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Agronegócio

Dia do Agricultor: conheça a história de Josilene e Mizael, exemplos na produção sustentável

É dia de homenagear quem escolheu o campo como filosofia de vida e passou os ensinamentos da terra para os filhos e netos; essa família do Maranhão aproveita tudo o que a pequena propriedade tem para oferecer

O agronegócio é um orgulho nacional há muito tempo. É no campo que a economia brasileira consegue algum resultado positivo, mesmo na pior das crises, e é entre os produtores rurais que o país sempre deposita a esperança de dias melhores.

Muitos falam da capacidade do Brasil alimentar boa parte do planeta com suas exportações, mas o agro vai muito além dos grandes fazendeiros, afinal, quem coloca a comida na mesa do brasileiro muitas vezes é o pequeno agricultor. E é esse profissional, tão importante para a nossa sociedade, que vamos homenagear neste 28 de julho, Dia do Agricultor.

Para representar essa classe tão sofrida, trabalhadora e genuinamente brasileira, vamos conhecer a história da família do Mizael e da Josilene, que vivem no interior do Maranhão, em uma das regiões com os menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil. Mesmo assim, eles se tornaram exemplo na produção sustentável e diversificação em sua pequena propriedade, como mostra abaixo a história apresentada pela Embrapa.

História Misael e Josilene
Josilene Gonçalves Silva, Mizael Ramos Pereira (direita) e o filho André. Foto: Aline Nascimento

Josilene Gonçalves Silva, 45 anos, e  Mizael Ramos Pereira, 49, são casados há 24 anos e residem no povoado de Três Poços, uma comunidade de 44 famílias distante 12 km da sede do município de Lago dos Rodrigues. O casal possui um filho, André, 20 anos, que durante a semana mora com os pais e, nos fins de semana, estuda Zootecnia na cidade de Pedreiras. Jone, 25 anos, filho mais velho de Josilene, é casado e técnico em Agropecuária, e reside na comunidade vizinha de São João da Mata. O amor pelo campo veio dos antepassados do casal e foi repassado para os filhos.

Em 1988, o agricultor Antônio Ramos decidiu vender uma área de 98 hectares e deixar o povoado de Três Poços. Um grupo de 22 famílias foi formado para comprar a área, e se denominou Sociedade dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de São João (em homenagem ao santo padroeiro do povoado). Adquiriu a terra com recursos próprios, complementados com um aporte da Igreja. 

Essa contribuição financeira foi negociada com as famílias da sociedade, dentre as quais a de Mizael, e convertida, à época, ao valor equivalente a 700 sacos de farinha de mandioca 

Estabelecimento familiar

Mizael e Josilene dispõem de três áreas de terra, que, segundo eles, são todas escrituradas. Possuem 10 hectares na terra adquirida pelo grupo dos 22, cujo documento é coletivo, mas que foi, recentemente, loteada entre os sócios. Além dessa área, possuem 5 hectares, herdados da família de Josilene, e 1,7 ha herdado da mãe de Mizael, local onde a família reside e desenvolve algumas atividades produtivas.

Nessa última área, o casal formou uma pequena pastagem de 0,4 ha e manteve a palmeira babaçu associada em baixa densidade (menos de 30 palmeiras por hectare) com capim-mombaça.

Próximo à pastagem, numa área de 0,6 ha, a família trabalha com agricultura sem utilizar fogo ou agroquímicos, cultivando quiabo, cuxá (vinagreira), milho e feijão. Também cultivam coentro, cebolinha e alface, entre outras espécies, em uma horta de 0,17 ha.

Croqui do estabelecimento familiar da família

Recentemente, a família se tornou beneficiária do projeto Babaçu Livre, da Cooperativa dos Pequenos Produtores Agroextrativistas de Lago do Junco (Coppalj), financiado pela empresa de cosméticos L’Oréal.

Pomar agroflorestal

O casal implantou um pomar em sistema agroflorestal de 0,5 ha no entorno da residência, onde foram plantadas diversas mudas de abacaxizeiro consorciadas com 150 touceiras de bananeira, além de mudas de cajueiro e de ipê.

A família também trabalha com culturas alimentares básicas (milho, feijão e mandioca) na área da Sociedade dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de São João, grupo do qual faz parte há 30 anos. As famílias estabeleceram normas específicas para trabalhar nessa terra, combinando uso comum da palmeira babaçu e apropriação privada dos produtos agrícolas de cada roça. No ano de 2017, haviam produzido 180 kg de arroz, 600 kg de milho e 180 kg de feijão.

