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Plano orientará ações de resgate e cuidados com animais em desastres

Como ainda não existe legislação que trate da matéria, o plano serve como diretriz técnica do trabalho de resgate da fauna

Rio Gualaxo do Norte após dois anos da tragédia do rompimento da Barragem de Fundão da Samarco
Rio Gualaxo do Norte após dois anos da tragédia do rompimento da Barragem de Fundão da Samarco – Foto: José Cruz/Agência Brasil

Daqui para a frente, em todos os desastres envolvendo animais, a fauna deve sofrer impacto muito menor porque os profissionais do setor contam agora com um documento ao qual podem recorrer – o Plano Nacional de Contingência de Desastres em Massa Envolvendo Animais, aprovado nesta semana pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV).

O plano traz orientações para a atuação dos profissionais em cenários dessa natureza, com diretrizes sobre como conduzir o resgate, a assistência veterinária, a manutenção e o destino de animais domésticos e silvestres.

Publicado nesta segunda, 6, o plano já está em vigor e pode ser acessado gratuitamente no site do CFMV por médicos veterinários e zootecnistas e cidadãos brasileiros, em geral. O documento tem 22 anexos que vão orientar e auxiliar os profissionais no trabalho de resgate de animais.

Como ainda não existe legislação que trate da matéria, o plano serve como diretriz técnica do trabalho de resgate da fauna. “É uma orientação em forma de diretriz, mas não tem obrigatoriedade, porque não tem nada previsto em lei ainda”, disse a presidente do Grupo de Trabalho de Desastres em Massa Envolvendo Animais (GTDM) do CFMV, Laiza Bonela.

As primeiras atuações de médicos veterinários no Brasil em defesa e resgate de animais vítimas de catástrofes ocorreram em 2011, durante as enchentes e deslizamentos de terra em municípios da região serrana do Rio de Janeiro. As ações se repetiram com o rompimento de barragens em Mariana, em 2015, e em Brumadinho, em 2019, ambos em Minas Gerais, até chegar, neste ano aos incêndios no Pantanal.

Segundo Laíza, foi só em 2019, a partir do desastre de Brumadinho, que começou a ser elaborado o plano de contingência em virtude de um cenário que se repetiu e que tinha sido vivenciado em Mariana, em 2015. Como em 2019 não havia nenhum documento norteador, o rompimento da barragem de rejeitos de mineração do Córrego do Feijão, em janeiro do ano passado, em Brumadinho, serviu como ponto de partida para que se começasse a pensar nisso. “A partir desse momento, o grupo foi instituído e começou a construir o plano”. O trabalho se estendeu durante 12 meses.

Objetivos

Laiza Bonela disse que o plano tem três grandes objetivos. O primeiro é ser uma diretriz, um documento norteador para qualquer tipo de desastre dentro do Brasil para orientar os profissionais a como agir, tanto durante o desastre quanto depois. “A gente fala que é nas ações de prevenção e de resposta.”

O segundo objetivo é sensibilizar os profissionais e os conselhos locais. O grupo de trabalho percebeu que o estado de Minas Gerais é muito sensibilizado porque ali ocorrem muitos desastres. “Mas isso não pode parar em nós, porque todos os estados são vulneráveis. Percebemos que era preciso descentralizar essa atuação de forma que o documento sensibilizasse os quatro cantos do nosso país”.

O terceiro objetivo, que está sendo buscado agora, é a capacitação profissional, que deve ser levada para todo o país, para que todos saibam usar o documento, como articular o plano, como trabalhar com ele.

Laiza Bonela disse esperar que, com o plano, os animais vítimas de desastres possam ser “assistencializados” de forma mais rápida e ter a sua dignidade assegurada, ser atendidos por “profissionais que olhem para eles como parte do problema e não como uma distração, como já aconteceu”.

A veterinária contou que ter observado em alguns eventos de desastres dos quais participaram membros do GTDM  os órgãos presentes não se interessarem pelos animais, porque estavam muito preocupados com outras demandas.

Segundo Laiza, o plano de contingência vem para mostrar a importância dos animais. “Os animais não são uma distração; eles fazem parte do nosso ecossistema, fazem parte da saúde única. Quando protejo os meus animais, também estou protegendo a saúde humana, a saúde ambiental. Os animais não podem ser mais negligenciados. Eles precisam ser olhados com todo respeito e dignidade.”

Resgates

No rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, o GTDM atuou no local de forma voluntária durante 16 dias, período em que resgatou 400 animais. Alguns foram “assistencializados” no local e outros transferidos para abrigos ou hospitais. A maioria desses animais está até hoje sob supervisão de empresas responsáveis contratadas pela Vale.

No Pantanal, o GTDM tem equipes que estão há mais de 30 dias trabalhando nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e não conseguiram voltar para casa devido à gravidade da situação. Enquanto não houver um quadro de estabilização do problema, os médicos veterinários permanecerão no local, porque os incêndios ainda continuam ocorrendo, afirmou Laiza. Os animais resgatados feridos são encaminhados a hospitais que possam acolher espécies silvestres, bem como ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

“Por serem animais silvestres, a logística é um pouco diferente da dos animais domésticos. O contexto é ainda mais complexo, mas todos os animais estão sendo direcionados à assistência local mais próxima que tenha estrutura para acolhê-los, porque alguns são muito grandes, como a onça, a anta”.

Posteriormente, de acordo com o órgão fiscalizador, os animais serão devolvidos à natureza quando estiverem seguros e saudáveis, em um local onde possam ter qualidade de vida.

Cadeia de custódia

Sobre animais encontrados mortos em desastres, Laiza explicou que, quando existe uma empresa responsável, toda carcaça passa pelo procedimento denominado cadeia de custódia, que é a proteção daquela prova para ser usada em juízo depois. “Geralmente, trabalhamos acionando a Polícia Federal e a Polícia Civil, que protegem aquela prova. O animal vai para necrópsia para gerar os laudos explicativos de sua morte. No caso de desastres em que não há uma empresa para ser responsabilizada, como o das enchentes, quantifica-se a estimativa de animais em óbito e são feitas as necropsias.

O Grupo de Trabalho de Desastres em Massa Envolvendo Animais será transformado em uma comissão permanente do Conselho Federal de Medicina Veterinária para dar continuidade ao trabalho. “Vamos apoiar ações na resposta e na prevenção dos próximos desastres, que geram impactos para a sociedade, com implicações na saúde pública, na economia e no emocional da população atingida, especialmente dos animais que são vulneráveis e pagam muito caro, sejam eles de companhia, de produção ou silvestres”, afirmou o presidente do CFMV, Francisco Cavalcanti.