Bacharel em direito, Camilo afirmou, em entrevista à Agência Brasil, que a operação policial causou uma reviravolta no Estado, dificultando inclusive o início de seu mandato. Defendeu a necessidade de um novo modelo de gestão, mais eficiente, mas disse encontrar dificuldades para implementá-lo.
Agência Brasil – Que balanço o senhor faz desses primeiros meses à frente do governo amapaense e qual a situação encontrada ao tomar posse?
Camilo Capiberibe ? Os primeiros dias de governo foram para organização administrativa e sanar problemas emergenciais. Recebemos uma dívida de R$ 1,7 bilhão e teremos que cortar gastos para podermos fazer investimentos ainda este ano. Estamos negociando com os credores e auditando algumas das dívidas, pois não sabemos sequer se elas de fato foram feitas. Quando assumimos havia 5,4 mil trabalhadores contratados temporariamente. Hoje eles são 2,1 mil. Só não cortamos [contratos temporários] na saúde e na educação. Queríamos cortar mais, mas a situação de desorganização administrativa é tanta que não nos permite saber onde todos os funcionários estaduais estão lotados. Por isso estamos recadastrando os servidores. Também tivemos que resolver uma grave crise energética, quase um conflito social, na região sul do Estado, pagando [dívidas da] Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA).
ABr ? O problema energético que o senhor mencionou ainda não foi equacionado?
Capiberibe ? Não, o problema da CEA realmente não foi solucionado. A dívida da companhia com a Eletronorte, que produz e vende energia ao Estado, é R$ 1,4 bilhão e não temos condições de pagar sem comprometer nossa capacidade de investimentos no próprio sistema, que está defasado. Uma dívida que vem de anos e que, com os juros e multas, passou de R$ 100 milhões, em 2003, para os atuais R$ 1,4 bilhão. Queremos discutir estes acréscimos, mas o Ministério de Minas e Energia está insensível. Embora eu não veja condições políticas para que o contrato de concessão da companhia seja cancelado, temo que a falta de flexibilidade do ministério cause um apagão energético no segundo semestre deste ano pois estamos impedidos de contratar mais energia.
ABr ? Tem havido resistência às mudanças administrativas já implementadas?
Capiberibe ? As forças políticas desorganizadas pela Operação Mãos Limpas continuam lá [no Estado]. Recuaram com receio, mas estão agindo para tentar garantir a manutenção de certos privilégios. Evidente, então, que além de todos os desafios administrativos em setores como educação e saúde, há ainda pressões por vantagens financeiras que temos que combater o tempo todo.
ABr ? Como vai o relacionamento político com o governo federal?
Capiberibe ? Excelente, com exceção do Ministério de Minas e Energia, o único em que não conseguimos resolver as pendências do Estado. Se continuar assim, vou acabar chegando à conclusão de que a razão é política [o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, foi indicado para o cargo pelo presidente do Senado, senador José Sarney (PMDB-AP), adversário político da família Capiberibe]
ABr ? E o relacionamento com o prefeito de Macapá, Roberto Góes (PDT) [sobrinho do ex-governador Waldez Góes e apoiado pelo presidente do Senado, José Sarney]?
Capiberibe ? Somos adversários políticos, mas temos conversado e temos várias parcerias construídas da forma como está sendo possível. O prefeito sabe que isso não é fácil já que esteve detido [por suposto envolvimento no esquema investigado pela Operação Mãos Limpas] e que, por isso, não podemos repassar recursos à prefeitura. Temos que encontrar uma maneira de ajudar na execução de obras que seriam de responsabilidade da prefeitura para que a população não seja prejudicada. E o prefeito entende isso.
ABr ? A Operação Mãos Limpas dificultou a governabilidade do Estado?
Capiberibe ? Sem dúvida. Ela causou uma reviravolta muito grande no Estado ao atingir a elite política que estava no governo há anos, derrubando várias pessoas. Agora, aquela estrutura continua existindo. Nossa tarefa mais ampla é fazer uma mudança cultural, o que é muito mais difícil do que substituir pessoas. Uma das primeiras coisas que eu fiz foi criar o Portal da Transparência estadual. Agora quero divulgar a relação de todos os servidores públicos, sem exceção, com o local onde estão lotados e o horário de trabalho. É um direito do cidadão saber onde está o trabalhador pago com seus impostos. Esta é a forma do cidadão fiscalizar as más práticas que porventura aconteçam, porque a gente as combate, mas nunca acaba com elas.