A escola de samba Imperatriz Leopoldinense, do Rio de Janeiro, divulgou nesta sexta-feira, da 13, uma nota oficial para tentar esclarecer a polêmica criada em torno do tema escolhido para seu desfile neste ano. Trechos da letra do samba-enredo ‘Xingu, o clamor que vem da floresta’, que defende os indígenas, e as fantasias de uma das alas da agremiação – denominada “Fazendeiros e seus agrotóxicos” – desagradaram setores do agronegócio, que emitiram notas de repúdio. O senador ruralista Ronaldo Caiado (DEM-GO) chegou até a propor a realização de uma sessão temática para descobrir os financiadores da Imperatriz e “os interesses em denegrir o agronegócio”.
A nota da escola de samba, assinada por seu presidente, Luiz Pacheco Drumond, afirma que a Impeatriz foi alvo de uma campanha difamatória ao denunciar o uso irresponsável de agrotóxicos. “Embora não seja nossa intenção generalizar, importantes pesquisas científicas apontam os diversos males que o agrotóxico traz para o solo, para o alimento e consequentemente para a saúde de quem o consome’, diz o texto.
Além disso, o comunicado afirma que o trecho do samba-enredo que diz “o Belo Monstro rouba a terra de seus filhos, destrói a mata e seca os rios” é um posicionamento contra a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. “Não é uma referência direta, portanto, ao agronegócio, como alguns difundiram”, afirma a nota.
Leia a íntegra da nota da Imperatriz Leopoldinense:
“O carnaval é uma festa popular e o desfile das escolas de samba na Marquês de Sapucaí, considerado o maior espetáculo a céu aberto do mundo, é um patrimônio da cultura brasileira. Um dos principais atrativos turísticos da cidade do Rio de Janeiro, o carnaval carioca atrai visitantes de diversas regiões do Brasil e do mundo inteiro.
A festa emprega milhares de trabalhadores nos mais diversos setores, gerando desenvolvimento e oportunidades de negócio, além de injetar dinheiro em nossa economia. Só no carnaval de 2016 foram arrecadados mais de 3 bilhões de reais, segundo dados da Empresa de Turismo do Rio de Janeiro – Riotur .
Seja nos ranchos, nos blocos, nos salões ou na Avenida, o carnaval, mesmo terminando na quarta-feira de Cinzas, desperta sonhos e paixões nos foliões. As escolas de samba são um capítulo à parte, um espaço democrático que liga os todos os cantos da cidade e celebra a diversidade. E falar de diversidade é falar da Imperatriz Leopoldinense.
Considerada uma das escolas de samba mais tradicionais do carnaval carioca e uma das maiores campeãs da Era Sambódromo, a Rainha de Ramos – como é carinhosamente chamada por seus torcedores e comunidade –, tem na sua essência um compromisso com a cultura. Os enredos sobre a formação do povo brasileiro estão enraizados em nossa história. Aliás, gostamos muito de contar boas histórias.
Orgulhamo-nos de nossa trajetória de grandes enredos com temática cultural, inclusive fomos a primeira agremiação a fundar um departamento cultural, prática posteriormente adotada por todas as nossas co-irmãs, cujo propósito é preservar nossas raízes e memórias. Colecionamos desfiles inesquecíveis e sambas que são considerados verdadeiros clássicos do carnaval, que nos renderam prestígio, reconhecimento de importantes setores da sociedade e, claro, muitos campeonatos.
Temos a marca do pioneirismo em nosso pavilhão, conquistamos oito vezes o título de campeã do carnaval carioca no Grupo Especial, além de importantes prêmios nacionais e internacionais. Nestes quase 60 anos de fundação e de bons serviços prestados à cultura brasileira, a Imperatriz Leopoldinense teve em seu quadro grandes mestres do carnaval, já celebrou importantes vultos de nossa rica Literatura, juntou o erudito com o popular, uniu o sagrado e o profano, cantou a nossa mestiçagem e a fé de nossa brava gente brasileira espalhada por todos os rincões deste país de dimensões continentais.
