Depois da estiagem que derrubou a produção de café robusta (conilon) nos últimos anos no Espírito Santo, principal produtor nacional desse tipo de grão, representantes do setor no estado ligaram novamente o sinal de alerta. Isso ocorre porque a chuva ainda não veio com a intensidade necessária para recuperar o solo e os reservatórios de água. Dessa forma, a florada da safra que será colhida em 2018, que está em bom estado de desenvolvimento, pode não vingar com todo o seu potencial na região. No ano passado, a queda brusca na oferta de conilon no estado por causa da seca levou os preços internacionais do grão a registrarem forte alta.
O presidente da Cooperativa Agrária dos Cafeicultores de São Gabriel (Cooabriel), Antonio Joaquim de Souza Neto, destacou que a intensidade das chuvas melhorou, se comparado com o ano passado, mas ainda está aquém do necessário. “O pé de café está desidratado para aguentar a florada como deveria. Você vê a florada bonita e parece que está tudo bem. Eu vejo com muito receio a safra do ano que vem. A colheita que a gente esperava, que o agricultor precisa, pode não chegar”, disse.
Por causa da estiagem, a produção de café conilon tem caído no estado desde 2014, ano que atingiu o pico de 9,95 milhões de sacas de 60 kg. Em 2015, a colheita desceu para 7,76 milhões de sacas e, no ano passado, despencou para 5,04 milhões, de acordo com dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Como uma forma de proteger a agricultura local, o Espírito Santo modificou, em 2014, a regulamentação para construção de barragens. A nova legislação transferiu os procedimentos de licenciamento do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) para o Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo (Idaf). A medida, segundo Souza Neto, ajudou muito o produtor que queria construir barragens e se via amarrado na burocracia do Iema. Desde a liberação, entretanto, a intensidade de chuvas diminuiu. “Acredito que temos três vezes mais barragens hoje, mas não tem chuva para abastecê-las.”
O cenário ganhou um agravante após o Espírito Santo proibir, no dia 11 deste mês, a irrigação das lavouras entre às 5h e 18h, na medida em que crescem as preocupações quanto aos baixos níveis dos reservatórios. Não foi divulgado um prazo para o fim da resolução. A notícia preocupou os produtores no noroeste capixaba, já que mais de 70% do café na região é irrigado, de acordo com números do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper).
O gerente de Produção Vegetal da Secretaria de Agricultura do Espírito Santo (Seag), Marcus Magalhães, disse que a chuva até veio, mas ficou mais concentrada na região litorânea e o solo ainda não se recuperou totalmente. “Como temos produção de café em todos os 78 municípios do estado, a chuva precisa ser uniforme para favorecer a safra. Por isso, muitas vezes a gente vê uma lavoura verde, mas é o que chamamos de seca verde, já que o solo ainda não dá margem para uma produção tão volumosa”, explicou.
Magalhães disse que a florada está boa para o conilon em regiões como Linhares, Jaguaré e Rio Bananal, mas ele destacou que a abertura da flor não é um indicativo de grande safra. “Para virar fruto, ela precisa de uma sequência de condições favoráveis, como chuva”. Apesar disso, o gerente da Seag declarou que sua estimativa é otimista para a produção do conilon e que sustenta isso com as previsões climáticas mais favoráveis para os próximos meses. De acordo com a Conab, a safra deve avançar para 5,91 milhões de sacas em 2017, ainda abaixo do pico, mas um avanço frente aos 5,04 milhões colhidas em 2016.
Chuvas em outubro
Segundo a meteorologia, o cenário começa a mudar no Estado a partir de outubro, mês em que as chuvas devem começar a chegar com maior intensidade. Dados da Somar Meteorologia apontam que em São Gabriel da Palha, importante região produtora, a intensidade deve alcançar 50 mm, bastante acima dos 10 mm registrados até agora em setembro.
“Ainda não é o ideal, já que a média histórica para outubro na região é de 130 mm. O clima, entretanto, deve alternar entre chuva e seca. Já novembro que é a promessa de ser um mês de chuva”, disse o meteorologista Celso Oliveira, da Somar Meteorologia.
No geral, Oliveira disse que o clima em 2017 está até colaborando para a produção, mesmo diante dos baixos níveis de chuva. “A explicação é que as chuvas neste ano foram mais distribuídas durante os meses. Tivemos um inverno mais úmido e isso colaborou para que o solo não fosse tão castigado”. No acumulado do ano até agora, São Gabriel da Palha recebeu 357 mm (média do período é 750 mm). “Ano passado, choveu 400 milímetros. Parece bom, mas a distribuição foi ruim. Metade disso ficou em janeiro. De fevereiro a setembro, no ano passado, choveu 200 milímetros (a média é 550 mm). Neste ano já choveu 350 mm. Isso explica o clima melhor, mas ainda está bem aquém das médias para a região”.
O especialista explicou que as dificuldades climáticas nos últimos anos no Espírito Santo não são fáceis de explicar e que, de acordo com alguns estudos, estão ligados a ciclos de longo prazo. “O que a gente tem percebido é que na região tropical do Brasil tem chovido menos nos últimos anos. As frentes frias, que costumavam vir para o Sudeste e provocavam chuvarada no verão, estão ficando mais tempo paradas na Argentina, Uruguai e no Rio Grande do Sul o que, por sinal, explica o clima bastante favorável à agricultura naquele estado. Eles estão recebendo a chuva que deveria vir para cá. A explicação para esse fenômeno, entretanto, engloba diversas hipóteses. Uma delas é de que existe um ciclo de longo prazo. Se olharmos para as décadas de 40 e 70, dada às devidas proporções, o Brasil passou por uma fase muito parecida”, argumentou.
Safra brasileira
Apesar da aparente incerteza sobre a produção capixaba, o gerente da Seag salientou que a colheita de conilon no Brasil na próxima safra vai ser melhor. “Quem vai sustentar isso é a região sul da Bahia e Rondônia, que estão aumentando a área plantada. No Espírito Santo vai ser bom também se comparado ao ano passado, mas não é possível dizer quão melhor, pois dependemos de chuva”, declarou Magalhães.
Para o arábica, entretanto, o cenário é diferente, conforme Magalhães. As regiões capixabas que cultivam a variedade estão passando por um grave período de seca. Cerca de 30% da produção de café no estado é de arábica. “O cenário difícil também se repete em Minas Gerais. Algumas regiões estão sem chuva há 120 dias. Temos previsão de chuva em breve, mas não deve ter força suficiente para levar a próxima safra para um recorde como alguns apontam”, concluiu.