Uma das piores pragas para a soja já não assusta tanto assim. Pelo menos para alguns produtores que já usam cultivares de soja com tolerância a percevejos. A Embrapa que já possui, desde 2016, uma variedade com esta característica, decidiu agora criar uma linha focada no inseto, o Block. Mas o que os produtores que já testaram a soja tolerante aos percevejos acharam? Confira abaixo!
O produtor Leandro Becker, de Quatro Pontes, no oeste do Paraná, resolver testar na última safra a soja tolerante aos percevejos da Embrapa, após tê-la visto em um dia de campo em uma cooperativa local. Dos 120 hectares que possui, 7 foram separados para receber a variedade BRS1003.
“Vi essa tecnologia em um dia de campo e me chamou a atenção a arquitetura da planta e a produtividade. Por aqui, sempre precisamos ficar de olho pois os percevejos são um problema. Eles vão desde o milho até a soja”, comenta.
Os resultados impressionam. Mesmo em um ano que o clima atrapalhou muito a produção de grãos, Becker registrou uma colheita de 66 sacas por hectare com a BRS, contra médias bem inferiores nas demais áreas, que variam do mínimo de 49 sacas até a máxima de 57,8 sacas por hectare.
“Não podemos esquecer que essa tecnologia é uma opção a mais no controle dessa praga. Ela não elimina a necessidade de fazer aplicação de inseticidas. Eu precisei fazer uma só na última safra na BRS 1003, enquanto nas demais cheguei a fazer até 3”, afirma Becker. “Isso representa uma grande economia.”
Para esta nova safra 20192020, os 7 hectares com a BRS se transformarão em pelo menos 48 hectares. O produtor já comprou as sementes necessárias (que não custaram mais do que as que ele já usava normalmente) e muito menos inseticidas. “Minha economia pode chegar a 60% menos inseticidas, o que é ótimo. Sem falar que sem aplicar tanto agroquímico ainda preservamos os inimigos naturais dessas pragas”, comenta Becker.
Produtor de sementes
E não é só o produtor de grão que aprovou a tecnologia, os agricultores especializados na produção de sementes também apontam uma demanda crescente pela BRS 1003.
“Temos notado um aumento na demanda sim, tanto que só no Mato Grosso do Sul a área com esta variedade tem sido ampliada. Por lá, o clima mais quente tem favorecido o surgimento e proliferação dos percevejos e elevado o gasto para controlá-los”, diz o sementeiro Josef Pfann Filho.
O produtor possui uma área de 1.850 hectares em Dourados (MS) e outra de 1.960 hectares em Guarapuava (PR). A BRS 1003 ocupa respectivamente 100 e 160 hectares. Mas os produtores de ambos os estados têm percebidos a economia que a tecnologia proporciona.
“Em Mato Grosso do Sul é comum ver produtores fazendo até 7 aplicações para controlar os percevejos de maneira satisfatória. Com a semente da Embrapa é preciso no máximo duas. Sem falar que ela permite que tenhamos mais flexibilidade na aplicação do agroquímico, podendo aguardar por condições climáticas melhores para iniciar a pulverização”, diz Pfann.
Mesmo com as sete aplicações na soja sem a tolerância, os grãos destas plantas ainda apresentaram marcas e danos do inseto. Sem contar que o preço da semente não é maior que os materiais de outras empresas. “Os benefícios são notáveis e o preço da semente é parecido com a Intacta, por exemplo”, afirma.
Embrapa lança linha para percevejos
Após o sucesso de suas sementes para percevejos a Embrapa resolveu criar uma linha específica para o combate a este inseto, nomeada como BLOCK.
“Os percevejos são atualmente uma das pragas mais importantes para a cultura da soja, porque interferem na produtividade e na qualidade dos grãos e das sementes”, avalia o chefe-geral da Embrapa Soja José Renato Bouças Farias. “Por isso, estamos empenhados no desenvolvimento de cultivares de soja com esta tecnologia para auxiliar os produtores que enfrentam dificuldades no campo para manejar esta praga”, avalia.
O pesquisador Carlos Arrabal Arias, líder do programa de melhoramento genético de soja da Embrapa, e responsável pelo desenvolvimento de genótipos resistentes a insetos diz que a Tecnologia Block amplia a proteção da lavoura ao ataque dessa praga que suga as vagens e os grãos de soja. “As cultivares com a genética Block têm maior tolerância aos percevejos, o que minimiza a ação destrutiva da praga. Porém, a tecnologia não dispensa o uso de inseticidas, mas permite uma melhor convivência com os insetos no campo”, enfatiza Arias.
A primeira cultivar de soja com a tecnologia Block é a BRS 1003IPRO, que foi desenvolvida pela Embrapa Soja com a Fundação Meridional de Apoio à Pesquisa. A BRS 1003IPRO é uma cultivar de soja do grupo de maturidade 6.3 (macrorregiões 1 e 2) e 7.0 (macrorregião 3), indicada para os seguintes estados: Paraná, Santa Catarina, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Goiás e Minas Gerais.
“Esta cultivar apresenta ampla adaptação, excelente potencial produtivo, estabilidade de produção e moderada resistência ao nematoide de galha Meloidogyne javanica, além de resistência às principais doenças da soja como o cancro da haste, mancha olho-de-rã e podridão radicular de fitóftora”, ressalta Arias.
Lançamento na próxima safra
A Embrapa e a Fundação Meridional irão lançar na safra 2019/2020 uma nova cultivar, desenvolvida via melhoramento genético tradicional, e que amplia as opções de cultivares tolerantes a percevejo no mercado.
“A vantagem dessa tolerância é que o produtor pode aguardar mais tempo para realizar as pulverização com inseticidas, o que além de reduzir custos ainda mantém a presença dos agentes de controle biológico no campo, favorecendo o controle natural da praga, pela integração de táticas do Manejo Integrado de Pragas, como o controle biológico e a tolerância da soja aos percevejos”, explica Arias.
Percevejo marrom – O principal problema dos percevejos é o seu ataque direto ao grão e às vagens da soja, diferentemente das lagartas, por exemplo, que atacam as folhas. “Por isso, existe potencial de perda em produtividade e também em qualidade de produtos que serão gerados como o óleo e a ração animal”, explica o pesquisador Samuel Roggia, da Embrapa Soja. No caso dos produtores de semente, o problema é ainda maior, porque o ataque de percevejos afeta o vigor da semente, o que impactará no estabelecimento adequado da futura lavoura.
Em particular, o controle do percevejo-marrom (Euschistus heros) tem sido feito principalmente com a utilização de produtos químicos e há vários casos de população da praga que apresentam elevada tolerância a alguns inseticidas. “São populações em que os inseticidas não conseguem controlar tão bem”, diz Roggia. Além disso, comparativamente com outras pragas, o percevejo-marrom ainda não tem disponíveis outras ferramentas como a biotecnologia e o controle biológico aplicado. Quando os percevejos tornam-se resistentes a produtos químicos, o risco de perda é grande. “Por isso, é importante termos cultivares tolerantes a esta praga como ferramenta para ser utilizada no manejo integrado dessa praga”, avalia.