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Agricultura

Crédito rural: 'Recuperação judicial para produtor pode gerar colapso'

A ministra Tereza Cristina está preocupada com reflexos negativos da proposta no mercado e nas novas políticas do governo para conseguir recursos

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Foto: Ministério da Agricultura

A Comissão de Agricultura (CRA) do Senado debate o projeto de lei, de autoria do senador Jayme Campos (DEM-MT), que estende a produtores rurais os benefícios da lei de recuperação judicial. O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove), André Nassar, participou de audiência pública sobre o tema e contou que a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, está preocupada com a medida.

Segundo Nassar, ela teria dito, durante café-da-manhã na Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), que a proposta pode impactar fortemente o mercado de crédito e as novas políticas priorizadas pelo governo.

“Hoje o produtor pessoa física tem tratamentos tributários e previdenciários diferenciados, que não se aplicam às pessoas jurídicas. O acesso dos produtores pessoas físicas aos mecanismos de recuperação judicial previstos na Lei 11.101 vai colapsar o sistema de fomento e financiamento da produção. Na pessoa física, o patrimônio da atividade e o pessoal não se separam. O financiamento sempre funcionou muito bem desta forma, e cada financiador se entende com o produtor”, disse Nassar.

Para o presidente da Abiove, esse lei não foi pensada para o setor agrícola. Hoje, apenas 2% dos produtores são pessoas jurídicas, por, entre outras razões, falta de estrutura administrativa da maioria.

Nassar acredita que mesmo a pequena parcela de pessoas jurídicas não se beneficiaria da Lei de Recuperação Judicial, devido às peculiaridades da área. Ele defende que o Congresso vote um estatuto específico para os produtores rurais, priorizando a segurança jurídica para toda a cadeia produtiva.

“Infelizmente tem havido casos de mudança de regra no meio do jogo. Tem produtores tomando o crédito como pessoa física e depois buscando a renegociação na jurídica, após pedir o registro. E muitas vezes isso ocorre no meio da safra. A safra é financiada, plantada e depois ele pede a recuperação judicial. Este oportunismo de poucos pode acabar se tornando um problema enorme para o país”, alertou.

Para Nassar, a facilitação desta prática gerará inevitavelmente aumento no custo do crédito. Isso será grave porque o atual modelo de financiamento está em transição para um sistema de juros livres, com recursos captados no mercado. No setor da soja, o financiamento privado já responde por 80% do crédito, com 41% deles em sistema de juros livres.

A possibilidade de sofrer um calote por meio da recuperação judicial aumentaria a avaliação de risco por parte de bancos e tradings, levando ao aumento das taxas de juros. “Hoje a maior fonte de financiamento do Plano Safra provém de recursos livres captados no mercado: são R$ 70 bilhões. É a primeira vez que isso ocorre. Mas se a CPR [cédula de produto rural] for objeto de recuperação judicial, desmonta a LCA [título do agronegócio]. Porque as LCAs são lastreadas em CPRs. Aí os bancos vão parar de emitir LCAs. Estejam alertas para a cadeia de financiamento que pode ser quebrada”, argumentou.

Nassar acrescentou que os títulos CRA [certificado de recebíveis do agronegócio] também podem se inviabilizar em caso de riscos judiciais, frustrando os esforços do governo tentando atrair capital externo para esta forma de financiamento.

Proteção para o investidor

O deputado Neri Geller (PP-MT), que foi ministro da Agricultura de 2013 a 2014, concordou com o ponto de vista de Nassar. “A verdade tem que ser dita, nosso meio é composto por 95% de pessoas de bem, mas 5% são oportunistas. Infelizmente, muitos se beneficiam da ferramenta da recuperação judicial para comprar mais terras e aumentar o capital. Produtores de grande porte que atrapalharam de forma violenta o crédito, principalmente no Centro-Oeste”, criticou.

Ele é a favor que uma legislação própria regule a recuperação judicial no meio rural, mas preservando as CPRs. O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Paulo Moura Ribeiro, defendeu que o parlamento vote um Estatuto do Empresário Rural “que enfrente as práticas oportunistas”.

Quem também defende um Estatuto específico “à prova de caloteiros” é Renato Buranello, advogado especialista em Direito do Agronegócio e professor do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa).

O consultor jurídico da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Rodrigo Kaufmann, também participou da audiência. A entidade avalia que a recuperação judicial é um direito da categoria, e entende que ela é plenamente garantida pela Constituição, pelo Código Civil (Lei 10.406, de 2002), por jurisprudências do STJ e pela Lei da Agricultura Familiar (Lei 11.326, de 2006). Mas finalizou garantindo que a CNA está aberta para colaborar na construção de um texto de consenso para o PLS 624/2015.

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