Sistema agroflorestal com integração de abacaxizeiros, bananeiras, cajueiros e ipês. Foto: Aline Nascimento

Produção de verduras e frutas

O cultivo de hortaliças é uma das atividades produtivas desenvolvidas pela família, e tem sido sua principal fonte de renda nos últimos 5 anos. Em 2013, a Associação em Áreas de Assentamento no Estado do Maranhão (Assema) replicou uma tecnologia social, denominada Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (Pais), na propriedade da família, com apoio da Fundação Banco do Brasil.

O sistema Pais consiste em uma horta circular, onde, no centro da área, é construído um espaço para criação de animais de pequeno porte. Na área da família, foi construído um aviário para galinhas caipiras. As aves produzem carne e ovos para alimentação e comercialização do excedente. Também produzem esterco, utilizado na adubação dos canteiros circulares preparados no entorno do aviário.

Os vegetais também são utilizados na alimentação das aves. Essa integração entre a produção animal e vegetal facilita o aproveitamento dos resíduos de ambas as atividades e contribui com a diminuição na quantidade de insumos externos adquiridos.

Nos últimos anos, a família intensificou a produção de hortaliças e preparou outros canteiros, mas no formato retangular. A expansão da horta aumentou a demanda por esterco, sendo necessário adquirir esse adubo orgânico nas propriedades vizinhas que criam bovinos. Quando o esterco adquirido não está curtido, a família “passa uma semana aguando para ir morrendo a força, pois se plantar [logo] as hortaliças nascem, mas morrem todas”.

O intervalo de plantio dos canteiros é de 7 dias, de modo que seja possível colher produtos para consumo e comercialização em todas as semanas. A família realiza a rotação de culturas. Por exemplo: quando for colhido o coentro, vai ser colocada alface, como forma de evitar pragas e doenças.

Esterco bovino utilizado no preparo de canteiros. Foto: Aline Nascimento

Alternar o plantio do tipo de hortaliça entre uma safra e outra no mesmo canteiro é necessário para evitar doenças. A família também percebeu que o cuxá (vinagreira) e o quiabo plantados debaixo do sombrite apresentam menos sintomas de ataque de fungos.

As diversas espécies de plantas, pertencentes a várias famílias botânicas, têm diferentes tipos e tamanhos de raízes, exploram o solo de forma diferenciada e, com isso, podem aproveitar os nutrientes deixados pela cultura anterior. Além disso, as plantas de mesma família botânica são sensíveis às mesmas doenças, atraem os mesmos insetos que causam danos e exploram aproximadamente os mesmos nutrientes e área de solo.

Outra prática da família é a formação de cobertura morta nos canteiros, utilizando folhas secas e resíduos das capinas realizadas frequentemente na horta. Essa prática protege o solo da erosão e minimiza as perdas de nutrientes por lixiviação (lavagem do solo) e de água por evaporação.

A família também utiliza as folhas das palmeiras de babaçu, denominadas localmente de palhas, para cobrir os canteiros, porque consideram que “fica melhor para nascer, continua frio, preserva a umidade” e contribui para que a “semente nasça mais rápido e tudo igualzinho. Se deixar descoberto, ela [semente] vai secar e demorar mais para nascer”.

Canteiros de alface e cebolinha, e canteiro, recém semeado, coberto com palha de babaçu. Foto: Aline Nascimento

Irrigação

A irrigação dos plantios é feita duas vezes por dia, mesmo durante o verão, quando, porém, é preciso dobrar a quantidade de água utilizada na horta. Embora possua um sistema de irrigação, a família prefere utilizar o regador, pois acredita que dessa forma economiza água.

O ciclo de produção das espécies cultivadas pela família varia:

  • Cebolinha, 30 dias; pepino, 45 dias; coentro, 50 dias; alface, couve,
  • Cuxá e maxixe, 60 dias; batata-doce, pimentão e tomate, 90 dias. No período chuvoso, a produção é interrompida porque a área é baixa e a drenagem ruim. Por esses motivos, o terreno alaga com chuvas frequentes e intensas.

Na produção de todas as espécies citadas anteriormente, o controle de pragas e doenças é realizado sem o uso de agrotóxicos. Como alternativa, a família utiliza caldas que aprendeu a preparar durante oficinas e nas atividades de caráter coletivo realizadas no período de execução dos serviços de assistência técnica e extensão rural (Ater), financiados pelo governo federal. 

