O programa Agricultura de Baixo Carbono (ABC) é uma das principais ações adotadas na safra atual (1º de julho de 2010 a 30 de junho de 2011) pelo Ministério da Agricultura, para reduzir a emissão de gases de efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2). Além de oferecer financiamento a produtores rurais, o governo promove estudos por meio da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e capacitação profissional para facilitar a difusão de práticas como plantio direto na palha, fixação biológica de nitrogênio, recuperação de pastagens degradadas e o sistema Integração Lavoura-Pecuária-Florestas (ILPF), que contribuem para a preservação das áreas de produção.
O coordenador de Assessoria de Gestão Estratégica do Ministério da Agricultura, Derli Dossa, lembra que o ABC é destinado aos produtores rurais de todos os biomas brasileiros e busca, nos próximos dez anos, deixar de emitir 165 milhões de toneladas equivalentes de CO2.
? A nova agricultura colocada em prática está voltada para diminuir a quantidade de gases poluentes e tem como consequência um clima menos quente no mundo ? afirma.
Outras vertentes do programa são a manutenção de florestas comerciais e a recomposição de áreas de preservação ou de reservas florestais, estimulando a redução do desmatamento, sobretudo no bioma Amazônia. A iniciativa complementa as ações do Programa Boi Guardião, lançado em 2009 para monitorar o desmatamento de áreas produtivas na região Norte. Pela regra, apenas o pecuarista que não desmatar para abrir novos pastos no bioma amazônico recebe a Guia de Trânsito Animal Eletrônica (GTA) para comercializar o gado.
Além do ABC, recursos do Plano Agrícola e Pecuário 2010/2011 são investidos no Programa de Incentivo à Produção Sustentável do Agronegócio (Produsa), que inclui a cultura da palma (dendê) entre os itens financiáveis, quando cultivada em áreas degradadas. E a ação que complementa o ciclo de atividades desenvolvidas para promover uma safra mais verde do país é o Programa de Plantio Comercial e Recuperação de Florestas (Proflora), direcionado à implantação de florestas e à recomposição das áreas de Reserva Legal e Preservação Permanente. A intenção do governo é aumentar, até 2020, a área de florestas de seis milhões para nove milhões de hectares. Isso permitirá a redução da emissão de oito milhões de toneladas a 10 milhões de toneladas de CO2 (medida que considera todos os gases de efeito estufa), no período de dez anos.
Dos R$ 18 bilhões oferecidos como crédito rural no Plano Agrícola e Pecuário desta safra, R$ 2 bilhões são destinados ao programa ABC e R$ 1 bilhão ao Produsa. O produtor vai acessar o crédito do Produsa nas agências do Banco do Brasil.
? Ao optar pela adoção de práticas sustentáveis, como Integração Lavoura-Pecuária-Floresta, Produção Orgânica ou Sistema Agropecuário de Produção Integrada, o agricultor poderá obter o crédito a juros de 6,75% ao ano, com a possibilidade de chegar a 5,75%, caso desenvolva essas atividades em áreas degradadas ? destaca o secretário de Desenvolvimento e Cooperativismo do Ministério da Agricultura, Márcio Portocarrero.
Para o presidente da Embrapa, Pedro Arraes, o ABC consolida as metas negociadas pelo Brasil na COP15, dando oportunidade ao país de ter a agricultura mais verde do mundo.
? O Brasil vai vender a âncora verde de sua agricultura. Isso abre negócios, aumenta a renda dos agricultores e melhora as condições ambientais ? ressaltou. Para Arraes, a agricultura ambientalmente correta só traz benefícios para a sociedade e para a economia, já que o país poderá estender as exportações para mercados que valorizam a sustentabilidade.
Etapas do ABC
Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF)
O programa Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) está no foco da chamada “agricultura verde”. O sistema combina atividades agrícolas, florestais e pecuárias, promovendo a recuperação de pastagens em degradação. De acordo com o Ministério da Agricultura, a área utilizada nesse sistema pode ser aumentada em quatro milhões de hectares nos próximos dez anos. A previsão é que o volume de toneladas de dióxido de carbono (CO2) diminua entre 18 milhões e 22 milhões no período.
Praticada no Brasil há mais de 40 anos, a ILPF consiste no cultivo de uma espécie florestal que possibilita, por dois ou três anos, a adoção de uma cultura de interesse comercial, como soja, milho e feijão. Em seguida, a área é coberta por forrageira (planta para alimentação do gado) associada ao milho ou ao sorgo. Após a colheita dos grãos, o pasto é formado nas “entrelinhas” da floresta cultivada, permitindo a criação de bovinos e sua exploração e até o corte da madeira.
Para o pesquisador Luiz Carlos Balbino, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o sistema pode ser adotado em todas as propriedades rurais, de pequeno a grande porte. Na opinião do pesquisador, a técnica é vantajosa porque maximiza a produção e conserva os recursos naturais.
? Isso é obtido por meio da integração das atividades agrícolas, pecuárias e florestais, pela convivência em uma mesma área, a partir da sincronização de suas etapas de produção, que se retroalimentam ? destaca.
