A corrida para o famoso Prêmio Nobel da Paz de 2021 já começou e o Brasil escolheu um representante do agro para a edição: Alysson Paolinelli, 84 anos, um ex-ministro da Agricultura, com formação em Engenharia Agronômica e que dedicou a vida toda à procura de soluções para a produção de alimentos.
A indicação, encabeçada pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade de São Paulo, conta com o apoio de dezenas de universidades e institutos de pesquisa do Brasil. Em entrevista ao Canal Rural, Paolinelli explicou que a indicação não é por um projeto específico, e sim por uma vida inteira de trabalho.
“O último Prêmio Nobel dado a um membro da área de alimentação foi em 1950 e alguns líderes do setores de pesquisa, da ciência e tecnologia achavam que estava na hora [de a área ser novamente contemplada]. Eu sei que é uma tarefa muito difícil, mas sinto-me muito honrado de defender essa bandeira da segurança alimentar aliada à sustentabilidade”, disse.
Mineiro de Bambuí, Paolinelli nasceu em 1936, tornou-se agrônomo em 1959 pela Escola Superior de Agronomia de Lavras (Esal), que depois tornou-se Universidade Federal. Em 1971, assumiu a Secretaria de Agricultura de Minas Gerais, a convite do governador Rondon Pacheco e criou incentivos e inovações tecnológicas que transformaram o estado no maior produtor de café do Brasil. Nessa época, o jovem Paolinelli já demonstrava talento para revolucionar setores inteiros.
Em 1974, aceitou convite do presidente Ernesto Geisel para tornar-se ministro da Agricultura, e tratou de modernizar a Embrapa e promover a ocupação econômica do Cerrado brasileiro. Foi nesse período que implantou um ousado programa de bolsas de estudos para estudantes brasileiros nos maiores centros de pesquisa em agricultura do mundo. Cuidou também da reestruturação do crédito agrícola e do um novo equacionamento da ocupação do bioma amazônico.
“Nessa época, o Brasil tentava crescer, mas ainda era dependente da importação de alimentos. O nosso forte era o café, mas uma crise climática no Hemisfério Norte fez com que o preço dos alimentos dobrasse. Foi quando sob a minha gestão passamos a investir fortemente em ciência e tecnologia para tornar o Brasil autossuficiente em alimentação. Mas esse era um desafio muito grande, pois até então não existia agricultura tropical competitiva no planeta”, explica.
Foi com a iniciativa de Paolinelli que o Brasil se tornou uma potência alimentar para todo o planeta. “A Embrapa foi reestruturada, mandamos 1.530 jovens brasileiros para os melhores centros do mundo. Demos à Embrapa uma forma muito racional para atingir biomas diferentes, produtos diferentes e regiões diferentes. Isso foi muito importante”, conta.
Desenvolvimento de biomas
Nos anos 1970, o Brasil começou a produzir alimentos em um bioma considerado degradado e infértil, o Cerrado. “Conseguimos ativar o programa de médio e longo prazo, e fomos felizes pois em muito pouco tempo o Brasil mostrou que seria viável esse esforço. Em cinco anos conseguimos empatar a balança. Nos anos 1980 começamos a exportar e mostrar competitividade. Nosso país mostrou a força da agricultura tropical, permanecendo 12 meses no ano [com plantios no campo]. O mundo começou a ver que havia uma tecnologia tropical muito mais sustentável do que a deles, que desenvolveu não só a agricultura como também a pecuária”.
Segundo o ex-ministro, foram anos de pesquisa para entender como implantar o cultivo no solo da região Centro-Oeste e, desde aquela época, países que não conheciam o Brasil já criticavam a suposta exploração dos recursos nativos. “No Cerrado funciona assim: no primeiro ano corrigimos quimicamente; no segundo é fisicamente, com aração diferenciada para conseguir mudar as características do solo, deixando mais permeável; e depois leva mais cinco anos para recuperar biologicamente. Conseguimos em pouco tempo, fazer em três anos, e o mundo se assustou. Acham que estamos derrubando a floresta para produzir e não é nada disso”, continuou.
Ciência acima de tudo
Em 2006, Alysson Paolinelli foi agraciado com o World Food Prize, prêmio que equivale ao Nobel da Alimentação. O feito foi alcançado graças ao trabalho do ex-ministro ao lado do pesquisador Edson Lobato, da Embrapa, em ajudar a melhorar a qualidade, aumentar a quantidade e disponibilidade de alimentos no mundo. Eles foram apontados como os responsáveis pela transformação da estéril região do Cerrado brasileiro num dos mais produtivos celeiros do mundo.
A indicação atual ao Nobel de Paolinelli é feita com base na sua dedicação ao conhecimento científico e desenvolvimento da agricultura tropical. São décadas dedicadas à inovação e, mesmo aos 84 anos, o ex-ministro ainda pensa em como melhorar o processo de produção de alimentos sem agredir o meio ambiente.
“Eu sempre acreditei na ciência como a solução brasileira. Ela pode errar, mas ela mesmo conserta. Criamos o Fórum do Futuro, criamos o Projeto dos Biomas Brasileiros, mas temos uma convicção de que estamos em uma transição fundamental do químico para o biológico. Hoje somos dependentes da agricultura química e fico muito nervoso porque o Brasil poderia estar muito à frente dos demais países, mas para isso é preciso destinar recursos para a pesquisa, para a Embrapa, para que ocorra uma nova revolução no processo produtivo mundial”, disse Paolinelli, que confessa sonhar com o dia em que o mundo todo consuma alimentos tão orgânicos “como os que foram consumidos por Adão e Eva”. Para isso, a aposta em compostos biológicos seria a melhor saída, na avaliação dele.
Próximos passos
Agora, toda a documentação enviada sobre o brasileiro será avaliada pelo conselho da premiação em Oslo, na Noruega. Até novembro, novos dados podem ser complementados à candidatura. “Estou tentando apoio das academias de ciência e de fora do Brasil”, disse.
O sonho está vivo na mente do ex-ministro. No entanto, ele pondera que o momento político vivido no Brasil atualmente possa ser um complicador nessa candidatura. “A posição política do Brasil hoje não é tão favorável ao Prêmio Nobel, mas só a aceitação da agricultura brasileira é uma vitória. A agricultura brasileira vai salvar o mundo”, concluiu.