Um dos maiores eventos da sojicultura brasileira, a Abertura Nacional do Plantio da Soja, realizada nesta quinta-feira, 24, foi uma celebração emocionante, com direito a muita informação, homenagens e, claro, o consagrado enfileiramento das plantadeiras em campo. Nem mesmo o distanciamento social, por conta da pandemia de coronavírus, diminuiu o tamanho da festa que foi transmitida ao vivo pelo Canal Rural de maneira conectada e multiplataforma.
Minas Gerais recebeu pela primeira vez o grande evento que marca o início do plantio da soja no país. O anfitrião foi o presidente da Aprosoja-MG, Wesley Barbosa, que recebeu, na Fazenda Dois Corações, no município de Capinópolis, poucos convidados presencialmente, respeitando o distanciamento social. Mas isso não diminuiu a emoção pela escolha do estado para sediar o evento.
“O Canal Rural é a voz que o produtor rural não tinha e através das reportagens podemos expressar nossas dificuldades e angústias. Nós trabalhamos de sol a sol e agora podemos mostrar isso para toda a sociedade”, comenta Barbosa, com a voz embargada.
O Projeto Soja Brasil chega à nona edição na safra 2020/2021 e neste ano, por conta da pandemia de Covid-19, a organização da Abertura Nacional do Plantio da Soja foi um desafio. “Fizemos um grande esforço junto à Aprosoja Minas Gerais, Aprosoja Brasil e parceiros, para fazer um evento no campo”, afirma o presidente do Canal Rural, Julio Cargnino.
Segundo ele, isso é importante porque estar na lavoura significa estar perto dos produtores. “É poder mostrar ao Brasil e ao mundo quem são os produtores por trás desta safra. Muitas vezes, falamos dos grandes números e não mostramos quem são eles, não falamos sobre como produzem com responsabilidade social e ambiental, e muito carinho”, diz.
Este ano, o Projeto Soja Brasil se comprometeu a fazer um grande levantamento das experiências de agricultura sustentável. “Vamos mostrar como milhares e milhares de produtores fazem um trabalho espetacular do ponto de vista ambiental”, diz.
Bioinsumos em debate
Um dos temas debatidos durante o evento foi a importância do Programa Nacional de Bioinsumos do Ministério da Agricultura. Segundo Alessandro Cruvinel, coordenador do projeto, o objetivo é ampliar e fortalecer o uso de bioinsumos para promoção do desenvolvimento sustentável da agropecuária brasileira.
“Ele propõe um marco regulatório para produção e uso desse insumos, fomentar a ciência de tecnologia e inovação, articular instrumentos de crédito para produção, estimular a disseminação de conhecimento e informações de boas práticas, além de incentivar a criação de novas biofábricas”, afirma.
Durante o evento, o diretor de inovação do Ministério da Agricultura, Cleber Soares, garantiu que a entidade está fazendo todo o possível para alavancar o uso dos bioinsumos.
“Para participar do programa de bioinsumos, o ministério preparou uma série de diretrizes e orientações técnicas para nossos produtores e outros agentes do setor. E, para que tudo funcione, estamos acelerando o processo de registro de novos bioinsumos”, diz.
O presidente da Croplife Brasil, Christian Lohbauer, que também participou presencialmente do evento, confirmou o interesse do setor produtivo nesses processos mais sustentáveis e do amplo crescimento da busca por essas tecnologias.
“O programa de bioinsumos é amplo e, na parte da biodefensivos, por exemplo, tem um potencial enorme. Tanto que cresce no mundo a uma taxa de 10% ao ano e, no Brasil, 15% ao ano. Atualmente os biodefensivos ainda representam apenas 3% no campo, mas tem muito potencial”, diz ele.
Clima para a safra
Se, de um lado os produtores estão interessados em novos modelos de produção, do outro, velhas preocupações seguem no radar. Uma delas é justamente o clima.
Modelos meteorológicos indicam grandes chances de que o Brasil será influenciado pelo fenômeno La Niña, ainda no segundo semestre de 2020. O meteorologista Celso Oliveira, da Somar, conta que o fenômeno de aquecimento das águas do oceano Pacífico implica, por enquanto, uma demora na organização da umidade da Amazônia sobre o Centro-Norte e a retenção das chuvas no Rio Grande do Sul, já que as frentes frias não têm força para avançar. Depois, mais perto do verão, a tendência é de estiagem no Sul, Argentina e Paraguai, como aconteceu na safra 2019/2020.
“É um La Niña de tiro curto. Comparando com o que aconteceu na região Sul na safra passada, existe o risco, mas a estiagem será mais localizada. Paraná e Santa Catarina, por exemplo, terão chuvas mais regulares no próximo verão”, diz.
