Supremo Tribunal Federal afasta posse indígena de fazenda em Caarapó (MS)

Critério seguiu entendimento do caso Raposa Serra do Sol, em RoraimaA Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por votação majoritária, julgou, na noite de terça, dia 16, a favor do recurso apresentado pelo proprietário rural Avelino Antonio Donatti, declarando a nulidade do processo administrativo que demarcava de Terra Indígena Guyraroká sua fazenda, que fica em Caarapó, em Mato Grosso do Sul.

Na terça passada, dia 9, a ministra Cármen Lúcia manifestou-se a favor do recurso, seguindo a posição do ministro Gilmar Mendes, que na sessão de 24 de junho votou a favor do recurso do proprietário contra a declaração de suas terras como sendo de posse imemorial (permanente) da etnia guarani-kaiowá, integrando a Terra Indígena Guyraroká.

A Turma aplicou o entendimento firmado pelo plenário do STF no julgamento do caso Raposa Serra do Sol e decidiu reformar acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que indeferiu mandado de segurança com o qual o proprietário da fazenda buscava invalidar a declaração da área como terra indígena.

O julgamento do recurso foi concluído com o voto do ministro Celso de Mello, que se alinhou à divergência aberta em sessões anteriores no sentido de manter o precedente do STF no julgamento da Raposa Serra do Sol. Segundo o ministro, naquela ocasião foi estabelecida a data da promulgação da Constituição Federal como marco temporal para análise de casos envolvendo ocupação indígena. Naquela ocasião, decidiu-se que o marco temporal da ocupação indígena seria a data da promulgação da Constituição Federal de 1988, em 5 de outubro daquele ano.

– A proteção constitucional estende-se às terras ocupadas pelos índios considerando-se, para efeitos dessa ocupação, a data em que foi promulgada a vigente Constituição. Vale dizer, terras por eles já ocupadas há algum tempo, desde que existente a posse indígena – declarou.

O relatório de identificação e delimitação da Terra Indígena Guyraroká, disse o ministro, indicou que a população indígena guarani-kaiowá residiu na área, objeto de disputa, até o início da década de 1940. Deste modo, “há mais de 70 anos não existe comunidade indígena na área, portanto não há que se discutir o tema da posse indígena”, afirmou Celso de Mello.

O ministro considerou ainda que o Plenário do STF, no julgamento da PET 3388 (Raposa Serra do Sol), estipulou uma série de fundamentos e salvaguardas institucionais relativos às demarcações de terras indígenas.

– Trata-se de orientações que não são apenas direcionadas àquele caso, mas a todos os processos sobre o mesmo tema – consignou.

Ele ainda ressaltou que se há necessidade comprovada de terras para acolher a população indígena, “impõe-se que a União, valendo-se da competência constitucional de que dispõe, formule uma declaração expropriatória”.

Votos

O relator, ministro Ricardo Lewandowski, votou, no dia 24 de junho, pelo desprovimento do recurso do produtor, por entender que o mandado de segurança não é o instrumento judicial adequado para discutir questão de tal complexidade. Abriu divergência o ministro Gilmar Mendes, que deu provimento ao recurso interposto pelo proprietário rural. A ministra Carmén Lúcia, na sessão seguiu a divergência aberta pelo ministro Gilmar Mendes. A Segunda Turma decidiu suspender o julgamento para aguardar voto do ministro Celso de Mello, proferido na sessão de ontem, e o ministro Teori Zavascki se declarou impedido.

Entenda o caso

A área total reivindicada pela etnia guarani-kaiowá já passou por estudos de identificação e delimitação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e foi declarada terra indígena pela Portaria n° 3.219/2009 do Ministério da Justiça. Faltam a colocação de marcos físicos, que limitam a área, e a homologação pela Presidência da República. A área total da Terra Indígena Guyraroká é de 11.401 hectares. Ela está localizada em Caarapó.

A ação é polêmica, pois o Ministério Público Federal (MPF) defende que há provas de que os indígenas viviam na região há mais de 100 anos, e começaram a ser expulsos da região no final dos anos 1920. O MPF tem uma série de ações para restaurar direitos das etnias de Mato Grosso do Sul, que considera terem sido expulsas à força de seus territórios ou reunidas em pequenas áreas, para dar lugar à agropecuária.
Segundo dados do MPF, Mato Grosso do Sul tem a segunda maior população indígena do país – 70 mil pessoas – e é palco das disputas de terras que geram os mais altos índices de homicídios do país. Em 2008, a taxa de homicídios entre os guarani-kaiowá foi de 210 por 100 mil habitantes, 795% maior que a média nacional.