Agricultores pagam manutenção de estrada para escoar a safra

Com medo de novos impostos, os agricultores criticam a falta de investimento do governo estadual na infraestrutura, que acaba custeada por eles próprios

Fernanda Farias | Uruçuí (PI)

Os produtores rurais do Piauí se articulam para evitar que o estado também comece a tributar as exportações agrícolas, a exemplo do que aconteceu em Goiás. Para eles, o governo estadual deve primeiro oferecer investimento em logística e energia.

Um exemplo da falta de cuidado com o escoamento da safra é na rodovia Transcerrados (PI-397), que corta o estado de norte a sul e por onde passa quase toda a produção de grãos do Piauí. A estrada tem 340 km, mas apenas 50 km são asfaltados. O restante é estrada de terra, em condições ruins. Os produtores calculam que só os impostos pagos em duas safras já seriam possíveis terminar a obra de custo estimado em R$ 500 milhões.

– O ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços] pago pelas nossas compras de insumos, com um custo de R$ 2.000 para insumos básicos em uma área de 700 mil hectares, daria para pagar essa obra em dois anos. São R$ 340,00 por hectare que vai para o governo todo o ano – explica o presidente do Sindicato Rural de Bom Jesus, Abel Pieta.

Começa a crescer a preocupação entre os agricultores que o estado queira arrecadar ainda mais sobre a produção de grão. Um dos receios é que o governo adote uma alteração nas regras do ICMS nos mesmos moldes do que foi feito em Goiás, onde indústrias e tradings são tributadas se venderem se exportarem mais de 60% e 70% da produção, respectivamente. Hoje, o estado produz cerca de 1,8 milhão de toneladas de soja.

– Como ainda é uma conversa de bastidores, nós estamos articulando com o setor produtivo e o setor político, para mostrar que isso impactaria muito na renda do produtor. A gente avalia de maneira muito negativa, já que o setor já é tributado e não se tem retorno desse imposto em infraestrutura. É mais um imposto que vai tirar a renda do produtor. Não temos expectativa de retorno em investimentos porque isso nunca aconteceu – critica o diretor-executivo da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Piauí (Aprosoja-PI), Rafael Maschio.

Outra estrada em situação ruim é a BR-330, que também é rota para a entrega de insumos e escoamento da safra. Além da pista simples e de terra, a rodovia não tem acostamento. Trafegar dois caminhões ao mesmo tempo é quase impossível. Para amenizar o problema, os produtores trocaram o trabalho de campo e colocaram as máquinas em ação para tentar deixar a estrada em condição um pouco melhor.

Se não fizerem isso, a soja colhida nas fazendas não consegue sair. O agricultor Tarcísio Balsan é um dos 20 produtores que estão trabalhando para melhorar a rodovia. E isso não é uma novidade.

– Todo ano a gente faz este trabalho, nos mobilizamos durante alguns dias para fazer a manutenção da estrada. Se não fizer isso, nós perdemos parte da nossa produção e somos nós que vamos sair perdendo – argumenta Balsan.

Energia

Assim como as estradas são mantidas pelos próprios agricultores, a energia também. O presidente da associação que representa os produtores rurais da região de Uruçuí, Eneas Bovino, conta que as famílias só têm energia elétrica porque os agricultores pagaram a reforma na rede de distribuição. Nas fazendas, o jeito é ainda o gerador.

– Nós aqui só temos energia porque nós bancamos. Se fosse por parte do governo, a energia não viria para cá. A gente espera que uma hora o governo se comova e nos ajude um pouco mais – pede o produtor rural Sávio Scröder.

– A gente se banca há 15 anos, nós construímos estradas, trazemos energia. Me parece que o governo quer que a gente seja produtor de impostos e não de alimentos. Isso nos revolta – critica Abel Pieta.

Veja a reportagem:

>>> Veja mais notícias sobre soja