De acordo com a ONU, em 2030, a população mundial deve chegar aos 8,3 bilhões de pessoas, 20% maior do que é hoje. Cerca de 60% desse universo estará nas áreas urbanas (hoje, 50%). Esse movimento e, principalmente, o aumento de renda nos países emergentes resultarão em uma mudança dos padrões alimentares. De acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), a tendência é que o consumo de grãos seja reduzido enquanto crescerá a demanda por vegetais, frutas, leite, carnes e proteínas em geral.
O aumento no consumo de carnes é um dos mais relevantes e é resultado direto do aumento da renda per capita. É possível até estabelecer uma clara relação entre renda por habitante (PIB per capita) e consumo das três principais carnes (suína, frango e bovina). O aumento do consumo traz impacto também na forma de produção de carnes, que agora é mais tecnificada. A alimentação dos animais passou a utilizar farelo de soja, substituindo os restos de produtos ou alimentos que seriam descartados. Esse é o caso especialmente da China, que aumentou significativamente a importação de soja, particularmente do Brasil.
Além da evolução nos padrões alimentares, observa-se também a mudança nos padrões energéticos. A preocupação com o meio ambiente e a adoção em maior quantidade de energia de fontes renováveis resultou no crescimento do mercado de bioenergia. É esperado que a demanda por produtos agrícolas para produção de biocombustível continue a crescer nas próximas décadas, mantendo a pressão nos preços dos produtos agrícolas. Os preços internacionais da história recente colocavam a soja em uma média de US$ 6,50 por bushel. Atualmente, o valor é de US$ 12,5 a US$13 por bushel.
A pressão para que a oferta mundial atenda à demanda pelo produto permitiu ao país, até agora, expandir substancialmente sua produção e sua participação no mercado internacional. Hoje, o Brasil é o 2° principal produtor do grão e seu maior exportador, respondendo por 29% da oferta mundial. Além disso, a produção de complexo de soja em óleo e farelo, além de atender à demanda interna, faz do País o 2° maior vendedor mundial.
A vantagem natural do Brasil combinada com a alta tecnologia empregada nas lavouras de soja permitem avanços expressivos na produção do grão e o desenvolvimento e consolidação dos segmentos de aves e suínos. A geração de divisas com o complexo soja foi da ordem de US$ 24 bilhões em 2011, o que equivale a 26% do valor da exportação brasileira agrícola. Somando os valores de aves e suínos, a representatividade vai aos 34%. Vale lembrar que graças à balança agrícola o País possui hoje saldo comercial. Essa condição é praticamente única no mundo. Em termos de renda agrícola gerada pelos principais produtos produzidos no país, somente a soja responde por 35% da renda estimada em R$ 152 bilhões para o ano de 2011.
Pela relevância econômica e estratégica dessa cultura, perdas de safra tornam-se cada vez mais importantes no cenário mundial. A exemplo do que ocorreu em 2011, quando a safra no Hemisfério Sul foi afetada pelas secas causadas pelo La Niña, o preço internacional da soja reage hoje imediatamente às novas informações sobre queda na produção. A ferrugem asiática, presente no País desde 2001, também é um bom exemplo para ilustrar o caso. Estima-se que, no Brasil, cerca de 15 milhões de toneladas de soja já foram perdidas em função do fungo. No ano de maior incidência da doença, 2004, as perdas chegaram a 4,6 milhões de toneladas. Esse ano também foi um dos maiores com gastos no controle, segundo a Embrapa.
É conhecido o efeito que o uso de fungicidas nas lavouras brasileiras de soja ao longo dos anos trouxe na redução gradual da perda de grãos em decorrência da doença. E é evidente a importância de se combater qualquer tipo de perda. Nesse sentido, é fundamental que novos produtos e tecnologias capazes de reduzir prejuízos, como novas sementes e defensivos agrícolas, estejam disponíveis e acessíveis aos produtores brasileiros.
Num cenário de perdas elevadas na produtividade na soja, que podem acontecer devido a fatores climáticos ou doenças, simulamos o impacto que a renda agrícola sofreria em 2011 no caso de uma redução de até 50% na produção. A renda da soja passaria dos quase R$ 90 bilhões para R$ 45 bilhões, a receita total da agricultura iria de R$152 bi para R$ 107 bilhões.
Pior que isso seria o impacto nos preços mundiais do grão e seus efeitos na economia mundial. A pressão nos preços chegaria ao consumidor final, retirando o poder de compra de alimento de uma parcela da população mundial. A FAO estima que, em 2010, 925 milhões de pessoas passaram fome. Em um choque de oferta, essa situação seria agravada.
Contamos com a tecnologia para ajudar os produtores a atenderem o chamado do mundo. E esta deve estar disponível para ser utilizada na hora em que for preciso. O mundo não comporta mais perdas banais.
* Alexandre Lahóz Mendonça de Barros, consultor de agronegócios da MB Associados, professor de Economia Agrícola da Fundação Getúlio Vargas, membro do Conselho de Administração da Fosfértil, CASP e Vale Fertilizantes, membro do Comitê de Assessoria Externa da EMBRAPA Pecuária Sudeste, membro do Conselho Superior do Agronegócio da FIESP.
* Ana Laura Menegatti, consultora de agronegócios da MB Associados