Segundo a decisão, o órgão de proteção ao índio e o Ministério Público Federal não foram consultados antes da saída ter sido determinada. Ainda de acordo com a sentença, o estatuto estabelece que nenhuma medida judicial pode ser concedida sem a prévia audiência da União.
Na decisão do último domingo, dia 2, a juíza federal substituta em plantão Raquel Domingues do Amaral havia determinado que a União e a Funai retirassem os índios que ocupam a propriedade em 48 horas. Essa decisão foi tomada após uma ação ingressada na Justiça pelos donos da propriedade ocupada depois que os índios voltaram a ocupar a área.
Ao suspender o prazo estabelecido por Raquel, a Justiça fixou um novo prazo de 36 horas para que a União, a Funai e o Ministério Público Federal se manifestem sobre a questão. Só então a Justiça Federal voltará a analisar a concessão de um novo mandado de reintegração de posse.
– Nenhuma medida judicial será concedida liminarmente em causas que envolvam interesse de índios ou do patrimônio indígena, sem prévia audiência da União e do órgão de proteção ao índio [Funai]. É o que se recomenda na jurisprudência dos tribunais superiores, a fim de se evitar possíveis nulidades da decisão apreciadora do pedido de liminar – diz trecho da sentença.
– Assim, deve ser anulada a decisão liminar de reintegração de posse de terras em processo de demarcação [de terra indígena] – destaca o documento disponível no site da Justiça Federal.
Eles haviam saído após a intervenção da Polícia Federal e da Polícia Militar, quando houve um confronto que resultou na morte do indígena Oziel Gabriel, 35 anos. Além de Gabriel, mais três índios com ferimentos leves e um policial ficaram feridos durante o confronto e foram atendidos no Hospital Beneficente Elmíria Silvério Barbosa. Um inquérito foi instaurado para apurar se houve abuso dos policiais e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, prometeu rigor na apuração.
A fazenda, que permaneceu ocupada do dia 15 de maio ao dia da ação policial, voltou a ser ocupada no dia seguinte (31) à morte de Gabriel. Ela pertence ao ex-deputado estadual Ricardo Bacha, mas fica no interior de uma área de 17 mil hectares (um hectare corresponde a 10 mil metros quadrados, o equivalente a um campo de futebol oficial) já reconhecida pela Funai como território tradicional indígena. Com base nos estudos antropológicos feitos pela fundação, o Ministério da Justiça decretou, em 2010, que a área fosse destinada à posse e ao usufruto indígena.
Área de conflito
De acordo com a Funai, a disputa por terras, causa dos confrontos entre índios e fazendeiros, se arrasta desde pelo menos 1928, quando o antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI, órgão substituído pela Funai em 1967) criou uma reserva terena com 2.090 hectares (um hectare corresponde a 10 mil metros quadrados, o equivalente a um campo de futebol oficial).
Após 1988, quando a Constituição Federal assegurou aos povos indígenas direitos às terras tradicionalmente ocupadas por seus antepassados, os terenas passaram a reivindicar a ampliação da reserva. Responsável por elaborar os estudos de identificação das terras indígenas, a Funai, em 2001, concluiu que os terenas têm direito a uma área de 17 mil hectares. Área que engloba, entre outras propriedades, a Buriti.
A exemplo de outros fazendeiros da região que conseguiram interromper a continuidade do processo demarcatório na Justiça, Bacha garante ter documentos que comprovam que a fazenda pertence à sua família desde a década de 1920.