“Paguei muito caro para instalar a safra 22/23. Os custos de produção estavam lá em cima. Quando fui vender, o preço da saca estava lá embaixo”, conta o produtor Sérgio Ferreira, de Itapeva, interior de São Paulo.
“Já comprei toda a semente de soja para a próxima safra, mas a relação de troca está bem negativa”, diz o produtor José Eduardo Macedo Soares, de Lucas do Rio Verde, em Mato Grosso.
Esses são apenas alguns dos relatos de sojicultores Brasil afora. Há quem duvide e ache que o produtor pode estar reclamando de “barriga cheia”, mas uma análise mais cuidadosa comprova as grandes perdas recentes.
Estudo analisa a rentabilidade obtida
Para embasar melhor essas queixas, o balanço parcial da Datagro Grãos evidencia que as finanças dos sojicultores brasileiros no primeiro semestre deste ano estão mostrando desempenho misto, mas pendendo para o negativo, o que desestimula o plantio da nova temporada.
Essa inclinação desfavorável está ligada aos preços médios muito inferiores às elevadas médias do mesmo período do ano passado, conforme o estudo. Além disso, se deve, também, à obtenção de lucratividades ainda positivas na maior parte dos casos, mas inferiores na comparação com 2022.
Analisando o comportamento dos preços, o mais visível dos indicadores, nota-se que as médias em reais observadas nesses primeiros seis meses do ano estão muito abaixo dos excelentes resultados verificados em igual momento de 2021 e 2022, se aproximando das médias históricas.
Preços médios inferiores
A Datagro toma como base cinco das principais bases de negociação do país. Assim, os preços médios deste ano estão de 21 a 22% inferiores ao ano anterior nas cotações em reais – e também entre 21 e 22% nas cotações em dólares.
“De todo modo, até o momento, as cotações médias ainda garantem resultados positivos de renda a grande parte dos produtores, à exceção dos que tiveram perdas mais destacadas com o clima, como foi o caso da metade oeste do Rio Grande do Sul”, comenta o economista e líder de conteúdo da empresa, Flávio Roberto de França Junior.
Até o dia 7 de julho, apenas 66% da safra brasileira 2022/23 estava vendida. Em igual período dos anos passados, o patamar era o seguinte:
- 77% em 2022;
- 91% no recorde de 2020;
- 80% na média dos últimos 5 anos.
Renda da soja x custo de produção
A segunda variável mais relevante é a lucratividade bruta, que compara a receita obtida com o custo de produção, que a princípio tende a manter a preferência do produtor brasileiro pela oleaginosa.
A despeito do expressivo recuo nos preços e dos maiores custos de produção, o setor mantém lucratividades dominantemente positivas pelo 17º ano consecutivo, lembra o balanço da Datagro.
Contudo, houve piora em relação aos excelentes resultados do ano passado e com expectativa de um pouco mais de declínio até o fechamento da temporada.
Esse cenário foi possível devido à obtenção de preços médios em reais ainda acima dos padrões normais e, portanto, remuneradores aos sojicultores, apesar de muito aquém do excelente padrão dos últimos dois anos.
Soja como investimento
O terceiro indicador considerado pelo estudo é a rentabilidade financeira, que considera a soja como uma opção de investimento.
O primeiro semestre apresentou resultados fortemente negativos, muito abaixo do excelente desempenho no mesmo acumulado de 2022, “o pior nessa série de 23 anos”, ressalta França Junior.
Dessa forma, a performance foi muito pior quando comparada com a de outros ativos analisados em virtude do aumento gradativo da aversão ao risco do mercado.
“Em outras palavras, guardar a soja para vender mais tarde foi uma péssima opção entre janeiro e junho deste ano, quadro que tende a continuar muito ruim nos próximos meses”.
A média de preço da soja no Brasil acumulou perda real (já descontada a inflação) de 29,90% no acumulado de 2023 até junho. Em igual momento de 2022, a média brasileira estava em +5,71%.