A disparada do dólar após a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos volta a estimular as exportações brasileiras de açúcar e as cotações internas devem se manter firmes até o início da próxima safra no Centro-Sul, em abril.
Os preços internacionais remuneradores neste ano já haviam beneficiado as usinas, que direcionaram maior parcela do alimento para exportação, em detrimento do mercado doméstico. Como consequência, os valores do cristal por aqui estão em torno de R$ 97 por saca de 50 quilos, alta de quase 20% em 2016 e perto do maior patamar real em cinco anos.
“O câmbio está favorecendo a estratégia de hedge neste momento. Isso representa uma oportunidade adicional de operações futuras para o produtor brasileiro”, explicou ao Broadcast Agro (serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado) Plinio Nastari, presidente da consultoria Datagro. A conta é simples: como o açúcar para exportação é negociado em dólar, isso representa mais reais para os vendedores no momento da conversão de moedas – o que explica a prioridade dada ao alimento em detrimento do etanol.
A preferência das usinas pela produção de açúcar e pela sua venda ao exterior deve-se à alta da commodity na Bolsa de Nova York, de 34% neste ano, refletindo a perspectiva de déficit de produção global pelo menos até 2017. Cálculos do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq/USP) evidenciam essa atratividade. Na semana passada, por exemplo, o produto remunerou 58% mais que o etanol anidro, misturado em 27% à gasolina, e 64% mais que o hidratado, usado diretamente no tanque dos veículos.
Na parcial da safra 2016/2017, de abril a outubro, o Brasil embarcou 17,47 milhões de toneladas de açúcar, volume 32,3% maior na comparação com igual intervalo de 2015. Essa quantidade representa aproximadamente 54% do que foi produzido no acumulado da temporada. Há um ano, as exportações eram 48% da produção. Ou seja, mais açúcar foi para o exterior em 2016, acarretando em menor disponibilidade interna. “Os preços domésticos devem se manter firmes até o início da próxima safra por causa da situação de abastecimento”, afirmou Nastari, lembrando que o Centro-Sul já se encaminha para o período de menor produção, que vai de meados de dezembro até março.
Alguns fatores, porém, podem alterar esse cenário até lá. A começar pela própria safra do ano que vem. Após uma temporada marcada por quebras agrícolas, dadas as adversidades climáticas, as expectativas para o próximo ciclo também não são das mais otimistas, o que pode dar ainda mais suporte aos preços. A avaliação no mercado é de que a oferta de cana tende a ser menor, devido à renovação dos canaviais inferior ao ideal. “O longo prazo vai depender da situação do Brasil. Apesar de a alta do açúcar ajudar o setor, o endividamento das usinas continua elevado”, disse Michael McDougall, diretor de commodities do banco Société Générale, referindo-se às dificuldades financeiras da cadeia produtiva após anos em crise.
Até as medidas tomadas pela Petrobras influenciam nas cotações do açúcar, mas no sentido inverso. A possibilidade de novos cortes no preço da gasolina pela estatal deve desestimular a fabricação de etanol, concorrente direto do combustível fóssil. Dessa forma, as usinas tenderiam a direcionar maior volume de cana para a fabricação de açúcar, elevando a oferta do cristal. “Por enquanto, a Petrobras continua favorecendo a produção de açúcar”, resumiu McDougall. Na atual temporada, quase 47% da oferta de matéria-prima foi para se fazer açúcar, o maior porcentual desde o ciclo 2012/2013.
E há ainda fatores mais técnicos. Fundos e especuladores, que dão liquidez ao mercado global de açúcar, vem reduzindo suas apostas em alta da commodity, o que se traduz em queda na Bolsa de Nova York (ICE Futures US). O temor é que esses participantes se desfaçam ainda mais de suas posições, o que poderia acarretar em forte baixa em Nova York. Atualmente, os valores futuros do açúcar estão entre 19 centavos e 20 centavos de dólar por libra-peso, embora no começo do mês tenham superado os 22 centavos de dólar. Já o etanol hidratado está perto dos R$ 1.800 por metro cúbico desde o início de novembro, tendo por base o Indicador Esalq/BM&F, cuja referência é Paulínia (SP).