Hoje, a Embrapa, por meio do Departamento de Transferência de Tecnologia, coordena uma rede de pesquisadores de 30 centros da própria instituição, universidades, empresas públicas e privadas, órgãos de assistência técnica e extensão rural, além de organizações não-governamentais, para ordenar as ações do projeto Transferência de Tecnologia para ILPF. Esse projeto propõe o repasse de conhecimentos para a recuperação de pastagens em degradação e de lavouras com problemas de produtividade e sustentabilidade. Estudo realizado no âmbito do projeto estima que cerca de 50 milhões de hectares de pastagens degradadas são consideradas agricultáveis.
Recuperação de pastagens degradadas
Com o incentivo do programa ABC, a meta do governo é ampliar, nos próximos dez anos, a área atual de pastagens recuperadas de 40 milhões de hectares para 55 milhões de hectares. O maior uso da tecnologia vai proporcionar, no período, a redução da emissão de 83 milhões a 104 milhões de toneladas equivalentes dos gases de efeito estufa.
? Temos cerca de 200 milhões de hectares para a pecuária. Se aumentarmos em 10% a produtividade nessas áreas, teremos mais 20 milhões de hectares disponíveis para a agricultura ? calcula o secretário-executivo do ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Gerardo Fontelles.
A recuperação de terras degradadas é uma técnica que funciona há mais de 20 anos e pode ser aplicada em qualquer bioma brasileiro. É considerada fundamental porque representa a permanência do produtor na atividade e garante a conservação dos ecossistemas.
Para o pesquisador da unidade Gado de Corte da Embrapa Ademir Zimmer, o manejo inadequado e a falta de reposição de nutrientes do solo representam grande risco para a pecuária brasileira.
? Além disso, a degradação da área impacta o meio ambiente, ocasionando perda de matéria orgânica e, como consequência, a liberação de dióxido de carbono e metano ? explica.
A recuperação de pastagem é feita pela correção do solo com adubação, restabelecendo a produção da forragem, que pode utilizar a mesma espécie ou uma nova cultivar. A necessidade de preparo do solo com uso de máquinas e a dosagem de adubo em camadas mais superficiais ou profundas dependem do estágio de degradação do solo.
Plantio Direto
No uso do plantio direto, estima-se a ampliação da área atual em oito milhões de hectares, de 25 milhões para 33 milhões de hectares, nos próximos dez anos. Esse acréscimo vai permitir a redução da emissão de 16 milhões a 20 milhões de toneladas de CO2 equivalentes.
Além de promover o sequestro de dióxido de carbono da atmosfera, o plantio direto é exemplo de agricultura conservacionista, mantendo a qualidade dos recursos naturais, como água e solo.
? Preservamos o solo e conseguimos fazer com que praticamente não se fale mais em erosão. A água que sai das lavouras para os rios é limpa, sem lama ? enfatiza. O local de plantio também é beneficiado com maior número de nutrientes.
Plantio de Florestas
Outra solução para a questão ambiental está no plantio de florestas comerciais, como eucalipto e pinus. Quanto mais difundido o plantio dessas espécies, mais a fotossíntese sequestra dióxido de carbono (CO2) da atmosfera. A intenção do governo é aumentar a área de florestas, até 2020, de seis milhões de hectares para nove milhões de hectares. Isso permitirá a redução da emissão de oito milhões de toneladas a dez milhões de toneladas de CO2 equivalentes, no período de dez anos.
O pesquisador Francisco Bellote, da Embrapa Florestas, ressalta que o Brasil é internacionalmente reconhecido como o maior detentor de tecnologia para esse plantio.
? Temos material genético de altíssima qualidade, desenvolvido em quase 50 anos, que garante produtividade e controle da tecnologia ? explica.
Bellote acredita que a prática é benéfica não só para o meio ambiente ? com o balanço nulo dos gases de efeito estufa ?, mas também para o bolso do produtor rural. Para ele, o plantio de eucalipto é uma das atividades mais rentáveis do agronegócio, pois supre, por exemplo, as demandas dos setores siderúrgico, com a produção de carvão vegetal, e agrícola, na secagem dos grãos.
Fixação Biológica de Nitrogênio
Apesar de o produtor rural utilizar a adubação mineral para o fornecimento de nitrogênio às culturas agrícolas, esse material costuma ser caro e seu uso inadequado pode produzir impactos ambientais negativos. A técnica de fixação biológica de nitrogênio tem como base o uso de plantas leguminosas, consorciado à cultura comercial, que podem suprir a necessidade de minerais necessários como adubação.
As bactérias fixadoras de nitrogênio nas raízes dessas leguminosas também atuam no interior de plantas, como a cana-de-açúcar, cereais e gramíneas forrageiras. Outra alternativa para o agricultor é o uso de adubos verdes antes do cultivo da cana-de-açúcar, no momento da reforma do canavial.
A inoculação de bactérias em sementes de leguminosas é uma tecnologia capaz de reduzir consideravelmente a adubação mineral nitrogenada e, em alguns casos, substituí-la, pois o nitrogênio fixado pode alcançar em média 1500 kg/ha, reduzindo o custo de produção. A técnica já é muito difundida entre os produtores de alimentos orgânicos.