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Especialista dá dicas de como analisar o clima e usá-lo a favor da lavoura de soja

Durante a Abertura Nacional da Colheita da Soja, o meteorologista e diretor da Somar, Paulo Etchichury, destacou pontos importantes para o produtor planejar corretamente sua safra

Daniel Popov, de São Paulo
“Não existe receita de bolo, mas o produtor precisa identificar os riscos para depois aproveitar as oportunidades”, com essa frase, o meteorologista e diretor da Somar, Paulo Etchichury, resumiu como a interpretação correta das informações pode livrar o agricultor de surpresas desagradáveis com o clima. O especialista foi o palestrante principal da Abertura Nacional da Colheita de Soja, que aconteceu em Apucarana (PR), nesta quinta, dia 24.

Uma das reclamações mais constantes vindas do campo é a pouca assertividade da meteorologia. Entretanto, Etchichury explicou que as informações passadas não são erradas, mas amplas demais para uma propriedade, em um determinado município, basear-se somente nelas.

“O produtor recebe muitas informações e às vezes não interpreta corretamente. Ele lê na mídia que um estado receberá chuvas, mas isso não significa generalizada e com a mesma intensidade. Aliás, ele não deve esperar um detalhamento muito maior do que isso, pois seria impossível destacar todas ao mesmo tempo”, afirma o meteorologia.

Diante da informação generalista, o produtor precisa se perguntar: “Como isso pode afetar a minha propriedade?” E com isso buscar o detalhamento que precisa. Etchichury ressalta que não basta ler uma reportagem ou assistir a uma palestra e achar que o clima se resume àquilo.

“Essas informações servem para dar uma ideia do que deve acontecer. Não adianta ouvir El Niño no Sul e achar que terá chuvas gerais, porque muitos outros fatores devem interferir nesse clima”, conta.

Sistemas que influenciam

O clima, entre outras variáveis de uma safra, sempre será uma incógnita para o produtor. Os resultados preliminares desta temporada, se comparado ao ano passado, evidenciam a falta de controle sobre ele.

“Na medida que o produtor entende como o clima afeta seu ciclo de produção, percebe que não é uma coisa só que define o regime de chuvas ou a temperatura para a lavoura de verão, foco neste momento, por exemplo. Ou seja, é preciso entender que o regime de chuvas depende uma combinação de sistemas, não só o El Niño ou La Niña”, diz.

Segundo o especialista, neste ano o oceano Pacífico Equatorial está em processo de aquecimento, ainda sem configurar completamente o El Niño (fato bastante noticiado) e não é o culpado dos eventuais problemas, mas pode ter uma influência indireta.

“Estamos vivendo um ciclo mais longo de 30 anos, chamada Oscilação Interdecadal, fase fria, que não está tão definida. Só por curiosidade, de 1975 a 2005 era a fase quente. Este ciclo gera uma mudança no padrão do regime de chuvas, como temos notado em Mato Grosso, por exemplo, que antes tinha excesso de chuvas, mas nos últimos anos houve uma mudança e as precipitações ficaram melhor distribuídas. O mesmo acontece no Sul, com a redução do risco de estiagens severas”, explica.

Somado a isso há também o ciclo solar, que a cada 11 anos muda, e no momento está no que os meteorologistas chamam de “mínimo solar”, com o pior ciclo dos últimos 100 anos. “Isso significa que temos invernos mais extremos no Hemisfério Norte, por isso os Estados Unidos não tem plantado mais em abril e isso tem se tornado uma ameaça para a segurança alimentar”, conta Etchichury.

Em resumo, o clima é influenciado atualmente por um El Niño não configurado completamente, por uma Oscilação Interdecadal e por um ciclo solar extremo, fora outros fenômenos passageiros como a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT). “Essas mudanças no clima acontecem gradualmente e não de um dia para o outro. Às vezes são bem definidas, outras não, pois há outros fenômenos que podem estar prevalecendo”, destaca.

Mais prós do que contras

“É preciso entender que os riscos trazem oportunidades”, ressaltou o especialista. Até porque o Brasil, com seu clima tropical, tem muito mais a ganhar do que os países do Hemisfério Norte, garante.

Para Etchichury, está na hora desse tipo de tema começar a ser discutido para que o produtor entenda os riscos e assim encontre as oportunidades. “Em tempos modernos, não é viável tomar uma decisão sobre uma variável que não se tem o controle, com base em informações incompletas”, resumiu Etchichury.

Um exemplo destas informações incompletas pode ser observada neste ano, afirmou ele. Com a notícia preliminar de que um El Niño estava se configurando e que as chuvas chegariam em setembro e outubro, muitos produtores correram para plantar antecipadamente e, pior, alguns optaram por variedades precoces para entrar logo com a segunda safra.

“Isso representa um sacrifício do ponto de vista climático. Pois o produtor optou por trabalhar nos limites extremos do clima. O ideal é evitar essas condições ou analisar com mais cautela, pois a sinalização inicial da meteorologia, levando em consideração todos os sistemas que influenciam, pode não ser a mesma no meio da safra e no final”, afirma.

Etchichury relembrou que antes do início da safra, em meados de agosto, as informações de que as chuvas viriam em setembro e outubro, mas faltariam em dezembro e janeiro já haviam sido noticiadas e com ela o produtor deveria ter pesquisado mais profundamente sobre a influência na sua área para não correr riscos. “Com uma safra de margens tão apertadas é complicado generalizar e basear as decisões em algo pouco aprofundado”, afirma.

Dicas rápidas para ficar de olho

1 – Manter o constante monitoramento da meteorologia;

2 – Ter um controle do regime de chuvas, temperatura e umidade do solo em sua propriedade. “Não adianta ele querer precisão da meteorologia se ele mesmo não tem qualquer informação de histórico em sua área”;

3 – Analisar o clima e definir os riscos. “A previsão do tempo nunca terá precisão. Um exemplo é que em agosto do ano passado a meteorologia já apontava como seria o verão, mas naquela época não dava para saber se as chuvas viriam na primeira semana ou na segunda. Mas em cima da primeira informação o produtor já poderia definir o ciclo da variedade que iria plantar”;

4 – Um ano não é igual ao outro. “Então é preciso refazer o planejamento para a safra a cada ciclo. Não adianta querer repetir a receita do ano que tudo foi bem, ou mudar tudo no ano que foi mal”;

5 – Interpretar melhor as informações e se perguntar como aquilo pode afetar sua propriedade. “Bom seria o produtor dividir sua área total de plantio conforme os riscos avaliados e com isso minimizá-los”, conta o meteorologista da Somar. “É preciso entender melhor as variabilidades de clima de uma safra para outra e com isso interpretar melhor a previsão do tempo para se prevenir e minimizar os riscos. Não podemos banalizar a informação resumindo tudo a El Niño e La niña, pois a cada safra tudo muda”.

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