Conforme o gráfico a seguir, elaborado a partir de informações fornecidas pelo casal sobre suas fontes de renda no ano agrícola 2016/2017, a agricultura constitui a principal fonte de renda monetária da família, alcançando 30% do total anual. Dentre os produtos agrícolas comercializados, destacam-se as hortaliças e a banana produzidas no pomar, além de uma pequena quantidade de feijão.

 As hortaliças são comercializadas no próprio estabelecimento, adquiridas pelos vizinhos, e nas comunidades próximas como São João da Mata, Boa Vista dos Lopes, São Francisco, Centro do Toinho e Morada Nova.

A família também obtém renda monetária a partir da criação de animais, renda esta que alcançou 22% do total anual, obtida, principalmente, pela comercialização de suínos e aves, e pela venda ocasional de ovos. A família cria 3 porcos e cerca de 70 aves, entre galinhas, frangos e pintos. Alguns desses produtos são comercializados na cantina da cooperativa, outros na própria unidade de produção ou em povoados vizinhos.

Agricultura e extrativismo

O extrativismo do babaçu possui importância significativa na renda da família, embora no ano em questão o valor monetário obtido pela venda de produtos derivados da palmeira tenha sido limitado a 3% do total anual. Quando tem tempo disponível para quebrar coco, Josilene consegue extrair 10 kg de amêndoas por dia.

Quando não fica responsável pelo trabalho na cantina da Coppalj, ela extrai cerca de 30 kg de amêndoas por semana e, ainda, produz carvão, leite de coco e azeite de babaçu.

Em 2017, Josilene forneceu 200 kg de amêndoas para a Coppalj, além de ter comercializado 25 L de azeite de babaçu. Outros 5 L de azeite, 10 L de leite de babaçu e 25 kg de sabão foram utilizados para o consumo familiar, assim como 300 palhas e quatro latas de paú de babaçu, usado como adubo orgânico na horta familiar.

Mizael produz, a cada 2 meses, uma média de oito latas de carvão a partir da casca do coco-babaçu, o que resulta num total anual de cerca 240 kg, utilizados para o consumo familiar.

Josilene, além de ser agricultora e quebradeira de coco-babaçu, é cooperada da Coppalj e, desde 2008, trabalha na cantina construída no povoado de Três Poços. A cantina fica a poucos metros da sua residência, onde trabalha 15 dias por mês, durante o horário comercial. Josilene já fez parte da direção da Coppalj e da Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Lago do Junco e Lago dos Rodrigues (AMTR) e, atualmente, é membro da diretoria da associação local.

A cantina é um estabelecimento comercial utilizado pela Coppalj para adquirir as amêndoas de coco-babaçu e comercializar uma grande variedade de gêneros de necessidade das famílias. Em Três Poços, Josilene é responsável por comprar ou trocar as amêndoas por mercadorias. Essa atividade não agrícola, representada no gráfico pela renda proveniente de comércio, gera 22% da renda monetária da família.

As diversas atividades desenvolvidas pela família, além de propiciarem retorno econômico e fortalecerem a segurança alimentar e nutricional, contribuem para a redução de despesas com alimentação. 

Lições aprendidas e desafios

A família identifica como fator limitante para o desenvolvimento das atividades produtivas o tempo empregado na comercialização, pois o fato de não ter um veículo com maior capacidade de transporte obriga Mizael a retornar várias vezes até sua residência para abastecer a caixa presa à motocicleta. Além disso, não possui infraestrutura para armazenar os produtos.

Motocicleta utilizada para a comercialização das hortaliças. Foto: Aline Nascimento

Há 2 anos não plantam arroz em virtude das perdas provocadas pelo percevejo-do-colmo (Tibraca limbativentris Stål, 1860), conhecido na região como pulgão.

Também têm dificuldade no controle de algumas doenças das hortaliças, principalmente na alface, sem o uso de agroquímicos. Josilene afirma que “quando está no momento de tirar [para vender], tira de 15 pés e joga fora porque o miolo fica preto, ocado. Já perdemos uns 100 pés de alface”.

A família já aprendeu e continua aprendendo muito com a assessoria técnica da Assema. O filho que mora com o casal estudou no Centro Familiar de Formação por Alternância (Ceffa) Manoel Monteiro, onde concluiu o ensino médio profissionalizante (técnico em agropecuária).

A família produz de forma agroecológica, trabalhando com policultivos, integrando atividades produtivas, técnicas de manejo ecológico do solo, adubação orgânica e controle alternativo de pragas e doenças. 

O sistema agroecológico de produção de hortaliças proporcionou a geração de renda em uma área relativamente pequena, pois permitiu o cultivo de diversas espécies de ciclo curto para fins comerciais. 

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