O motorista que trafega pelas rodovias concedidas à iniciativa privada não deveria arcar sozinho com o custo das perdas impostas às concessionárias em razão da pandemia. A posição é da Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga (Anut), contrária à proposta de recompor o contrato dessas empresas por meio de reajuste de tarifa de pedágio, como sugere a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
A minuta da resolução que vai orientar os reequilíbrios extraordinários das concessões de estradas federais foi apresentada nesta segunda-feira, 20, pela ANTT, durante reunião com o setor. O texto ainda precisa ser votado pela diretoria do órgão para entrar em vigor. O impacto nas tarifas de pedágio será calculado caso a caso, a partir da fórmula geral que será publicada pela agência reguladora.
Presente na audiência, o presidente executivo da Anut, Luis Henrique Teixeira Baldez, afirmou que a entidade não concorda com a proposta e defende que o Poder Público arque com as perdas das concessionárias – geradas pela redução do movimento nas rodovias, que afetou o montante arrecadado via pedágio.
“Enfrentamento de um problema mundial, enorme, e quem paga a conta nesse caso específico é o usuário sozinho. Precisamos também ter o olhar de que essa pandemia não foi um ato que impõe determinadas coisas, investimentos, obrigação adicional nos contratos. Aquilo foi geral, para todos. Por que nesse caso só o usuário vai pagar via tarifa?”, questionou Baldez durante a reunião.
Conforme a proposta, para calcular os efeitos da pandemia nas concessionárias, deverá ser considerada a diferença verificada entre o tráfego mensal projetado, quando a crise sanitária não estava no radar, e o tráfego real no período.
A ANTT vai adotar como oscilação de tráfego decorrente da pandemia a variação acima e abaixo do desvio-padrão com nível de significância de 5%. Com o fim de mitigar o impacto para os motoristas, a ANTT poderá implementar a recomposição do equilíbrio de forma parcelada, ou seja, elaborar uma forma de diluir os aumentos tarifários.
“A ANTT poderá, a seu critério, implementar a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro de forma parcelada, de modo a mitigar oscilação tarifária significativa”, diz trecho da proposta divulgada nesta quarta.
O reequilíbrio extraordinário dos contratos quando um evento não previsto ocorre é um direito legal das concessionárias, reafirmado em parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) produzido no ano passado, quando o governo e as empresas concluíram que a pandemia iria afetar a receita prevista nos contratos.
Na audiência, o presidente da Anut, por sua vez, lembrou que existem várias formas de o Poder Público compensar o concessionário nessas situações, como por meio do pagamento direto pelos danos, do alívio nas exigências de investimentos e do aumento do prazo da concessão, por exemplo.
Outra crítica feita por Baldez foi dirigida à decisão da área técnica da ANTT em não contabilizar a variação dos custos e demais preços no cálculo do reequilíbrio extraordinário. O presidente da Anut argumentou que as concessionárias, apesar de acumularem uma queda na arrecadação via pedágio, também devem ter registrado menos ônus financeiros no período, em razão, por exemplo, da queda do custo de manutenção das estradas ou do atendimento aos usuários. “Temos que ter muito cuidado nessas avaliações”, disse Baldez.
Ao explicar durante o evento por que decidiu excluir os custos da metodologia, a equipe técnica da ANTT afirmou que a variável teria um caráter muito heterogêneo, sendo difícil associá-la à pandemia, o que dificultaria a adoção de um parâmetro nos cálculos.