A agricultora Francisca Soares de Lima descreve o trabalho na roça como árduo, mas com momentos prazerosos. Aos 52 anos, ela conta que passou boa parte da vida no roçado, onde plantava mandioca e fazia farinha. Um problema de saúde a afastou da plantação, mas ela ainda ajuda o marido no que consegue.
Diante da possibilidade de mudanças nas atuais regras da aposentadoria, Francisca desabafa: “Acho pesada a idade de 60 anos para trabalhar, a gente não aguenta, não. Não é fácil ir para a roça depois de uma idade, trabalhar, trabalhar”, diz a agricultora, que mora em Mentai, uma das 74 comunidades que fazem parte da Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns. Osvaldo Guimarães, 57 anos, marido de Francisca, concorda. “Nosso trabalho ainda é longe daqui, fica a uns 40 minutos”, diz.
No início do mês, o governo federal anunciou o texto da reforma da Previdência, que estabelece a idade mínima de 65 anos para aposentadoria de homens e mulheres que tenham contribuído por, no mínimo, 25 anos. A regra, caso seja aprovada pelo Congresso, valerá para homens com idade inferior a 50 anos e mulheres com menos de 45.
Aos 59 anos, o seringueiro Manoel Eróito Pimentel Ferreira já aguarda o momento de se aposentar. Ele conta que tem uma rotina rígida e que o dia de trabalho começa antes de o sol nascer. Às 6h, ele já está extraindo o látex das seringueiras, mas antes cuida da criação de peixes e de porcos que tem em um sítio na comunidade Vila Franca, na Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns. Mais tarde, é a vez do trabalho na roça.
Preocupado em manter uma renda para o futuro, ele diz que contribui com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). “Sou associado do sindicato [dos trabalhadores rurais] e sempre contribui com a Previdência”, diz Ferreira. O seringueiro tem uma renda diária média de R$ 30. Da seringueira, tira R$ 3,50 por litro vendido.
Caso as novas regras para aposentadoria já estivessem em vigência, o seringueiro ainda teria de esperar seis anos para finalmente conseguir o benefício.
A rotina pesada debaixo do sol nas plantações de mandioca ou no mato é comum entre os moradores da reserva. Por conta disso, a nova idade mínima, que na época em que a reportagem visitou o local ainda era especulação, foi bastante criticada pelos moradores.
“O que podemos fazer? Já estamos trabalhando até os 60 anos. Agora vamos passar ainda mais tempo trabalhando? Já nem vou chegar”, diz Vicente Imbiriba Amorim, 56 anos, morador da comunidade Anã e delegado do Sindicato dos Trabalhadores Rurais.
Atualmente, os trabalhadores rurais contam com regras diferenciadas. Homens podem se aposentar aos 60 anos, e mulheres, aos 55 anos. No caso dos trabalhadores rurais, é possível se aposentar com 15 anos de contribuição ou de atividade rural – diferentemente da exigência feita ao trabalhador urbano, que deve contribuir com a Previdência por 30 anos, no caso de mulheres, e 35 anos, de homens.
Durante o anúncio da reforma, o governo explicou que os agricultores vão contribuir de forma individual com uma alíquota sobre o limite mínimo da base de cálculo para o recebimento do benefício. A contribuição passa a ser individual e obrigatória. A base contributiva e a alíquota do rural, no entanto, serão diferenciadas.
Com a reforma, os trabalhadores rurais poderão se aposentar com a idade mínima de 65 anos e 25 anos de contribuição. Na regra atual, o trabalhador rural pode contribuir, mas a aposentadoria também é garantida para quem não contribuiu.
Caso a reforma seja aprovada, haverá uma regra de transição para trabalhadores rurais que tiverem 50 anos de idade ou mais, se homem, e 45 anos de idade ou mais, se mulher. Nesses casos, eles deverão cumprir um período adicional de contribuição (pedágio) equivalente a 50% do tempo que faltaria para atingir o número de meses de contribuição exigido. O governo garante que a proposta respeita os direitos já adquiridos.