O dólar se valorizou com força frente ao real em novembro e atingiu o maior patamar nominal desde o início do Plano Real. Apesar disso, cálculos do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, mostram que a relação de troca de saca de 60 kg de soja ou de milho por uma tonelada de fertilizante esteve, em novembro, bastante favorável ao produtor de importantes praças que comercializam estes grãos.
Segundo pesquisadores do Cepea, esse cenário é resultado dos elevados preços internos da soja e do milho. Além disso, os valores de alguns fertilizantes registram pequenas quedas entre novembro do ano passado e o mesmo período deste ano.
De acordo com dados levantados pelo Cepea, no caso da soja, produtores de Sorriso (MT) precisaram, em novembro deste ano, de 26,07 sacas da oleaginosa para comprar uma tonelada de KCl, contra 30,87 sacas necessárias no mesmo mês do ano passado, ou seja, 4,8 sacas a menos. No Paraná, produtores da região de Cascavel precisaram, em novembro, de 2,16 sacas a menos que no mesmo mês do ano passado para a compra de uma tonelada do fertilizante potássico.
Quanto ao milho, ainda com base nos dados do Cepea, o poder de compra frente à ureia aumentou com força entre novembro do ano passado e o mesmo mês de 2019. Em Sorriso, foram necessárias 58,32 sacas de 60 kg do cereal para a aquisição de uma tonelada do fertilizante nitrogenado, 44,5 sacas a menos que em novembro do ano passado (102,81 sacas). Em Cascavel, a relação de troca passou de 73,13 sacas de milho para 50,43 sacas para a compra de uma tonelada do insumo com base de ureia, ou seja, 22,70 sacas a menos.
Em relação aos preços domésticos da soja, segundo pesquisadores do Cepea, o impulso vem das fortes demandas externas e internas pelo grão. Em novembro, os valores médios mensais da soja estiveram nos maiores patamares reais desde outubro de 2018. Em relação ao milho, compradores domésticos mostram necessidade de novas aquisições, enquanto produtores estão retraídos do mercado. Além disso, as exportações têm registrado volumes recordes, limitando ainda mais a disponibilidade doméstica.
Estudos do Cepea/USP mostram que uma elevação do dólar tende a favorecer o agronegócio, setor que exporta bastante e importa pouco, mantendo-se superavitário pelo menos nos últimos 25 anos. Para o produtor agrícola, uma alta do dólar atua via dois canais: eleva os custos por causa do aumento dos preços dos insumos importados e incrementa a renda bruta porque aumenta a receita das exportações convertida em reais. Mas, como regra, sabe-se que o aumento da renda supera a elevação de custos.
Desde o ano 2000, o valor real do dólar (descontada a inflação brasileira) tem caído substancialmente, acumulando, até este ano, queda próxima de 50%. Isso quer dizer que o aumento do preço do dólar no Brasil não acompanhou a inflação. Em outras palavras, se nossa moeda (o Real) não tivesse se valorizado em termos reais, o faturamento das exportações transformado em Reais seria o dobro do atual.
Os preços em dólares dos produtos do agronegócio brasileiro subiram 124% de 2000 até 2011. Desde então vêm caindo, estando, mesmo assim, atualmente 53% mais altos do que em 2000. Mas esses preços convertidos para Reais estão 27% abaixo de seus valores em 2000. Mesmo assim, o agronegócio vem aumentando sua competitividade e exportando cada vez mais.
Atualmente, o agronegócio exporta um volume de produtos 3,6 vezes maior do que em 2000. Como isso tem sido possível? Pelo aumento da produtividade. Estudos do Ministério da Agricultura calculam que a produtividade agrícola aumentou 78% de 2000 a 2017, compensando com sobra a queda dos preços, devido à valorização do dólar.
Em síntese, o dólar valorizado tem prejudicado o agronegócio, mas não a ponto de fazê-lo perder competitividade. O mesmo não se pode dizer da indústria brasileira, para a qual uma moeda mais desvalorizada (dólar mais alto) é essencial.
Qual a tendência do dólar daqui para a frente? Confira a análise do coordenador científico do Cepea, Geraldo Barros:
Prever ou explicar o comportamento do dólar é um dos maiores desafios para os economistas. Segundo ele, sabe-se que a queda da taxa de juros no Brasil tende a reduzir o ingresso de dólares no país e favorecer aumento do seu preço. Ou seja, se o cenário for de juros menores no Brasil, o equilíbrio da taxa de câmbio vai se mover para valores mais altos.
“Um resultado a comemorar! Incertezas políticas, institucionais e econômicas também podem induzir taxas mais altas, algo a lamentar. Assim, por boas ou más razões, os diversos setores econômicos brasileiros podem se beneficiar duplamente: juros mais baixos no crédito e dólar mais alto que favorece as exportações e desestimula as importações. Isso é bom para o agronegócio e ótimo para a indústria – e para a economia, em geral”, falou.
Há um temor justificado de que a alta do dólar tire a inflação de sua rota de estabilização em níveis historicamente baixos. Provavelmente isso não aconteça em razão do baixo crescimento econômico e da alta taxa de desemprego. O primeiro coíbe o repasse das altas do dólar para os preços ao consumidor.
O segundo faz com que altas salariais e, portanto, de custo, sejam muito improváveis. Por último, o Banco Central tem munição e instrumentos para conter um descontrole cambial. Em síntese, uma alta do dólar que não escape ao controle pode contribuir para a recuperação econômica do Brasil. O agronegócio, em particular, não tem o que temer no tocante ao dólar. Sua preocupação maior deve se concentrar, assim, nos conflitos comerciais e na imagem do País no que se refere a questões ambientais e sanitárias.