Cultivares com maior resistência à podridão de grãos e o uso de fungicidas são opções de manejo para reduzir as perdas de produtividade de soja, apontam redes de pesquisa que estudam o tema.
Inicialmente chamado de anomalia da soja, o problema vem ocorrendo desde a safra 2018/19 e com maior frequência na região do médio-norte do estado de Mato Grosso e em Rondônia.
Diferentes espécies de fungos foram identificadas em vagens e hastes com e sem sintomas de apodrecimento de grãos, mas os fatores que desencadeiam o problema ainda são desconhecidos.
Por isso, diversas redes multidisciplinares de pesquisa estão analisando dados como clima, fertilidade e física do solo, teor de lignina e outros que possam dar pistas sobre a doença.
A rede que avalia a eficiência dos fungicidas traz os primeiros resultados que poderão auxiliar nas estratégias de manejo da doença, com o lançamento da publicação Eficiência de Fungicidas para o Controle da Podridão de Grãos da Soja.
Em paralelo, outro grupo avaliou a reação à podridão de 54 cultivares de soja (42 transgênicas e 12 convencionais) e identificou cultivares com bom e médio nível de resistência e as que são suscetíveis ao problema.
A podridão dos grãos de soja
O pesquisador da Embrapa Soja, Maurício Meyer, conta que durante as visitas à região, observou-se que o problema atingia as cultivares de maneira diferente e os sintomas respondiam ao tratamento com fungicidas. “Por isso, foram formadas redes de ensaios cooperativos para avaliar a sensibilidade das cultivares à doença e a eficiência dos fungicidas”.
Os sintomas descritos inicialmente como anomalia correspondem principalmente à podridão dos grãos e das vagens. Diversas amostras foram coletadas nas quais foram encontradas, nas vagens, grãos e hastes, um complexo de fungos de diferentes espécies de Fusarium, Diaporthe e Colletotrichum.
Mancha-púrpura
Em algumas safras, também observaram alta incidência de mancha-púrpura nos grãos, causada por Cercospora spp.
“Esses fungos podem ser encontrados de forma latente na planta e nos grãos (fungos endofíticos), sem causar sintomas aparentes: cada um associado a uma doença quando ocorrem os sintomas. Eles foram identificados mesmo em vagens e grãos sem sintomas”, diz a pesquisadora da Embrapa Cláudia Godoy.
A pesquisadora explica ainda que, no início dos sintomas, as vagens podem apresentar encharcamento, escurecimento ou ambos, sem abertura visível. Quando abertas, apresentam apodrecimento dos grãos.
“A presença de vagens com sintomas e os grãos apodrecidos ocorrem de forma aleatória na planta e na vagem, respectivamente, não necessariamente acometendo todos os grãos”, conta.
Quando ocorrem os sintomas?
Claudia avalia que os sintomas ocorrem principalmente a partir do enchimento de grãos (estádio R5), até sua maturação (estádio R8). Segundo ela, as condições de estresse relacionadas ao clima estimulam que os fungos latentes iniciem a infecção.
“Os fatores que desencadeiam a maior frequência de apodrecimento de grãos por esses patógenos nessas regiões ainda estão em estudo”, explica a pesquisadora.
Em ensaios realizados na Embrapa Agrossilvipastoril, em Sinop (MT), diferentes espécies de fungos obtidos de vagens com sintomas de apodrecimento foram inoculadas em plantas de soja em casa de vegetação, mas até o momento, nenhum desses isolados reproduziram nas plantas os sintomas que ocorrem no campo.
A pesquisadora Dulândula Wruck explica que também estão sendo estudadas técnicas de inoculação, uma vez que alguns isolados matam a planta dias após a inoculação quando se utiliza a técnica do palito.
“Até agora com as informações que temos, é possível que outros fatores estejam envolvidos na manifestação dos sintomas, por isso que os projetos em andamento são multidisciplinares, analisando dados como clima, fertilidade e física do solo, teor de lignina etc”.
Praticamente todas as empresas de pesquisa localizadas no eixo da BR 163 no médio-norte do Mato Grosso estão estudando o problema. “Os resultados da rede de fungicidas e de cultivares da safra 2022/23 são uma fonte de informação para o produtor, para auxiliar no manejo do problema”, afirma a pesquisadora.
Avaliação de fungicidas
Para avaliar a eficiência de fungicidas no controle da podridão de grãos na soja, foram realizados cinco protocolos na região do médio-norte de Mato Grosso e em Rondônia.
Os tratamentos utilizaram fungicidas sítio-específicos (atingem um processo metabólico do fungo ou uma única enzima ou proteína necessária para sua sobrevivência) isolados e em misturas sem e com fungicidas multissítios (interferem em muitos processos metabólicos dos fungos).
“Nesses experimentos, os fungicidas foram avaliados individualmente e em aplicações sequenciais”, explica Cláudia Godoy.
Durante a safra 2022/23, a pulverização de diferentes fungicidas, nos ensaios realizados em rede, tiveram como resultado a redução dos sintomas da doença e o aumento de produtividade.
“O uso de fungicidas favorece tanto a redução da incidência de sintomas da podridão quanto o controle de outras doenças, como a mancha-alvo – predominante na região – o que reflete em melhoria de produtividade”, afirma.
“Entendemos que os fungicidas são uma relevante ferramenta de controle, devendo ser definidos de acordo com a sensibilidade das cultivares à podridão de grãos e a outras doenças”.
Além do uso de fungicidas no manejo da doença, os pesquisadores orientam a adoção de diferentes estratégias antirresistência. Eles defendem, por exemplo, que as informações obtidas nesses estudos ajudem a determinar programas de controle, priorizando sempre a rotação de fungicidas com diferentes modos de ação.
Eles alertam que as aplicações sequenciais com os mesmos ingredientes ativos devem ser evitadas para diminuir a pressão de seleção de resistência de fungos aos fungicidas.