O glúten se tornou um vilão na mesa das pessoas. A proteína derivada de cereais como trigo, centeio, ceveda e aveia é tratada como inimigo do peso ideal e da saúde. Pelo menos é nisso que muitas pessoas querem acreditar. Essa crença faz o consumidor abrir mão de produtos como pães, bolos, cerveja, biscoitos e massas. No final, perde a pessoa, que faz uma dieta restritiva sem necessidade.
Para desmistificar a questão, o pesquisador norte-americano Alan Levinovitz, da James Madison University, estudou o assunto para escrever o livro “A Mentira do Glúten” (CDG Editora). Na obra, Levinovitz traz a incansável busca do ser humano por soluções mágicas para uma vida mais saudável. Um dos exemplos citados ocorre na China, que, em certo momento da história, definiu que o consumo de grãos poderia fazer mal, tese que foi desmentida séculos depois.
“A ideia de que existe uma solução simples, uma solução alimentar, para todos os problemas da vida está presente em todas as culturas desde o início dos registros históricos. Nós sempre quisemos acreditar que nós podemos controlar completamente a nossa saúde e bem-estar a partir do que consumimos”, explica o pesquisador.
Aqui no Brasil, a dieta sem glúten começou a ganhar mais força depois que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por meio da Lei 10.674/2003, passou a obrigar a indústria a utilizar a expressão “Não contém glúten”. Para a indústria, a mensagem já cria uma predisposição em achar que o glúten é negativo, que o fato de ele não estar presente no alimento é algo bom.
Para separar o joio do trigo, o Canal Rural listou mitos e verdades sobre o “vilão da balança”: o glúten.
Mitos
Solução milagrosa: Alan Levinovitz é especialista em religião e milagres, que ele estudou muito para saber que não existem. O pesquisador reitera que o fim do glúten na alimentação não é uma solução mágica para os problemas alimentares. “As pessoas acreditam que uma solução que serve para uma pequena parcela pode solucionar os problemas de todo mundo, e as pessoas querem acreditar em milagres. Uma cirurgia salva a vida de muitas pessoas, mas não significa que todo mundo deve passar por ela”, argumenta.
Glúten engorda: Levinovitz lembra que a pesquisa que associa o glúten diretamente ao ganho de peso não é definitiva . A presidente da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição (SBAN), Olga Amancio, explica que o que emagrece em uma dieta restritiva sem glúten é o menor consumo de carboidratos, que acaba queimando mais gordura do corpo. Para ela, não é necessário eliminar a proteína para perder peso. “Para quem não tem doença, não tem problema nenhum. Todo mundo comia e mantinha seu peso. Daí surgiu essa moda com relação ao glúten. Mas é só quem não controla quantidade e frequência dos alimentos em geral que acaba engordando” diz.
Comer moralmente: O ponto-chave e a tal “mentira do glúten” para Alan Levinovitz é o consumidor acreditar em algo sem comprovação, apenas elimina o trigo da dieta por achar que isso é o melhor. “Há uma diferença entre comer moralmente bem e o que é bom para a sua saúde. Eu sou simpático aos vegetarianos, que não querem machucar animais para comer. Mas existe uma diferença entre matar o animal e isso ser bom para a sua saúde. No mesmo caso o glúten”, comenta o pesquisador.
Verdades
Apenas 1%: Este é o percentual da população mundial que não pode consumir produtos derivados de trigo. São os portadores da doença celíaca, que é a famosa intolerância ao glúten. Neste caso, a pessoa sente desconforto abdominal ao ingerir o glúten, pode ter diarreias e sentir cansaço acima do normal.
“Dentro da questão sempre há um ‘grão’ de verdade. Há pessoas que deixando de ingerir glúten vão melhorar, porque eles têm um problema, a doença celíaca. Mas nós temos que ter cuidado de não criar o mito de que o glúten faz mal porque ele faz mal apenas a um pequeno grupo de pessoas”, alerta Alan Levinovitz.
A doença pode aparecer tanto no primeiro ano de vida quanto na fase adulta. Porém o método para descobrir se você é intolerante não é tão simples e é necessário passar com um especialista. Não é o “doutor Google” que vai te dizer. “Quem faz esse diagnóstico é o gastroenterologista e não é tão simples. A pessoa se sente mal, tem diarreia e pode ser por diversos motivos. Somente depois de alguns testes é possível determinar se você é celíaco ou não”, diz Olga Amancio, da SBAN.
É possível viver sem glúten: Se você é comprovadamente um celíaco e não pode ingerir glúten, há várias boas notícias. Uma das coisas positivas que a moda da vida sem derivados de trigo trouxe é uma gama de produtos sem glúten que o intolerante pode consumir tranquilamente. O sarraceno, o fubá, a fécula de batata podem muito bem ser usados para fazer bolo. Já produtos como biscoitos, massas e cervejas podem ser encontrados com mais facilidade do que no passado.
Calorias parecidas: Um alimento com glúten e um sem possuem níveis calóricos muito parecidos. Então não procede a tese de que alimentos sem trigo têm mais açúcar e gordura que um alimento com glúten, nem que o carboidrato do trigo é pior que o do fubá e da fécula de batata. A nutricionista Olga Amancio reforça que o problema não é o que você come, mas a quantidade do que você come.