A vida do campo é significativamente diferente da vida em grandes cidades e metrópoles. Longe do caos urbano, o povo é mais humilde, as estradas são mais simples e os dias são mais calmos. Com o objetivo de manter viva a memória de sua cidade natal e da vida rural, a jornalista e técnica em agropecuária Marluce Corrêa resolveu escrever um livro.
Marluce nasceu e cresceu no município de Orizona, no interior de Goiás, a cerca de 130 quilômetros de Goiânia. Filha de produtores rurais, sempre foi ligada ao campo e viveu grande parte da sua vida na zona rural. Com 18 anos, mudou-se para a capital do estado e ingressou no curso de jornalismo.
A escolha pela graduação foi motivada pela facilidade em se comunicar e gosto pela escrita. Conforme os semestres avançaram, Marluce se viu motivada a contar sobre a vida no campo e dar voz às pessoas que vivem do agro. A partir daí, as oportunidades para produzir trabalhos e conteúdos voltados ao agro fizeram com que se encontrasse no jornalismo rural.
Voz do campo
Em seu trabalho de conclusão de curso, Marluce escreveu o livro-reportagem intitulado “Orizona: a voz do campo no coração do Brasil”. Com linguagem literária, a publicação acompanha a história de 12 personagens, de jovens a idosos, servindo como registro histórico do crescimento da cidade e das mudanças no município, contribuindo para o desenvolvimento da cultura e o resgate das tradições locais.
“Meu objetivo foi dar voz às pessoas que viram e viveram na pele as mudanças na vida no campo desde a década de 1930 até os dias atuais. As tradições e a história da vida rural podem cair no esquecimento à medida que novas gerações surgem e que desconhecem às experiências de vida daqueles que já viveram no campo em tempos muito diferentes dos atuais. Deixar de lado esses relatos pode fazer com que parte das histórias contadas pelos agentes dessa transformação se perca, caso a gente não registre essas informações e dê voz a essas pessoas”, diz Marluce.
De acordo com a jornalista, é preciso conhecer, contar e registrar essas experiências para novas gerações. Tempos que não contavam com energia elétrica, fácil acesso a transportes, poucos oportunidades para estudos, mas que contava com “muito respeito, companheirismo e união”.
“É preciso traçar um paralelo entre esse passado e o nosso presente. Presente de jovens que, em muitos casos, têm a oportunidade de estudar mais, que possuem até acesso à internet no campo, que não vivem sem energia elétrica e não conseguem imaginar como é ter que andar a pé ou a cavalo por longas distâncias, ou esperar um mês até que uma carta tão esperada chegue. São realidades distintas de um mesmo lugar. São histórias vivas. É a vida rural em constante transformação”, comenta.
Marluce retornou a Orizona e iniciou seus estudos em agronomia, além de trabalhar como redatora no portal AgroMulher, ampliando cada vez mais seus conhecimentos e dando voz às pessoas do campo e às mulheres do agro. “Vou usar um trecho do meu livro, nas palavras de Isabela, uma das jovens entrevistadas: o campo é o meu antes, o agora e o depois”, finaliza.
Para adquirir o livro, basta entrar em contato com a jornalista através do email: marluce17.correa@gmail.com ou pelo Instagram @marlucecorrea17. Confira um trecho do livro:
Capítulo 2 – “O soldado candeeiro”
Francisco levantou bem cedo. Pegou sua foice que tinha sido afiada no dia anterior e foi, a cavalo, até a fazenda vizinha onde tinham marcado o mutirão daquele sábado. Todos que moravam por ali já sabiam o que ia acontecer, menos o fazendeiro que ia receber a “treição”. O mutirão organizado de surpresa para o dono da terra reuniria muitos amigos da região para a roçagem dos pastos. Entre conversa fiada e trabalho pesado no sol escaldante, os vizinhos contam histórias e riem, até que, sem nem notar, o serviço está finalizado e vem a melhor parte do dia: o pagode.
Todos vão em casa se recompor, tomar um banho e colocar a melhor roupa. O melhor perfume também deve ser usado na ocasião, pois essa é uma das únicas diversões da época.
– Ô de casa!
– Ô de fora! Vamo entrando que a festa tá só começando!
Aos poucos, todos vão chegando na casa que recebe a festa. A mulher do fazendeiro, acolhedora e animada ao extremo, preparou comida em fartura e contratou o melhor sanfoneiro da região. Por ali, todos vão conversando, rindo, dançando e se divertindo. Se a festa estiver boa, o dia vai raiar antes dos festeiros irem embora. Tudo indica que será assim. A sanfona chora e os pés se arrastam no assoalho. Nem o cansaço de um longo dia de trabalho parece desanimar aquele povo. Espero que o repertório do sanfoneiro seja extenso, ou ele terá que repetir as músicas, incansavelmente, até que o último casal se canse de dançar.”
*Com supervisão de José Florentino