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Cientistas apontam soluções sustentáveis para desafios agrícolas

Saiba detalhes da pesquisa ganhadora desta edição deste ano do Prêmio Fundação Bunge na categoria JuventudeAnte o aumento da demanda da população por alimentos, o conhecimento sobre o vasto e ainda pouco explorado universo dos microrganismos que habitam o solo e as plantas pode ajudar a incrementar a produção agrícola de forma sustentável. É o que afirma Fernando Dini Andreote, pesquisador da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP) e ganhador da edição deste ano do Prêmio Fundação Bunge na categoria Juventude.

Andreote participou nesta semana do Seminário Produtividade Agrícola Sustentável, realizado em parceria com a Fundação Bunge com o objetivo de envolver pesquisadores do setor em discussões sobre o tema. Para ele, o microbioma do solo e das plantas pode guardar importantes respostas para os desafios do setor agrícola.

– No solo e nas plantas há a maior fonte de biodiversidade genética e metabólica do planeta: cerca de 1 bilhão de células vivas para cada grama de solo; são 30 mil espécies diferentes. A capacidade metabólica desses organismos precisa ser investigada para entendermos cada vez mais sobre como utilizá-la em benefício da produção sustentável – disse ele à Agência Fapesp.

Andreote esteve à frente da pesquisa Diversidade microbiana em solos com cultivo de cana-de-açúcar no estado de São Paulo: um enfoque biogeográfico, apoiada pela Fapesp, que identificou grupos de microrganismos e os correlacionou a fatores como o tipo de manejo da cultura, a natureza do solo e aspectos climáticos, como umidade e temperatura.

O trabalho constatou que há importantes diferenciações entre grupos de microrganismos em áreas distintas, ainda que com cultivos semelhantes.

– São diferenciações importantes, mais expressivas em fungos do que em bactérias, e nosso trabalho é entender se esses grupos, ainda que diferentes, têm as mesmas funcionalidades – disse.

A indução do crescimento de determinados microrganismos possibilitada pelo conhecimento sobre a microbiologia do solo pode facilitar a nutrição e o crescimento das plantas com recursos naturais da área, uma solução sustentável.

Andreote destacou no seminário que é preciso considerar também a ação integrada desses organismos.

– É necessário buscar conhecer funções do conjunto deles, não só de forma isolada, enxergar o grupo microbiano como um tecido que interage com o hospedeiro e encontrar funções que, quando se olha para cada componente, não são identificadas.

Nesse sentido, Andreote estuda também consórcios microbianos envolvidos na degradação do material presente nos resíduos biológicos agrícolas, especificamente restos da cultura de cana-de-açúcar e de milho.

Na pesquisa Microbial consortia for biowaste management: life cycle analysis of novel strategies of bioconversion (Microwaste), realizada por Andreote em parceria com pesquisadores da Netherlands Organisation for Scientific Research (NWO), a proposta é identificar os efeitos da incorporação dos resíduos agrícolas nos processos biogeoquímicos do solo.

– Buscamos entender como funciona a incorporação de resíduos de cana e milho no solo não pela ação de um organismo em específico, mas pela atividade conjunta da microbiota. A ideia é identificar grupos que têm atividades em conjunto e, por essa atuação complementar, aceleram o processo de incorporação – explicou.

Biodiversidade

De acordo com Andreote, a diversidade de microrganismos envolvidos nos processos metabólicos das plantas está relacionada à biodiversidade do ambiente em que a vegetação está inserida, o que evidencia ainda mais a importância que se deve ter com a sua preservação.

– A planta seleciona os microrganismos que vão se associar a ela. Se a biodiversidade do ambiente é alta, a seleção é mais eficiente. Se essa diversidade é reduzida, aumentam as chances de colonização por organismos oportunistas, os patógenos, o que explica a maior ocorrência de doenças em raízes em áreas de monocultura, pois a biodiversidade é restrita – disse.

Por isso, acredita o pesquisador, é preciso encontrar alternativas à tendência corrente de homogeneização dos sistemas.

– Se você troca uma área de vegetação nativa pelo cultivo de cana-de-açúcar, está homogeneizando o ambiente, ainda que não seja essa a sua intenção, e o levando a uma restrição, por meio de seleção natural, da biodiversidade que coloniza aquele ambiente – explicou, citando a rotação da cultura e o plantio direto como alternativas para manter a biodiversidade microbiana ativa no solo.

Para Hiroshi Noda, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) contemplado pelo Prêmio Fundação Bunge na categoria Vida e Obra, algumas lições podem vir dos procedimentos agroecológicos adotados pelos agricultores tradicionais no manejo das plantas.

– O desafio é aumentar os níveis de sustentabilidade agrícola face ao processo gradual de deterioração ambiental e desacelerar e estancar o processo de perda da agrobiodiversidade – disse no seminário.

Em parceria com a Universidade Federal do Amazonas (Ufam), o Inpa utiliza estratégias de melhoramento genético e conservação in situ – que preserva a variabilidade genética das plantas cultivadas nas propriedades agrícolas em que são manejadas – de espécies hortícolas como abóbora, cubiu, ariá, feijão-macuco e feijão-de-asa na região amazônica.

Todas as ações de pesquisas levam em conta as práticas tradicionais locais, como o rodízio de áreas em produção e em pousio – a interrupção da cultura para um período de descanso. Na capoeira, área destinada a esse descanso, são introduzidas espécies selvagens em associação com o arranjo espacial das plantas.

– Essas estratégias tradicionais têm garantido a autossuficiência alimentar, a sustentabilidade no processo produtivo e a manutenção dos valores culturais dessas populações humanas – disse Noda.

O cientista destacou ainda características das formas de produção tradicionais que favorecem a conservação in situ.

– Nas áreas comunitárias onde ocorre o processo de conservação ou onde as espécies conservadas são compartilhadas pelas comunidades, com manejo e colheita comunitárias, há elevado nível de variabilidade genética mantida nos cultivos.

Os propágulos – sementes e mudas – compartilhados são incorporados e mantidos pelos agricultores.

– Esse compartilhamento dos recursos da agrobiodiversidade, por meio de uma rede sociocultural, reforça os mecanismos de manutenção da variabilidade genética e garante a segurança alimentar nas comunidades – explicou.

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