O homem do campo é presença constante em nossos desfiles e exaltamos por muitas vezes na Avenida o solo brasileiro, este chão abençoado por Deus onde tudo que se planta, dá. No carnaval de 2016, ano em que, vencendo preconceitos, homenageamos a dupla sertaneja Zezé di Camargo e Luciano, adentramos no universo rural, trouxemos algumas riquezas do estado de Goiás e dedicamos um setor inteiro de nosso desfile à agricultura, por entendemos a importância deste segmento para nossa economia .
Comprometida em dar voz à diversidade, a Imperatriz Leopoldinense, que já cantou em carnavais anteriores o descobrimento do Brasil e celebrou as raízes africanas através da figura e do legado de Mandela, decidiu levar para a Marquês de Sapucaí em 2017 o enredo “Xingu – o clamor que vem da Floresta”, de autoria do carnavalesco Cahe Rodrigues.
Vamos falar da rica contribuição dos povos indígenas do Xingu à cultura brasileira e ao mesmo tempo construir uma mensagem de preservação e respeito à natureza e à biodiversidade.
Segundo relato da própria população que vive ali, a região do Xingu ainda é alvo de disputas e constantes conflitos. A produção muitas vezes sem controle, as derrubadas, as queimadas e outros feitos desenfreados em nome do progresso e do desenvolvimento afetam de forma drástica o meio ambiente e comprometem o futuro de gerações vindouras. Os resultados, como sabemos, são devastadores e na maioria das vezes irreversíveis.
Acreditamos que, para além do entretenimento, o carnaval e a escola de samba – levando em consideração que os olhos do mundo se voltam para nossa festa – têm um compromisso com o social e o desenvolvimento sustentável.
Após a divulgação de nossas fantasias, algumas delas denunciando o uso irresponsável de agrotóxicos, fomos alvo de uma intensa campanha difamatória. Embora não seja nossa intenção generalizar, importantes pesquisas científicas apontam os diversos males que o agrotóxico traz para o solo, para o alimento e consequentemente para a saúde de quem o consome. Este é apenas um aspecto do nosso rico e imenso enredo, mas desde então temos recebido críticas e inúmeras notas de repúdio dos mais diversos setores do agronegócio.
Até em função de certa confusão registrada em algumas dessas falas, ressaltamos e esclarecemos que no trecho de nosso samba “o Belo Monstro rouba a terra de seus filhos, destrói a mata e seca os rios” estamos nos juntando às populações ribeirinhas, às etnias indígenas ameaçadas, aos ambientalistas e importantes setores da sociedade que se posicionaram contra a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. Não é uma referência direta, portanto, ao agronegócio, como alguns difundiram. Os impactos negativos desta obra ao meio ambiente serão imensuráveis, estão constantemente nas pautas de debates, são temas de discussões recorrentes em audiências públicas e foram amplamente divulgados pela imprensa nacional e estrangeira.
Em nenhum momento atacamos o setor do agronegócio e seus trabalhadores. A sinopse de nosso enredo está disponível para consulta pública em nossos canais oficiais de comunicação. Mesmo depois de todos os esclarecimentos prestados por nosso carnavalesco aos mais diversos veículos de comunicação, temos sido atacados com críticas injustas e até com ofensas ao samba, importante matriz de nossa cultura, e ao carnaval, a maior festa popular do planeta.
Por fim reforçamos que o nosso enredo não versa contra esta importante cadeia produtiva de nossa economia nem desqualifica os seus incansáveis trabalhadores. Como poderíamos exaltá-los de forma grandiosa num carnaval para em seguida criticá-los no outro?
A nossa mensagem é de preservação, respeito, tolerância e paz. Todos os que acreditam nesses valores estão convidados a celebrar conosco.
Salve o verde do Xingu, viva o carnaval, a Imperatriz Leopoldinense e todos os trabalhadores do Brasil!
Luiz Pacheco Drumond
Presidente”