SUSTENTABILIDADE

Cana: estudo indica que canaviais contaminam menos do que se pensava

Perdas reais de nitrato nas culturas de cana-de-açúcar são de aproximadamente 5% menor que o estimado

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Foto: Paulo Lanzetta/Embrapa

Uma pesquisa guiada por instituições brasileiras e americanas mostrou que o potencial de poluição da cultura da cana-de-açúcar no Brasil é substancialmente menor ao previamente estimado. Os pesquisadores mediram a presença de três moléculas específicas: uma de nitrato e duas de herbicidas conhecidos (diuron e hexazinone).

Até então o consenso científico, sobretudo nas cidades de Jaú e Sales de Oliveira em São Paulo, região com grande atividade agrícola, era de que 10% do nitrato e 1% dos herbicidas seriam perdidos após sua aplicação. 

Entretanto, os testes conduzidos na investigação revelaram que as perdas reais de nitrato são de, aproximadamente, 5%. A descoberta evidencia que as estimativas convencionais para o nitrato eram em quase o dobro da realidade.

Esse resultado não apenas questiona as diretrizes existentes, mas também pode ter implicações significativas para práticas agrícolas mais sustentáveis e eficientes, podendo contribuir desde políticas públicas até estratégias individuais de manejo de solo e uso de insumos. A avaliação ainda contribuiu para determinar o quanto desses insumos se perderam após a aplicação, ao quantificar o volume não retido pelo sistema agrícola.

O cientista Fábio Scarpare da Washington State University (WSU) explica que a pesquisa utilizou um conhecido indicador ambiental, a pegada hídrica cinza. 

Segundo ele, esse parâmetro é bastante empregado em estudos da área, pois auxilia na quantificação do potencial de contaminação por poluentes e resulta em dados mais precisos sobre o impacto ambiental. “Uma das principais comprovações do estudo foi, justamente, que a pegada hídrica cinza é menor do que se pensava”, diz Scarpare.

Pegada hídrica cinza

O conceito de pegada hídrica cinza é muito utilizado na pesquisa moderna. Ela representa a água necessária para se diluir poluentes a níveis aceitáveis. No Brasil, essa pesquisa é particularmente relevante, já que o País é o maior produtor mundial de cana-de-açúcar.

No entanto, os cientistas ressaltam que não há dados suficientes que permitam realizar um comparativo do uso de defensivos químicos como inseticidas, fungicidas e acaricidas, empregados na cultura da cana-de-açúcar no Brasil. 

Também não é possível comparar com outras importantes culturas, como citros, milho, café e soja, de forma segura. Contudo, na cana-de-açúcar, as principais pragas – como a broca, que é a mais significativa, e a cigarrinha – são geralmente controladas por meio de métodos biológicos. Além disso, as doenças da cultura costumam ser combatidas com o melhoramento de plantas.

Os técnicos salientam que é importante notar que os herbicidas constituem o grupo de defensivos mais amplamente utilizado nesta cultura. Entre os herbicidas mais usados, o diuron e o hexazinone se destacam, por isso, mereceram a atenção dos cientistas.

O pesquisador da Embrapa Meio Ambiente (SP) Robson Barizon explica que no estudo o conceito de pegada hídrica foi utilizado de maneira comparativa. 

O objetivo foi confrontar o impacto hídrico de um local específico sob diferentes condições de manejo. Assim, foram comparadas tanto as aplicações de fontes orgânicas com inorgânicas, quanto diferentes métodos de manejo, levando em conta variações nas formas de aplicação.

Segundo o estudo, os herbicidas diuron e hexazinone apresentaram perdas médias de 0,73% e 3,07%, respectivamente. Scarpare destaca a complexidade de se medir tais perdas, salientando que o processo requer o uso de equipamentos avançados e de metodologias rigorosas.

Frente a essas dificuldades, muitos profissionais e pesquisadores optam por utilizar “frações empíricas”, um tipo de estimativa padrão de perdas previamente definida no Manual da Pegada Hídrica. O pesquisador alerta, no entanto, que apesar de serem convenientes, essas estimativas podem não ser totalmente precisas.

A necessidade de precisão é um fator crítico aqui. As “frações empíricas” podem servir como um atalho prático, mas também podem mascarar a real extensão das perdas, potencialmente subestimando o impacto ambiental desses herbicidas. 

“Portanto, esse estudo evidencia a importância de se investir em métodos de medição mais precisos para uma avaliação ambiental mais acurada”, defende o pesquisador.

A importância da precisão em estudos ambientais

Barizon ressalta que as descobertas a respeito dos herbicidas diuron e hexazinone nessa pesquisa são específicas e não devem ser generalizadas para outras substâncias químicas. Cada substância, de acordo com ele, tem suas próprias complexidades que demandam análises próprias e detalhadas.

Segundo ele, o estudo serve como um lembrete crítico sobre a necessidade de rigor e precisão em investigações ambientais. A superestimação de índices como o de escoamento pode levar a conclusões errôneas, o que, por sua vez, pode resultar em consequências significativas quando se trata de políticas públicas e práticas sustentáveis.

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