Fatores como relevo, variação da pressão de vapor do ar e mudanças climáticas exercem influência sobre a produção dos ouriços das castanheiras (Bertholletia excelsa Bonpl.). Essa descoberta é resultado de uma pesquisa realizada em parceria entre cientistas da Embrapa, da Universidade Federal do Acre (Ufac) e das universidades norte-americanas do Alabama (UA) e da Flórida (UFL).
Durante uma década, os pesquisadores monitoraram e registraram a produção natural de frutos em 258 castanheiras centenárias distribuídas em duas comunidades no estado do Acre: Reserva Extrativista Chico Mendes e Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes.
Os resultados dessa pesquisa foram publicados na revista Nature, no artigo intitulado “Comparative models disentangle drivers of fruit production variability of an economically and ecologically important long-lived Amazonian tree“. A comercialização do produto dessas árvores, a castanha-da-amazônia (ou castanha-do-pará, ou ainda castanha-do-brasil), representa uma importante fonte de renda para milhares de famílias na Região Norte.
A equipe utilizou um modelo matemático para identificar as correlações entre a variação de produção e suas prováveis causas. Constatou-se que anos com estações secas mais severas, caracterizadas por pouca chuva e temperaturas elevadas entre junho e agosto, levaram a uma redução na produção de frutos.
Os pesquisadores observaram que o período de seca é particularmente crucial na determinação da produção de frutos da castanheira, pois é quando as árvores estão florescendo. Além disso, o estudo evidenciou a influência da pressão de vapor do ar na produção.
As árvores localizadas em pontos de maior altitude no terreno apresentaram uma produção de frutos superior em comparação com aquelas situadas em áreas mais baixas na floresta. Outros fatores significativos revelados pelo modelo foram a quantidade de minerais fósforo e potássio disponíveis no solo. Níveis mais altos desses minerais no solo resultaram em maiores quantidades de frutos produzidos pelas árvores.
A pesquisadora Lúcia Wadt, chefe-geral da Embrapa Rondônia, que participou do estudo, explica que muitas espécies de árvores apresentam exigências específicas que, quando não satisfeitas, promovem uma grande variação da produção de frutos entre os anos, inclusive na mesma planta. É o caso da castanheira, em que uma mesma árvore produziu 400 frutos em um ano, e apenas 20, posteriormente, por exemplo. A diferença produtiva também é observada entre árvores de um mesmo castanhal, o que intrigou produtores e pesquisadores e os motivou a tentar entender o fenômeno.
Além disso, decifrar as causas que influenciam a produção das castanheiras é muito importante, uma vez que a espécie apresenta uma grande variação na quantidade de frutos produzidos a cada safra. A grande variação na produção afeta, especialmente, as milhares de famílias que vivem do extrativismo da castanha. Compreender as causas disso ajudará no planejamento desses extrativistas, além de poder orientar os programas de melhoramento genético da espécie, de acordo com Wadt.
Ela conta que o objetivo da pesquisa foi subsidiar com informações que possam colaborar para o planejamento familiar e desenvolver a economia extrativista. Os cientistas também pretendiam identificar características importantes para a previsão de safra em castanhais nativos e gerar informações para o manejo de castanhais, sejam estes nativos ou cultivados.
A pesquisa nos castanhais
Durante pouco mais de uma década, os cientistas coletaram várias informações como o tamanho da árvore e da copa, a posição da planta no relevo, as características físicas e químicas do solo, o comportamento do clima na região de estudo, e área de madeira responsável pelo fluxo de seiva, conhecida como área de alburno, indicador relacionado à saúde das árvores.
O modelo do clima revelou uma relação entre a área do alburno e a produção em anos de seca severa (piores condições ambientais). A boa produção de alguns indivíduos mesmo em anos com seca severa foi associada a árvores nas quais essa área era maior.
A pesquisadora da Embrapa esclarece que isso se dá porque esses indivíduos possuem maior capacidade de armazenar água no tronco e, por isso, resistem mais ao estresse ambiental. A área de copa das árvores foi outro fator importante relacionado à produção: quanto maior a copa, mais frutos eram gerados.
Para Lúcia Wadt, esse estudo desvendou com mais detalhes os fatores bióticos e abióticos associados com a produção de frutos da castanheira. “O achado inédito desse trabalho foi o efeito da área do alburno, como indicador da ‘imunidade’ da árvore contra os efeitos das mudanças climáticas. As castanheiras com maior área de alburno não sofrem muito em anos de seca. Isso pode ser um reflexo da nutrição mineral da planta”, avalia a pesquisadora.
A professora Karen Kainer, da Universidade da Florida, que também assina o artigo, considera que os resultados fortalecem a ideia básica de que a castanheira é uma árvore extraordinária. Além de produzir anualmente frutos que contribuem para a renda dos coletores, a espécie atua também como moderador do ecossistema florestal, uma vez que apresenta mecanismos para resistir às mudanças climáticas.
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