— Com certeza, as deficiências elas se tornaram visíveis em todas as áreas, nessa área em que nós atuamos da criança e do adolescente, especificamente, nós começamos a observar deficiência na parte educacional, as estruturas das escolas não comportaram esse aumento significativo, falta de vagas, as próprias creches não conseguem atender a demanda, a área da saúde ela tenta acompanhar para oferecer serviços de saúde, postos, médicos, e também não consegue acompanhar — explica o Presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Maracaju, Clóvis Roberto Schmitt.
A população do município cresceu 42,66% em 10 anos, passando de 26.219 habitantes em 2000 para 37.405 moradores em 2010.
Conselho Tutelar e o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) não têm registros de casos de exploração, mas é consenso entre profissionais da Rede de Proteção dos Direitos de Crianças e Adolescentes que o problema existe na cidade, mas as denúncias não são efetivadas. As vítimas têm medo e algumas famílias são coniventes.
— Em algumas situações nós conseguimos perceber inclusive que existe conivência da família, principalmente na questão das adolescentes. Às vezes ela não tem consciência de que aquilo que está passando é exploração sexual, para ela aquilo é um envolvimento amoroso e nós sabemos que é exploração sexual — diz a secretária municipal de Assistência Social, Rosane Conceição de Andrade Pinho.
Relações entre as garotas e adultos se desenvolvem como namoros, quase casamentos. Iludidas com a possibilidade de uma vida melhor, se decepcionam.
— Elas encaram como um namoro, aí acaba acontecendo que elas não têm essa visão de exploração — afirma a coordenadora do Creas de Maracaju, Renata de Lima Matos.
Em Maracaju praticamente não existem opções de lazer. Locais de vulnerabilidade não faltam na cidade. O ônus do desenvolvimento é a prosperidade da prostituição. A falta de denúncias gera sensação de impunidade e perpetua a prática deste crime.
— Eles acham que se não tem denúncia não tem fato. Eles acham que não vai acontecer nada com eles, porque hoje eles estão aqui, mas amanhã estão em outra cidade. Então eles têm essa sensação, mas não que eles não estão cientes da responsabilidade deles — afirma a coordenadora do Conselho Tutelar de Maracaju, Maria Helena Ziemann.
A Associação dos Produtores de Bionergia do Mato Grosso do Sul (Biosul) defende que as indústrias trouxeram mais benefícios. O presidente da entidade, Roberto Hollanda Filho, aponta que a recente mudança de perfil dos trabalhadores contribuiu para que o município prevenisse esse tipo de violência. Hoje o corte manual é muito pequeno, o que reduz a mão de obra sazonal que inundava as cidades com milhares de homens durante a safra.
Em Maracaju, entre 2006 e 2010, a arrecadação do Imposto sobre Serviços de qualquer Natureza (ISS) aumentou 151%, segundo levantamento da Biosul. No entanto, ou os investimentos na rede de proteção dos direitos de crianças e adolescentes não foram suficientes ou faltou planejamento.
— O poder Executivo investe muito pouco naquilo que pode proporcionar uma melhoria da criança e do adolescente e, por causa disso, nós do poder Judiciário muitas vezes ficamos de mãos atadas. Nós determinamos internações, tratamento, mas não temos onde se fazer isso. É uma pena realmente — lamenta o juiz de Maracaju, Marcus Vinícius de Oliveira Elias.
— Nenhum município onde foram instaladas usinas, não só em Mato Grosso do Sul, estava preparado. De repente o município tem um X de população e do dia para a noite amanhece totalmente mudado na sua estrutura. Então, isso mexe com a parte da educação, a parte da saúde, com tudo — diz a coordenadora do Creas de Maracaju.
A secretária de Assistência Social até reconhece que mais precisa ser feito, mas defende que o município está atuando para resolver o problema.
— Consigo perceber que nós já avançamos bastante. Com a implantação do Creas, em 2009, toda e qualquer denúncia que chega é averiguada, é acompanhada, e nós já conseguimos avançar bastante, mas ainda tem muito a ser melhorado — afirma Rosane de Andrade.
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