Justiça Federal suspende Leilão da Resistência em Mato Grosso do Sul

Decisão impede a realização de qualquer evento com o mesmo propósito no Estado, sob pena de multa de R$ 200 milA Justiça Federal de Campo Grande suspendeu nesta quarta, dia 4, a realização do Leilão da Resistência, que estava programado para o sábado, dia 7. Organizado pela Associação dos Criadores (Acrissul) e pela Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso do Sul (Famasul), o leilão tinha o objetivo de arrecadar recursos para contratação de segurança privada para as propriedades rurais do Estado.

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A suspensão atendeu a uma ação do Conselho Aty Guassu Guarani Kaiowá e do Conselho do Povo Terena. Os indígenas temem que a contratação de seguranças privados signifique o acirramento dos conflitos armados na região. Na decisão, a juíza federal Janete Lima Miguel determina que as entidades se abstenham de realizar o leilão agendado para sábado no Parque de Exposições Laucídio Coelho, em Campo Grande, bem como outros leilões similares em locais e datas diversas, sob pena de multa de R$ 200 mil.

Em sua decisão, a magistrada disse que, conforme foi noticiado pelos jornais de grande circulação em Mato Grosso do Sul, bem como em sites da internet, o evento visava “reverter o dinheiro arrecadado com o leilão no financiamento de contratação de segurança privada para as áreas rurais, compra de armamento e formação de milícias, tudo com o fim de “resistir” à luta dos indígenas”, o que a juíza entendeu como um comportamento que não pode ser considerado lícito “visto que pretendem substituir o Estado na solução do conflito existente entre a classe ruralista e os povos indígenas, contrariando, dessa forma, a norma insculpida no artigo 144 da Constituição Federal”, comportamento que “tem o poder de incentivar a violência entre os envolvidos no conflito em questão, o que colide com os princípios constitucionais do direito à vida, à segurança e à integridade física”.
 
No pregão, seriam ofertados animais, cereais, máquinas e produtos doados pelos agricultores e pecuaristas de Mato Grosso do Sul. Os promotores esperavam arrecadar cerca de R$ 3 milhões. Segundo as entidades organizadoras, os recursos seriam utilizados na mobilização dos produtores, em logística, pagamento de honorários de advogados, divulgação, além da contratação de segurança para as fazendas.

Segundo informações da assessoria do 3º Tribunal Regional Federal de Mato Grosso do Sul, a Acrissul e a Famasul devem intimadas da decisão ainda nesta quarta.

Tensão crescente

As tensões entre proprietários e indígenas em Mato Grosso do Sul ganharam intensidade com o desaparecimento do cacique guarani-kaiowá Nísio Gomes, em novembro de 2011 no município de Aral Moreira. Os guarani-kaiowás afirmam que ele foi assassinado por fazendeiros e teve seu corpo ocultado. As investigações sobre o desaparecimento do cacique tiveram poucos avanços.

Em junho, um novo conflito durante a ocupação de três fazendas em Sidrolândia resultou na morte do indígena Oziel Gabriel, de 35 anos. Desde então o Estado tem vivido uma série de ocupações e ações de reintegração de posse. Em novembro, os produtores sul-mato-grossenses da região de Japorã se uniram a vizinhos do Norte do Paraná em um acampamento para protestar contra a demora para se chegar a uma solução, denunciando que 14 fazendas da região estão invadidas por guarani-kaiowás. Eles também realizaram protestos em frente a sede da Fundação Nacional do Índio (Funai), em Campo Grande (MS).

Tanto indígenas quanto produtores protestam contra a morosidade do governo em resolver os conflitos. O Ministério da Justiça criou um grupo de trabalho para tratar desta questão e prometeu comprar áreas para facilitar o processo de criação de terras indígenas, algo que não está previsto na legislação que regula a criação de terras indígenas. Mas até o momento, foram poucos os avanços e as tensões não param de crescer.

No último domingo, dia 1, outra liderança foi morta no Estado. Ambrósio Vilhalva, do acampamento Guyraroká, em Caarapó, foi assassinado a facadas a caminho de casa. As lideranças acusam os fazendeiros e as lideranças rurais dizem que o assassinato não tem relação com disputa de terras, mas é resultante de problemas com alcoolismo e das más condições de vida dos indígenas do Estado. Em todo Mato Grosso do Sul, as entidades representativas dos produtores calculam que existam 80 propriedades invadidas por indígenas.

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