Perdas anunciadas por Sadia, Aracruz e Votorantim somaram cerca de R$ 5 bilhões, mas o rombo total no país pode chegar a US$ 40 bilhões e atingir 200 companhias, afirma o analista Gerson Berti, da Premium Invest, de Florianópolis.
Acostumadas durante os últimos quatro anos a ganhar especulando sobre o dólar em queda, as empresas foram surpreendidas pela reversão no câmbio, que fez disparar a cotação da moeda americana de R$ 1,57 para até R$ 2,50 em menos de três meses. De acordo com Berti, é prematuro tirar conclusões, mas algumas empresas podem ser gravemente atingidas.
Os prejuízos ocorrem porque as corporações abusaram da aposta de que o dólar continuaria a cair. Primeiramente, elas fizeram o chamado hedge, ou proteção cambial, um procedimento recomendado para companhias que fazem negócios em moeda estrangeira. O problema é que algumas empresas foram além e fecharam negociações de dólares no futuro (derivativos cambiais) mesmo sem ter a moeda em caixa ou a receber.
Devido a sua gravidade, o problema já ganhou comparativos com a crise global. A guinada de desvalorização do real recebeu a alcunha de “bolha cambial”, inspirada na “bolha imobiliária” americana. As perdas com os derivativos de dólar, por sua vez, chegaram a ser chamadas de “subprime brasileiro”.
Erro das corporações foi a empolgação excessiva
O professor de economia da UFSC Roberto Meurer esclarece, porém, que a comparação não é adequada. Os derivativos de dólar adquiridos pelas empresas brasileiras não eram empréstimos ruins como os financiamentos subprime (de segunda linha) feitos pelos bancos nos Estados Unidos e que deram origem à crise global.
O erro das empresas brasileiras foi empolgar-se com um mecanismo que rendeu ganhos durante muito tempo, mas que por uma mudança de cenário passou a representar prejuízos, como explica o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de SC (Ibef), Giuliano Wolf.
Os analistas concordam que o problema brasileiro não tem comparação com as dimensões da crise americana. No entanto, indicam que seus reflexos não serão pequenos.
A possibilidade de mais empresas terem se contaminado pelos derivativos de dólar é um dos fatores que levará ao encolhimento do crédito. De acordo com o consultor de finanças Arnaldo Glavam Jr., isso ocorrerá devido ao aumento da taxa Selic pelo Banco Central (BC) e a ampliação das restrições dos bancos a empréstimos.
Os prejuízos também terão reflexos diretos em sua capacidade de investimento. Como explica o professor Meurer, a escassez de crédito no mercado levaria as empresas a recorrer a seus lucros retidos. No entanto, esse estoque de dinheiro será prejudicado pelas perdas com os derivativos de dólar.
Diante disso, só a valorização do real poderia reverter os prejuízos. Meurer explica que a venda de dólares pelo BC deve contribuir nesse sentido. Para Berti, porém, o banco foi muito hesitante quando as perdas começaram a aparecer:
? Deveria logo ter avisado que gastaria o quanto for necessário para baixar o dólar.
Com o problema se agravando, outras entidades entraram em cena. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) emitiu nota exigindo que os resultados das empresas no terceiro semestre esclareçam sua exposição aos derivativos do dólar. No entanto, o alcance da medida é limitado, pois não abrange empresas de capital fechado.