Para o Paraná, é mais um ano complicado, afirma Márcio Bonesi, presidente da Aprosoja do estado. “Tivemos chuvas esparsas e o produtor começou o plantio, muitas vezes, no pó ou com umidade do solo não muito favorável. O produtor está preocupado. Se a gente pensar que, no estado, o vazio sanitário terminou no dia 10 de setembro, já estamos atrasados. Então muitos estão arriscando”, conta.
Preços também dependem do clima
Outra presença durante o evento foi a do analista da consultoria Safras & Mercado Luis Fernando Gutierrez, que falou sobre a influência do clima nos preços da soja no Brasil.
“A questão climática é fundamental para definir os rumos do mercado. Ela já teve influência sobre a safra dos EUA e, conforme a colheita for terminando por lá, o mercado voltará a olhar para a América do Sul. Com o La Nina, a tendência é de problemas nessa parte mais ao sul no Brasil e na Argentina. Se isso acontecer, começaremos a ver os efeitos em Chicago já a partir de novembro”, comenta ele.
Segundo Gutierrez, o Brasil já negociou mais da metade da safra, ou seja 55%, um volume recorde para o período, que na média seria de 25%.
“Os produtores aproveitaram os altos preços para vender. Esses valores são sustentados hoje por Chicago, que está um pouco mais elevado, também os prêmios pagos para a safra nova que já supera os 60 pontos sobre Chicago. Daqui para a frente, a comercialização perderá um pouco de ritmo, não só pelo volume já negociado, mas também porque os produtores irão focar no plantio”, afirma o analista de Safras & Mercado.
Produção e cenário para 2021
O Brasil tem potencial para produzir mais de 132 milhões de toneladas de soja na safra 2020/2021, segundo projeção do presidente da Aprosoja Brasil, Bartolomeu Braz.
“Esse evento marca a responsabilidade de produzirmos uma das grandes, ou a maior safra de soja do mundo. Claro que, por conta do clima, não sabemos qual será a produção final ainda. Temos estados com maior estresse hídrico, mas outros que estão em plena expansão de área. O que podemos dizer é que teremos sim a maior área plantada de soja do Brasil em 2020/2021, superando os 38 milhões de hectares”, diz.
Braz confirmou que as vendas de fato estão aceleradas e os produtores seguem travando negócios, pois há chance de as reformas propostas pelo governo não serem aprovadas e o dólar voltar a cair em 2021, atrapalhando a comercialização na hora da colheita.
O cenário desenhado pelo presidente da Aprosoja Brasil parece estar em linha com a opinião de especialistas. O professor de economia da Universidade de São Paulo (USP) Celso Grisi confirmou que 2021 promete ser um ano mais complicado.
“O cenário político é de muitas incertezas e isso traz reflexos para a economia também. Isso fez com que o dólar subisse bastante no Brasil, já que a situação aqui é mais complicada, piorada pela pandemia. Prevejo que, para 2021, o dólar entrará em queda, chegando a patamares de R$ R$ 4,30 até R$ 4,90”, afirma Grisi.
Minas Gerais em desenvolvimento
O presidente da Aprosoja-MG, Wesley Barbosa, pediu ao governador Romeu Zema, presente na Abertura Nacional do Plantio da Soja 2020/2021, que ajudasse o setor a expandir o plantio por meio da irrigação.
“Temos um fator limitante que é a oferta de energia elétrica. Peço a você, não como político, mas como empresário e gestor, por favor, dê-nos a oportunidade de fazer cada dia mais Minas Gerais grande”, disse.
Segundo Zema, a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) passou por um processo de sucateamento nos governos anteriores. “A solução definitiva é a privatização. A empresa precisa de R$ 15 bilhões para colocar seus investimentos em dia. Esperamos que isso aconteça até 2022, para que possamos fornecer a quem produz a quantidade de energia que precisa, e com agilidade”, disse.
O governador, que operou uma das plantadeiras na fazenda Dois Corações, também destacou que está fazendo todo o possível para eliminar burocracias. “Procedimentos que exigiam presença física estão sendo feitos pela internet, estamos agilizando o que depende do estado, que deixa de ser um obstáculo para quem produz”, declarou.
A secretaria de Agricultura de Minas Gerais, Ana Valentini, esteve presente na Abertura Nacional do Plantio da Soja Safra 2020/2021, em Capinópolis (MG). Ela aproveitou para agradecer o governador Romeu Zema por ter colocado “uma produtora rural, que conhece a terra e que sabe quão difícil é a luta do produtor” no governo.
Segundo Ana Valentini, o Valor Bruto da Produção (VBP) do agro mineiro deve crescer 20% este ano. “Aumento importante que ajuda o estado neste ano fiscal apertado”, diz.