformador aqui para fazer uma irrigação, é preciso fazer um melhoramento da subestação, até dentro da fazenda, e arcar com estes custos. Se você não quiser arcar, não terá a energia disponível ? comenta o também produtor rural Diogo Tudela.

Duas frentes formam a base dos problemas enfrentados pelos produtores: energia elétrica e armazenamento de água. O mais grave foi descobrir que tem dinheiro pra garantir o abastecimento de água para irrigação e que nunca foi usado.

Os produtores da região de Cristalina formaram uma comissão de irrigantes quando descobriram a existência de dinheiro do governo a fundo perdido para construção de pequenas barragens desde 1988. De lá para cá deixaram de ser investidos mais de R$ 1,5 bilhão por falta de divulgação do programa criado para apoiar a irrigação.

? Isso representou um atraso maior que o dobro da área irrigada que está agora. Poderíamos já estar com outras culturas, atração de investimento na área de indústria. No caso do trigo, poderíamos já estar produzindo para sustentar o consumo de Goiás. Isso é um atraso para o produtor que não conseguiu este investimento e para o Estado de Goiás como um todo ? afirma o presidente da Comissão de Cereais da Federação de Agricultura e Pecuária de Goiás, Alécio Marostica.

O ex-ministro da Agricultura Alysson Paulinelli pede uma mudança de atitude da sociedade para que o Brasil se torne, de fato, a locomotiva agrícola do mundo. E a irrigação é a mola que vai impulsionar a produção no país.

? O Cerrado se tornará o grande centro produtor mundial no momento em que o país compreender que esta região tem que ser manejada em sua potência máxima. E potência máxima é você ter a terra, você ter a água, você ter a planta e o animal disponíveis para você ter neste manejo a sustentabilidade.