A vida inteira, o produtor Odair Novello trabalhou com cana. É de família tradicional na atividade. Só que plantar hoje, rende menos do que há 10, 15 anos, diz ele.
? A margem caiu. Questão de margem, lucro mesmo caiu. Você tem mais ganho porque aumentou a quantidade ? conta.
Há 15 anos, Odair colhia 30 mil toneladas de cana. Hoje, colhe 300 mil. Há pouco mais de uma década, a cana que ele colhia virava açúcar. Hoje, mais da metade vira etanol também. Para atender a demanda, Odair investiu em variedades mais produtivas, em máquinas mais eficientes, comprou terras. Na região de Piracicaba, ele tem quatro mil hectares de canaviais.
O produtor cresceu para acompanhar o mercado. A cada ano pelo menos 20 novas usinas são abertas no Brasil.
O progresso no campo veio depois de um fracasso político/econômico no Brasil. Era década de 70 quando o governo federal criou o Proálcool. A intenção era substituir a gasolina e reduzir as importações de petróleo, que se tornou muito caro na época. Houve com isso o incentivo à produção, à modernização e ampliação de destilarias, ao consumo de álcool. Um detalhe no mercado derrubou todas as intenções.
? Acontece que depois de 10 anos, lá por volta de 1985 o preço do petróleo caiu. Então acabou ficando artificial sustentar o programa de etanol. Com a crise então em 85, 88, a produção de etanol começou a diminuir e o que se achou que ia acontecer é que seriam abandonados os carros que usavam 100% etanol ? explica o professor da Universidade de São Paulo (USP), José Goldenberg.
A virada veio com investimento em tecnologia, daí os carros flex, e mais que isso, com um apelo ambiental. Tão importante quanto os interesses econômicos da indústria automotiva, do setor sucroalcooleiro, era produzir os chamados combustíveis limpos. Neste processo, o mais recente é o biodiesel. O óleo feito a partir da soja, girassol, mamona, das chamadas fontes renováveis, polui menos que o diesel de petróleo, mas tem muito que rodar ainda pra fazer diferença realmente.
Especialista em biodiesel, Miguel Ângelo Vedana, diz que a luta do setor é para aumentar o percentual da mistura de biodiesel ao diesel. Hoje o índice chega a 5%.
? A expectativa agora dos produtores de biodiesel é que em 2012 se aumente a mistura para 7% e que em 2020 o Brasil consuma 20% de biodiesel misturado ao diesel.
Mas muito já feito, é preciso dizer. Foi nesses últimos 15, 20 anos, da década de 90 pra cá, que surgiu o que os especialistas chamam de agenda ambiental positiva. A partir daí a agricultura brasileira deu um salto na discussão de temas sobre meio ambiente, sobre sustentabilidade. Um exemplo mais recente e – diga-se de passagem, polêmico – é a proposta de mudança no Código Florestal.
? Hoje, enquanto países desenvolvidos pagam para o produtor plantar floresta porque faz bem para o meio ambiente, a gente tem florestas em nossas fazendas aqui no Brasil. Quem não tem vai buscar compensar diante do novo Código Florestal ? aponta o gerente do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), Rodrigo Lima.
As mudanças no código ainda não foram aprovadas. A expectativa é que sejam votadas até o fim deste ano em Brasília. Enquanto isso, a produção no campo não pára. A cana que o seu Odair plantou agora está novinha ainda, mas logo, logo vai pro mercado. De preferência, um mercado cada vez mais limpo.
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