Cerca de 65 milhões de hectares da Amazônia são terras sem destinação, que pertencem à União. É justamente lá que o desmatamento cresce com mais rapidez. No ano passado, essas áreas concentraram 23% dos alertas, segundo dados do Instituto de Pesquisa da Amazônia (Ipam). Em 2019, o número já chegou a 31% até agosto.
Os maiores responsáveis pelo desmate não são produtores nem indígenas, mas grileiros, afirma o diretor do Ipam, André Guimarães. Pessoas que ocupam, exploram e até comercializam terrenos sem permissão. “Isso não ajuda a nossa economia ou a nossa reputação. É algo que deve ser alvo de combate de todos nós brasileiros”, diz.
Ele lembra, também, que de acordo com o Código Florestal, produtores com propriedades no bioma amazônico podem desmatar até 20% da área. “O que a gente tem que fazer agora é executar a legislação, para colocar luz em quem está na ilegalidade e criar instrumentos para estimular quem está na legalidade”, afirma.
Para chamar atenção do governo, entidades ambientais e do agronegócio lançaram a campanha “Seja Legal com a Amazônia”, que deve durar três anos. A ideia é pressionar o Ministério da Justiça e outros órgãos do Judiciário para coibir a grilagem de terra na Amazônia. Qualquer pessoa pode acessar o site da campanha e enviar mensagens para autoridades como o ministro Sergio Moro e a atual procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
O presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Marcello Brito, diz que a campanha também ajuda a reconstruir a imagem do Brasil no exterior. “O agronegócio precisa assumir esse discurso e mostrar ao mundo que produzimos do jeito honesto. Quem faz de forma ilegal é bandido, e aí é caso de Justiça, não do Ministério da Agricultura”, afirma.
Ricardo Negrini, procurador do Ministério Público Federal, afirma que a grilagem é um crime muito maior do que parece. Só no Pará, as fraudes são tantas que a área registrada em cartório é três vezes maior que o estado. Ou seja, a mesma terra é registrada por várias pessoas diferentes.
O Ipam mostra, ainda, que o desmatamento vem crescendo desde 2012 e que isso pouco tem a ver com as condições climáticas. A menor fiscalização e a dificuldade em criminalizar grileiros de terra agravaram a situação. “Dependemos muito da Polícia, Ibama e ICMbio; quando esses órgãos enfrentam dificuldades econômicas ou restrições na quantidade de fiscais, fica muito difícil. Até conseguimos investir algumas organizações criminosas, mas ficamos aquém do necessário”, diz Negrini.
André Guimarães destaca que o governo de Jair Bolsonaro sentiu o golpe e reagiu. “Ele tomou medidas importantes, organizou o gabinete de crise e promoveu a alocação de recursos. Nossa esperança é que com essas ações consigamos coibir o desmatamento ilegal, que ainda deve continuar nos próximos meses”, diz. Ele salienta que a participação do poder público é fundamental, mas precisa ser continua.
Para o presidente da Abag, embargos por parte de governos não devem acontecer, mas o consumidor pode deixar de comprar por achar que o produto brasileiro não é produzido de maneira correta. “A mensagem que estamos passando no momento não é boa. Talvez esta seja a pior crise de imagem da história do país, e vai levar alguns anos para corrigirmos o rumo. O importante é enxergar que existe um erro e corrigi-lo”, finaliza.