Esses índices estão abaixo da produtividade de 70 toneladas por hectare estipulada pelo governo desde a década de 1980 como um dos critérios para a desapropriação de terras com cana em São Paulo e do Paraná para fins de reforma agrária. Os dois Estados possuem quase 5,5 milhões de hectares com cana para a colheita anual, ou quase 70% dos oito milhões de hectares da cultura no Centro-Sul.
“De forma geral, a produtividade é uma das funções sociais da terra e a terra que não cumpre função social é passível de desapropriação. No entanto, toda propriedade pode justificar e tem todo o direito de defesa”, admitiu o Incra, por meio de sua assessoria de imprensa.
O índice de produtividade é um dos maiores tabus dentro do governo federal, por causa da falta de consenso em relação à revisão dos indicadores propostos pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, em 2009. Se os números sugeridos à época fossem aprovados, a situação seria mais grave, pois a produtividade mínima dos canaviais passaria para 75 toneladas por hectare. No entanto, diante da pressão, o assunto seguiu engavetado pelo governo nos últimos dois anos.
O presidente da Associação dos Produtores de Bioenergia (Udop), empresário do setor sucroalcooleiro e prefeito de Sud Mennucci (SP), Celso Torquato Junqueira Franco, admite a possibilidade de terras canavieiras serem desapropriadas com os índices vigentes.
? Legalmente, a perda de produtividade dá ao governo a possibilidade de desapropriar área improdutiva e o resultado deste ano aumenta o risco. Mas é preciso avaliar se há vontade política do governo ? disse o empresário.
Junqueira Franco sugeriu, inclusive, que entidades do setor, como a própria Udop e a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) “se preparem e elaborem documentos como respaldo, para evitar algum problema”. Caso isso aconteça, quem deve municiar o setor é o CTC, entidade de pesquisa e desenvolvimento mantida por usinas e destilarias que apontou índices de produtividade abaixo dos mínimos para desapropriação.
Segundo o gerente de produtos do CTC, Luiz Antônio Dias, há uma série de explicações para justificar essa produtividade baixa, de 69,5 toneladas por hectare na safra 2011/12, que representa quedas de 15,3%, ante as 82,1 toneladas por hectare colhidas na safra passada, e de 18,1% em relação ao índice considerado “mínimo ideal” para a região, que é de 85 toneladas por hectare.
As estiagens nas últimas duas safras, as fortes geadas este ano e o florescimento dos canaviais, induzido pelo clima irregular entre fevereiro e março, são fenômenos climáticos que contribuíram para a quebra da produtividade. Também existe a questão econômica, como o envelhecimento e a falta de renovação das lavouras, além da redução nos tratos agrícolas nos canaviais após a crise de 2008, que atingiu com força o setor sucroalcooleiro.
? Mais da metade da perda de produtividade, ou de 14% a 15% desses 18%, ocorre por esses dois fatores. Outros motivos secundários, como aumento de pragas e impactos da mecanização na colheita, também contribuíram para essa queda ? disse Dias.
O gerente do CTC prevê que no fechamento da safra o índice de produtividade fique ainda menor, em torno de 69 toneladas por hectare, e também vê possibilidade para desapropriações por conta desses números. No entanto, segundo ele, o cenário deve mudar a partir da próxima safra.
? O clima melhorou bastante, com períodos de chuva alternando com curtos de estiagem muito bons para o plantio e o desenvolvimento das lavouras ? aponta Dias.